27 de dezembro de 2010

Super Nova by Tricia Costa

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Super Nova



Super Nova











1. Manicômio

Esperei cansada pelos primeiros raios de sol do dia. Meus olhos estavam ardendo, mas não ia fechá-los. Aquele não era o lugar de se tirar um cochilo. Ficar desperta podia significar a sobrevivência. Finalmente os primeiros raios surgiram, batiam de leve no chão porco e tosco que se estendia sob meus pés. Era verdade o que diziam: O sol realmente nasce quadrado na prisão. Mas ninguém pode falar o quão horrível é ficar atrás das grades até ficar atrás das grades. E eu estava ficando experiente nisso. Já era a segunda vez.

Baixei a cabeça, deixando os cabelos esconderem meu rosto, e me encolhi no canto escuro que já me pertencia. As paredes tinham olhos ouvidos e até bocas. No entanto não tinham pés. E eu ouvia passos e chaves tilintando ao longo do corredor. Levantei. Ninguém me veria naquela situação deplorável, me encolhendo feito um bicho assustado. Um guarda e uma mulher pararam de frente para mim do outro lado das grades. O guarda eu não reconheci. Mas a mulher... Cabelos curtos e loiros, baixinha e de rosto fino, com os olhos verdes me encarando. Era minha mãe.

Coloquei minha máscara e vesti minha armadura, aguardando o ataque que viria. O guarda abriu as grades e se afastou. Ótimo! Até ele reconhecia o perigo. Fiquei parada sustentando o olhar de minha mãe, quase nem piscava. A cela estava vazia, ela podia dar um passo e entrar pra uma batalha de gladiadores e ninguém interviria. Ela não se moveu um milímetro. Que diabos estava acontecendo! Olhei pra baixo e vi uma mala de viagem em sua mão direita. Minha face vacilou, os músculos se contraindo em uma grande interrogação.

Um lampejo de reconhecimento passou pelos seus olhos. Eu fisgara a isca. Fiz a única coisa que podia fazer: implorei. Sem palavras, só com os olhos. Ela moveu lentamente a cabeça de um lado para o outro.

-Eu não tive escolha... Você não me deu escolha . – Ela disse.

Não fazia sentido. Essa devia ser minha libertação. Parecia que estava apenas sendo transferida para outra prisão. Minha condicional foi adiada, talvez para sempre... Ela saiu andando quase ao mesmo tempo em que falava para irmos. Eu fui. O que eu faria se não isso? Não ia espernear, nem bater o pé. Eu seria uma mártir.

Caminhei com minha mãe pelo corredor, na verdade quase corria para alcançar os passinhos rápidos dela. Não falamos nada. Não queria pensar para onde estaria indo. Mantive o foco em estar saindo da prisão. O que ainda era uma coisa boa.
Passamos por um grupo de guardas na saída. Eles me olharam divertidos com a situação. Era humilhante sair dali com minha mãe. Seria mais digno ficar. Estremeci com a idéia horrenda. Saímos para a calçada, o sol nascendo no horizonte distante, o velho Fiat azul me esperava. O carro que sempre parecera convidativo, agora tinha uma carga de energia negativa. Senti isso me invadir assim que encostei-me à porta.

Entrei na atmosfera negativa do Fiat e mergulhei na depressão que nunca me abandonara nos últimos dias. Minha mãe entrou estrondosamente no carro e jogou a mala no banco de trás por de cima do meu ombro. Alessandra não era agressiva, não mesmo. Era de fato a pessoa mais calma e bem centrada que eu já conhecera. Mas algo estava errado. Ela estava desesperada. Senti que suas feições iriam desabar em um choro aflitivo a qualquer momento. Tudo por minha causa.

Argh! Segurei-me no forro do banco do carro para não afundar no poço invisível de depressão que cavara. E eu arrastara minha mãe junto comigo. Justo a pessoa que eu mais amava! Senti-me tão mal por tudo. Mas eu não podia parar agora. Eu tomei minha decisão. Não pensaria nos “e se...” que ficavam para trás. Nunca mais ficaria perdida nas outras dimensões que deixavam de existir quando fazia minhas escolhas.

O ronco do motor me acordou. Sai do transe. O carro se moveu rápido pelas ruas pouco movimentadas de um jeito que eu considerava quase impossível. Los Angeles não costumava ser uma cidade calma. Calculei que deviam ser umas cinco horas da manhã. Meus olhos se fixaram no horizonte sem ver nada de fato. Já sabia para onde estávamos indo. Para o aeroporto. O problema era o que viria depois...

Em menos tempo do que eu esperava o carro parou. Olhei para o lado. Alessandra não se dava bem escondendo as lágrimas, mas se esforçava. Seu corpo arqueado por cima do volante, os cabelos entre os dedos que massageavam as têmporas. Apoiei a mão insegura no seu ombro. Ela se endireitou, fungou o nariz duas vezes e atirou um pedaço de papel no meu colo. Uma passagem de avião.

-Vão estar te esperando no aeroporto quando chegar... Vai ser melhor assim. Boa sorte querida. - Um beijo na minha testa – Me envie e-mails, vou sentir saudade...
Ficamos paradas por algum tempo nos abraçando e soluçando, ela mais do que eu. Não que não sofresse, mas já chorei muito. Não havia mais lágrimas para serem derramadas. Afastamo-nos enfim.

-Tchau mãe! - Agarrei a mala e sai do carro.

Não olhei mais para trás. Eu não merecia uma mãe tão boa. Principalmente nos últimos dias... Eu deveria ter sido mais forte. Mas dói tanto quando alguém em quem confiamos, e até amamos, nos magoa. Luca sempre foi um grande amigo meu. Achei que podíamos ser algo mais. E fomos por quase dois meses. E então... Ele me pisoteou. Não foi como um fora. Isso eu suportaria. Ele simplesmente me destruiu, acabou com nossa amizade de anos em minutos e levou muitos dos meus raros amigos com ele. E o que eu fiz? No começo nada, não me restavam forças sequer para viver, mas depois... Virei rebelde. Rebelei-me contra mim mesma. Fiz amizade com a ralé de L.A. Drogados, bêbados, líderes de gangues e garotas sem escrúpulos compunham meu círculo de amizades. E com tais companhias passei a freqüentar os piores lugares. Nem minha aparência foi poupada, fiz piercings, tatuagens de rena e descolori as pontas dos cabelos...

Parei no meio da área de embarque completamente perdida. Era grande, branca e muito iluminada. Havia gente com malas de viagem por todo lado e o inconfundível estampido dos alto-falantes antes das informações serem passadas, algo que soava como “tu-tu”. Suspirei e peguei a passagem. Coloquei-a diante de mim e li o meu futuro destino, como quem lê um bilhete de biscoito-da-sorte. Fiz uma careta automática o ler o nome do estado: Washington. Ótimo! Maravilha, só havia um lugar para onde minha mãe poderia me mandar ali. Forks. Sim, aquela pequena cidade que fica entre nada e lugar nenhum, abençoado pelo clima úmido e frio (sem falar em chuvoso) do noroeste estadunidense. Imagino como mamãe fizera para convencer tio Antoni a me receber em casa.

Tio Antoni não fazia parte do círculo mais interno da família. Ele era irmão da esposa do meu tio Stanley. Só o vi umas três vezes em toda minha vida. Não era muito alto, mas magro, de rosto triangular, cabelos castanho-grisalhos (principalmente nas têmporas) e de pele branca como o leite. Provavelmente o melhor dono de “prisão” que minha mãe poderia encontrar.

Fui para o portão de embarque e esperei a partida do meu vôo, que por sinal não era o dos mais lotados. Provavelmente não eram muitos os loucos que gostavam de ficar trancafiados em casa o ano todo devido ao clima da região. Ainda faltava mais de uma hora para a partida do meu vôo.

Pensei em todas as ironias que a situação me invocava. Era ridículo finalmente ter liberdade, eu estava viajando sozinha e ia morar sozinha, e mesmo assim a achar tão recusável, afinal era no fim do mundo. Mas a melhor definição que achei para Forks foi: Manicômio. Realmente fazia mais sentido me prender num manicômio do que numa prisão. E a pequena reserva indígena era exatamente o tipo de cela acolchoada que me faltava. Eu ia pirar!

O vôo chegou e fui para a fila pequena que se formou. Atrás de mim veio uma mulher e sua filha de sete anos. Ela me encarou e apertou a filha mais para perto de si. Pois é, eu realmente estava assustando criancinha! Lembrei que viera direto da prisão e nem me olhara no espelho.

Entrei no avião. A aeromoça também me evitou. Talvez eu estivesse cheirando feito uma traficante... Lembrei do motivo da minha prisão: Envolvimento em briga e ligação com pessoas acusadas de tráfico de drogas. Era algo quase tão impressionante quanto um nome de curso técnico, diria que ate mais poético.
Quando o avião decolou e se estabilizou, fui ao banheiro. Olhei o rosto desfigurado que me olhava de volta no espelho. “Olá estranha!”. Meus olhos tinham um tom verde amargurado e profundas olheiras, meus cabelos castanhos e compridos pareciam ter tido uma guerra com um aspirador de pó (duvidei que os nós um dia saíssem), minhas orelhas tinham quatro furos cada e meu nariz também tinha um acessório brilhante no canto direito. Minhas roupas, então... Calça jeans puída e rasgada e uma camiseta cinza surrada, com duas correntes prateadas enroscadas no pescoço. Lavei o rosto e prendi os cabelos num coque improvisado. Esperava não prejudicar o sono de mais ninguém com minha aparência.

Voltei para minha poltrona e me acomodei para a longa viagem. Ninguém ficou me encarando como na entrada. Talvez tivesse melhorado mesmo minha aparência ou meramente perderam o interesse. Tanto faz, era bom não ser observada! Fechei os olhos e no instante em que os abri já estávamos prestes a pousar. Estava mais cansada do que imaginei... A aeromoça tinha deixado o lanche no banco vazio ao meu lado, prevendo minha fome. Acertou. Meu estômago agradeceu a pequena refeição.

Desci do avião carregando minha mala, que nem era muito grande. Claro que não desci direto em Forks. Até parece que lá teria um aeroporto! Estava em Port Angels . A zona de desembarque era igual a qualquer outra. Pessoas aguardavam os recém-chegados que eram cuspidos aos poucos. Olhei ao redor e não achei tio Antoni em lugar nenhum. Devia ter feito um cartaz com meu nome escrito bem grande nele, assim ele me acharia. Acabei comprando um sanduíche numa lanchonete ali perto e voltando para uma estação de cadeiras que ficava em frente à zona de desembarque. Eu não tinha como não vê-lo ali!

Dois vôos chegaram, os passageiros saíram. E nada de tio Antoni. Chegaram outros três. Nada. Lá pelo sétimo comecei a me desanimar. Talvez ele não viesse... Deveria pegar um táxi? Eu não sabia exatamente onde ele morava. Era perto da praia de La Push... Alguém devia saber onde meu tio morava afinal todos deviam se conhecer mesmo. Mais três vôos chegaram. Chega! Levantei-me e fui até a calçada chamar um táxi. Estava frio lá fora. Vesti meu casaco, melhorou um pouco. Acenar para um táxi que passava, quando vi uma picape prata parando ali perto. Tio Antoni estava dentro dela. Ignorei o táxi que parava por minha causa e fui até a picape.

-Tio Antoni? - Perguntei enquanto ele saia da picape.

-Ahm, sim... Eu estou atrasado e... - Ele parecia que ia passar direto por mim e correr para dentro do aeroporto.

-? - Ele se virou para mim já a uns cinco passos de distância. - Nossa, desculpa! Eu perdi a hora... Você esperou muito?

-Não. - Menti. Ele parecia sinceramente chateado por ter demorado. Isso me agradou, quem sabe fosse fácil conviver com ele.

-Bom, então vamos. -Abriu um sorriso desajeitado.

Ele tirou a mala de minhas mãos, entrou no carro e jogou-a no pequeno espaço atrás do banco. Também entrei. Estava um pouco mais quente ali dentro. Agradeci por isso. Ainda não era noite, mas o céu não tinha sol, só uma claridade mórbida de dias nublados. Suspirei, iria ver o céu assim várias vezes...

Antoni me perguntou sobre minha mãe e as coisas por lá. Acho que Alessandra não contou o verdadeiro motivo de eu estar ali. Depois ele ficou se desculpando e explicando o atraso. Eu simplesmente assentia e o perdoava. Ele não parecia se convencer e se desculpava novamente. Era cômico, se não trágico.

-Pela milionésima vez, tio: Eu te perdôo!

-Me desculpe! - Ele deu um sorriso sem graça.

Revirei os olhos. Ele não iria parar de pedir desculpas. Então não o perdoei mais, apenas deixei o assunto morrer. Acho que ele só gostava de ouvir suas desculpas verbalizadas, sem esperar uma resposta de volta. O resto da viagem foi silenciosa. Chegamos a La Push e depois à casa de tio Antoni. Estava escuro e não tive uma boa visão da casa.

O motor parou estacionado na garagem. Ele saiu da picape. Eu vinha logo atrás carregando minha mala. O segui pelo pequeno lance de escadas que levava a varanda em frente da casa. A porta principal ficava bem no centro da varanda com uma janela de cada lado. Uma mesinha e quatro cadeiras ficavam no lado mais distante da varanda e um vaso de barro ficava ao pé da escada.

Antoni girou a chave e abriu a porta. Deu alguns passos e tateou a procura de um interruptor. A casa se iluminou. Não havia divisão entre os ambientes. Um balcão separava a cozinha da sala de jantar, que consistia apenas em uma grande mesa de madeira com cadeiras. Ao lado esquerdo da porta havia um cabide onde Antoni pendurava seu casaco. Ao lado direito estavam a TV, duas poltronas e um sofá. Mas o que chamava atenção eram os livros. Esparramados sobre a mesa, as cadeiras e as poltronas. Eles tomavam a casa inteira como se a reivindicassem para si.

-Bem-Vinda! - Ele punha as mãos sobre meus ombros espiando por cima a casa com um sorriso.

-Desculpe pela bagunça... - o sorriso se desfazendo - Eu ainda preciso arrumar algumas coisas.

Aquilo precisava muito mesmo de uma arrumada. E quando ele disse “ainda...” me perguntei se poderia ter estado pior. Meu Deus! Antoni devia ser um desastre em organização. Meu quarto não chegava aos pés daquilo, e olha que minha mãe sempre reclamava...

-Mas deixa que amanhã a gente arruma!

Segurei no sofá ao meu lado. “A gente arruma...”! Quantas horas eu ia levar arrumando aquilo? E desde quando eu fazia parte de uma equipe naquela casa? Eu não era apenas a prisioneira? Já sei, era o serviço comunitário da prisão. Merda!

-Ah, seu quarto fica lá em cima. - Ele apontou para as escadas que até então não tinha notado. Subimos.

-Aqui. - Ele parou diante da segunda porta da direita. - Eu deixei este arrumado para você assim que sua mãe avisou que você viria.

-Obrigada... - Sorri gentilmente. Mas no fundo esperava ver algo parecido com o que estava lá em baixo. Afinal, Ele arrumou...

Antoni abriu a porta e acendeu a luz. Fiquei surpresa. Não havia livros ali! Olhei ao redor enquanto andava. Era espaçoso. Tinha uma cama de casal pequena, uma mesinha de cabeceira, um armário, um sofazinho e uma mesa com computador.

-Uau, obrigada tio Antoni! - Sorri sincera, devia ter dado muito trabalho para ele arrumar aquele quarto.

Ele deu de ombros. - Vou deixar que se acomode, estarei lá em baixo se precisar.
Fechei a porta assim que ele saiu. Atirei a mala em cima da cama e me atirei ao lado dela. Braços cruzados sobre a cabeça. Respirei fundo. Era um novo começo, longe de L.A , de Luca, de rebeldias, de mamãe. Meu coração se apertou a menção da última perda. Como minha mãe ficaria sem mim? Ela era forte. Quando meu pai nos deixou (eu tinha uns quatro anos) ela me criou sozinha. E sempre se saiu bem no serviço, sei disso porque ela ganhara quatro promoções nos últimos seis anos. Ela era economista e administradora, fizera as duas faculdades ao mesmo tempo. E queria fazer uma pós agora, sem mim por lá seria mais fácil.

Virei o rosto e vi minha mala. Eu ainda não sabia o que tinha ali dentro. Parecia pequeno demais para ter tudo o que eu precisava, quer dizer tudo de que “na minha concepção” eu precisava. As duas coisas eram bem diferentes. Abri o zíper e joguei tudo em cima da cama. Um par de tênis, várias camisetas, casacos e calças choveram sobre a cama. Não era nem de longe metade do conteúdo do meu armário em LA, mas a maioria das roupas que eu tinha eram de verão, o que as tornava inúteis para minha nova morada.

Tinha mais uma coisa: Uma sacola com materiais de uso pessoal (escova e pasta de dente, champoo, pente...), minha bolsa surrada favorita, meu mp5, meu pendrive, uma bolsinha com minhas economias e alguns acessórios como pulseiras. Nada mal!
Atarefei-me em arrumar as coisas no meu novo armário. Não preencheu nem um terço dele. Depois coloquei os eletrônicos na mesa do computador, agarrei a sacola de objetos de uso pessoal e um pijama e corri para o banheiro. Foi um alívio imenso tirar aquela imundice toda de mim.

Voltei para meu quarto sem o menor sono. Estava muito escuro lá fora por isso não pude ver nada pela janela do meu novo quarto. Acabei indo para o computador. Vi se tinha algum recado da minha mãe. Nada. Então escrevi para ela, pulando a parte do atraso de Antoni. Foi mágico ver que eu realmente tinha internet! Quer dizer eu estava conectada ao mundo mesmo naquele finzinho de mundo... Passei a noite passeando pela web, até que fiquei com sono. O que foi bem depois de Antoni ter ido dormir.

Fechei os olhos e dormi. Uma névoa branca me envolveu e me vi dentro de um sonho. Nele eu corria sem direção em uma floresta estranha, corria como se fugisse de algo. No caminho o chão sumiu sob meus pés e eu caí. Caí numa clareira.

Estava escuro, mas as nuvens se moveram e a lua iluminou a noite. Era uma perfeita bola branca de luz. Vários pares de olhos me rodeavam na clareira. Eram homens de pele vermelha e cabelos escuros.

Um parecia se destacar. Devia ser o líder. Tinha os cabelos mais grisalhos que os outros e me encarava bravo. Meus olhos prenderam-se nos dele como se estivesse sendo sugada pela negrura sobrenatural deles e tudo pareceu girar em espiral ao meu redor, menos os grandes olhos deles que estavam fixos em mim...



2. Fotografia

Estava super desperta. Minha mente escaneava cada rosto do sonho. Não sei bem porque, mas sempre acreditei que sonhos eram avisos do subconsciente. Nunca tive nenhum tipo de premunição ou coisa assim, mas nunca se sabe...

Um barulho me assustou. Ele vinha da minha barriga. Era fome. Eu não tinha jantado e comera pouco ontem. Desci correndo para a cozinha. Tio Antoni não se importaria se tivesse um pouco de ovos mexidos e lingüiça para o café da manhã. Arregacei as mangas e cozinhei. O que não era meu forte. Mas até que me saí bem. Claro, que ovos mexidos não tinham nenhum segredo de preparo. Coloquei a mesa e comecei a comer minha parte.


-Com fome, ehm! - Tio Antoni entrava na cozinha.

-Bom dia tio! - Abri um sorriso entre as garfadas de ovos mexidos.

-Desculpa! Não lhe servi um jantar, não é mesmo. Que ótimo anfitrião! - De novo se desculpando por tudo e por nada.

-Imagina. Eu nem estava com fome ontem...


Não sei se ele acreditou ou se só queria atacar seu prato de comida. Quem liga. Ele não se desculpou mais.


-Sua matricula já esta feita, . - Ele falou distraído - Tomei providências, vão mandar seu histórico em breve... Você começa amanhã.

-Ah, que legal! - Não contive meu sarcasmo.

-Qual é! Melhor começar de uma vez. Ficar enrolado não resolve nada. E além disso eu já vou pra lá na segunda mesmo.

-Como assim? - Acho que perdi alguma coisa.

-Bem, é que eu sou professor de História da escola da região... - Ele falava sem jeito, sabia que era embaraçoso ter um parente professor.


Tentei ser otimista. Era difícil. Eu já era a garota nova e esquisita, agora também ia para a escola no carro do professor de História. Ninguém merece!


-Prometo que não vai ser tão ruim assim.


Coitadinho. Ele até tentava.

Tirei os pratos da mesa e fui para a pia. Procurei o detergente por toda a parte, mas não achei em lugar nenhum. Antoni apareceu atrás de mim e disse que ele lavava a louça, já que eu fizera a comida. Ele insistiu e eu achei justa a troca.

Passei o resto do dia carregando livros. Meu tio tinha um monte deles. Levávamos a maioria para o escritório. E se eu achava que na sala tinham muitos livros é porque não tinha visto o escritório.

Levou uma eternidade para conseguirmos por todos em ordem. A maioria era de História, eram poucos os de ficção, e alguns clássicos da literatura preenchiam o que viria a ser duas prateleiras inteiras. E na parte de História havia também as divisões por temas: Historia Nacional, Mundial, Moderna, da Arte, da Arquitetura, da Evolução, da Idade Média, da Mitologia Grega, do Egito, da América Latina, da Europa... Arrumamos tudo.

Tirando a camada superficial de livros aparecia outra coisa para se organizar. A papelada. Tio Antoni devia estar fazendo algum tipo de pesquisa. E devia ser uma pesquisa importante. Eu diria que ele se empenhava nela há anos, ao julgar pelo volume de material coletado. Fiquei interessada. Sobre o que seria a pesquisa?
Agarrei uma pasta e a folheei. Meu tio estava muito ocupado no escritório arrumando outra pilha de pastas, ele não me veria xeretando.

Eram basicamente fragmentos de textos e anotações feitas à mão. Olhei para o escritório, Antoni ainda estava ocupado. Parei numa página ao acaso e comecei a ler. Era algo sobre mitologia indígena. Pelo visto esse povo em questão idolatrava um Deus-Lobo ou coisa parecida, do qual se consideravam descendentes. Falava, também sobre um Deus-Mau, parecia que eles o chamavam de “frio”, pelo menos era isso que tio Antoni anotara como tradução para a palavra estranha que dava nome ao Deus.

Sinistro! Quis saber de que povo era aquele mito. Mas na página não mencionava o nome da tribo. Folheei mais um pouco.

Meu tio ainda estava distraído no escritório. Algumas páginas tinham imagens pretas e brancas de desenhos indígenas. Na vida real deveriam ser coloridas e cheias de vida. Deviam ser lindas. Páginas e mais páginas passavam e nada de nome. Voltei para o começo, devia de ter um título com o nome. Achei. “Mitologia Quileute”.


-! - Dei um pulo.

Será que ele tinha me visto? Será que ele ficaria bravo? Não parecia uma voz de repreensão. Mas era de urgência.

-O que foi tio? - Larguei a pasta junto das outras na mesa de jantar e fui até seu escritório.

-Uma ajudinha aqui, por favor? - Ele estava curvado tentando apanhar alguns papéis. Parecia travado naquela posição.


Ajudei-o a se levantar. Suas costas estalaram como um galho seco quebrando ao ser pisado. Ele se sentou na cadeira ao seu lado. O rosto agonizante. Agradeceu no meio de um gemido. Dei um sorriso tristonho. Ele tinha cinqüenta e três anos, se não me enganava, e vivia ali sozinho há muito tempo. Senti-me impelida a ajudar enquanto estivesse por ali. Começando por agora. Abaixei-me e peguei as folhas caídas. Deixei-as todas alinhadas em uma pilha perfeita.


-Onde quer que eu ponha?

-Ali ao lado daquela pilha. -Esticava o dedo indicador apontando o lugar para mim.


Dei a volta na mesa e as coloquei no local indicado. Meus olhos captaram uma foto entre os papéis na pilha ao lado. Estreitei os olhos. Era o tio Antoni ao lado de um homem desconhecido. Parecia antiga. Meu tio não tinha tantos cabelos grisalhos e parecia mais corado. Mas o homem ao seu lado me pareceu familiar.

Sua pele era vermelha, os cabelos compridos e negros presos em duas tranças, o rosto redondo e com marcas profundas, seus olhos negros e intensos pareciam me encarar.


-Quem é esse? - Levantei a foto no ar e apontei o desconhecido familiar.

-Ah, esse é Billy Black. Ele é... Bem, é como se fosse o chefe dos Quileutes. Aqui na reserva todos valorizam muito sua opinião, pedem conselhos... Também é um bom amigo. - Houve uma pausa respeitosa enquanto ele se recordava do bom amigo – Conheci-o quando me mudei para cá, há uns quinze anos. Comecei minha pesquisa e ele me ajudou bastante, devo muito a ele...

-Ahm... - Foi tudo que eu pude dizer.

-Por que o interesse? - Ele levantou uma sobrancelha.

“Porque ele é um baita de um gato.” Não, acho melhor não usar sarcasmo.

-Ah, só por curiosidade mesmo. -Isso parece bem mais educado.


Teria que tomar mais cuidado com o que saia de minha boca. O sarcasmo, que sempre fora meu companheiro inseparável, acabou por se tornar algo tão natural como respirar para mim. E às vezes ele podia irritar e machucar as pessoas ao meu redor. Era uma arma. Meu mais particular mecanismo de defesa. Além dele, ainda tinha incorporado um bocado de palavras ao meu vocabulário, nenhuma delas digna de uma conversa minimamente educada.


-Billy Black. -Repeti só para mim mesma.

Meu tio que falasse o que quisesse. Aquele não era só a pessoa respeitável e amiga que ele descrevia. Era o homem mal-encarado do meu sonho.


3. Clichês


Acordei preguiçosa na manhâ seguinte. Era dia de aula. Vesti qualquer coisa e peguei minha velha mochila. Tio Antoni já tomava o café quando cheguei à cozinha. Respirei fundo. Ia ser um longo dia.
Chegamos à escola e ainda estava praticamente deserto. Os professores deviam ter que chegar mais cedo. O que era um alívio, ninguém me veria chegando com um professor.
Bati a porta do carro e encarei minha nova escola. Consistia em dois prédios de três andares ligados por um grande pátio, com o que parecia ser um ginásio de esportes ao fundo. A pintura tema era de um tom marrom.
Antoni carregava o que preparara para a aula hoje. Dois carros já tinham chegado ao estacionamento, os alunos saindo de seus interiores. Senti-me estranha por estar ao lado de Antoni. Corri para as escadas me afastando dele.
-... -Ele me chamava ao longe.
Estava de boca aberta. Provavelmente porque nunca viu um aluno novo entrar correndo na sua nova escola. Realmente parecia muito incoerente. Eu tinha meus motivos.
-Eu vou à secretaria. Não se preocupe comigo. - Gritei do topo da escada.
Não foi difícil achar a secretaria. Tinha uma placa bem grande na sala que ladeava um dos prédios de salas de aulas. Reduzi o passo e entrei.
-Sim? - A moça do balcão se virou para mim.
Era nova, mas tinha um ar de tédio e impaciência que era típico daquelas velhas chatas que pedem silêncio na biblioteca.
-Ahm... Sou . Sou aluna...
-Aluna nova. Já sei. – Estendeu uma folha de horários com um grande sorriso. Encarei a folha.
-Mais alguma coisa? - Ela parecia brava por eu ainda estar ali.
-Err... Na verdade, sim. - Peguei uma folha amarrotada no fundo da minha mochila e entreguei a ela. – É um atestado médico para educação física.
A mulher desdobrou o papel e passou os olhos por ele.
-Esta certo. Vou passar para o seu professor.
Ficou feliz por eu sair dali. Os atestados eram um velho truque. Tinha sempre uns cinco à disposição. Este dizia que eu tinha um problema no joelho me impedindo de praticar atividades físicas. Não reparei nenhuma expressão na mulher que me atendeu, enquanto ela lia o atestado. Desta vez colou.
Eu não era preguiçosa. Realmente não podia praticar esportes, só o motivo que era outro...
Agora a escola era bombardeada de alunos. Vários eu reconheci como sendo de parentesco Quileute. Outros, em menor numero, eram brancos feito gesso, mais ou menos como meu tio. Não me encaixava em nenhum dos grupos. Eu era algo intermediário, nem branco nem vermelho. Um tom mais para o salmão. Fiz uma careta com a comparação. Salmão. Eca!
Os alunos começavam a entrar nos prédios. Olhei meu horário. Minha primeira aula era de... Biologia. Na frente vinha o número da sala, o problema era em qual dos prédios ficava. Parei no meio do pátio, olhei de um prédio para outro. Qual seria?
Alguém esbarrou no meu braço. Cambaleei. Parecia que um trator tinha batido em mim. Minha mochila se esparramou no chão.
-Eih, olha por onde anda! - Gritei para o menino Quileute alto que já ia ao longe. Ele nem se virou.
Abaixei-me para pegar a mochila. Ela não estava lá. Parei no meio do caminho, confusa.
-Aqui! - Um garoto segurava minha mala casualmente - Toma, é sua. – Ele me entregou com um grande sorriso nos lábios.
-Obrigada.
Olhei desconfiada para ele. Sei bem, pelo meu repertório de filmes, o que costumava estar por trás dessas ajudinhas...
-Ah, você é nova por aqui, não é? - Outro clichê de filme. Agora só faltava me perguntar sobre o clima.
-Deu para perceber? - Fiz uma cara de espanto exagerada.
-Sim, com certeza! - Risos.
-Sou o Quil - Estendeu a mão.
-. - Apertei sua mão. Minha pele parecia muito mais salmão, agora que estava em contraste com a pele vermelha dele.
-Ahm... Será que você sabe me dizer onde fica a sala 21B? – Não queria levar a conversa adiante, mas ele estava sendo “simpático” e eu realmente precisava de ajuda.
-Claro. Fica bem perto da sala para onde vou... - Estava feliz em ajudar, como eu imaginava.
Entramos no prédio da direita. Quil ficou falando sobre a escola, os alunos e a praia de La Push. Também me fez algumas perguntas, tudo muito trivial.
Minha sala ficava no segundo andar. Reparei que todas as salas por onde passávamos eram B. isso ajudava muito. O prédio da esquerda era de salas A e o da direita era de salas B.
-Legal te conhecer . - Paramos em frente a minha sala de aula.
-Igualmente.
-Bem, se precisar...
-Pode deixar que eu grito. - Ele saiu a caminho da sua sala de aula.
Uau, já tinha um amigo! Entrei na sala quase toda ocupada. Peguei uma das cadeiras vazias. Assim que sentei o professor entrou.
-Bom dia! - Foi até sua mesa e seus olhos caíram sobre mim imediatamente. – Temos uma aluna nova hoje turma, - Todos se viraram para mim. – Espero que goste daqui. Seja bem-vinda!
-Obrigada. - Falei tão baixo que nem eu me ouvi.
Tinha certeza de que os olhos de todos na sala se prendiam em mim. O professor escreveu seu nome na lousa e o falou em voz alta. Depois da pequena apresentação, começou a aula.
O senhor Handel estava ensinando citologia. Centenas de nomes de organelas desfilavam por seu discurso. Tinha uma vaga lembrança sobre o assunto. Lembrava alguns nomes e de ter aprendido suas funções. No entanto havia um buraco negro na minha memória escolar. Um buraco negro em minha vida. Tudo parecia incrivelmente difícil agora. Minhas notas estavam uma catástrofe, iria precisar de um milagre para passar de ano.
Duas meninas cochichavam entre si e me olhavam. Deviam ser as metidas da turma. Algo no jeito delas agirem me irritava profundamente. Uma era completamente branca, até os cabelos loiros pareciam claros demais, a outra era tão branca como a primeira, mas era ruiva e de bochechas sardentas. As roupas nada modestas, as faces maquiadas e as risadas histéricas. Faziam-me lembrar da minha antiga escola em L.A.
Fechei a cara, até em Forks não se podia fugir desse tipo de coisa. As metidas vinham inclusas, junto dos outros clichês da escola, no pacote.
O sinal tocou. A última frase do senhor Handel foi cortada ao meio e ninguém quis se dar ao trabalho esperá-lo terminar. As duas garotas saíram da sala dando risadinhas enquanto lançavam olhares na minha direção.
-Olá! - Outra garota que mais parecia um fantasma parou na minha frente, tapando as metidas que saiam. - O meu nome é Judite, o seu é , certo?
Acenei com a cabeça. Ela sorriu.
-Bem vinda a Forks! Se você gosta de cidades pequenas, chuvosas e geladas, veio ao lugar certo.
-Sorte a minha...
-Então qual é a sua próxima aula?
-Ahm... - Desdobrei meu horário – Matemática.
-A minha também! - Tradução: vou com você e assim tenho mais tempo pra descobrir fofocas.
Suspirei. A sala da próxima aula não ficava longe. Era no andar de baixo. Judite ficou falando durante o caminho as fofocas do momento, apontando casualmente alguém que passava e me dando uma ficha completa da pessoa em questão.
-Aquelas duas - Ela balançou a cabeça em direção as duas meninas da aula de biologia. – são Alana e Serena. Elas entraram ano passado e já são as piranhas daqui. Umas megeras! Não sei como os garotos podem gostar tanto delas.
Como eu já tinha dito: era o clichê de toda escola. Entramos na sala de aula e sentamos uma ao lado da outra. Uma amiga dela se juntou a nós.
-Bom dia! - Ela tinha a pele avermelhada e os cabelos escuros ondulados.
-Oi Hellen! Esta é , é aluna nova...
-Ah, prazer! Ela sorriu gentilmente e se sentou atrás de Judite.
-Igualmente. - Respondi.
O papo continuou. Agora Hellen adicionava alguns comentários extras na reportagem sem fim de Judite. Ela parecia não se importar com a audiência, eu podia nem estar ali que ela continuaria tagarelando. Quando já tinha coberto todas as notícias possíveis sobre as pessoas da sala, começou a falar das que não estavam. Fiquei completamente perdida. Hellen percebeu.
-Acho melhor continuarmos no refeitório. Todo mundo vai estar lá... – Ela sugeriu.
-Tem razão... - Judite cogitou a possibilidade, mas não estava com vontade de parar de falar. – Ah, ... Ainda não te perguntei nada. De onde você veio?
Seus olhos brilhavam de curiosidade. Sinceramente estava muito feliz que ela não tivesse perguntado nada até então. Mas tudo o que é bom dura pouco! Por que não começar meu massacre logo pela pergunta mais difícil?
- Los Angeles.
-Sério! - Os olhos das duas, arregalados. - Que demais! Não acredito. Deve ser tão legal! Não sei como você pode se mudar pra cá...
“Nem, eu! Mas, deve ter algo a ver com minha mãe tentar me afastar da criminalidade.”
-Como é L.A, ? Ouvi dizer que é imensa e maravilhosa! Conta, vai...
Já esperava esse tipo de reação. Eu era a garota da cidade grande! Iriam exibir-me como atração de circo.
Suspirei aliviada quando a professora finalmente entrou em sala. A conversa teve de parar. E eu estava salva pelo menos pela próxima hora...


4. Sam

Ao bater o sinal, saí o mais rápido que pude da sala para minha próxima aula. Era diferente da próxima aula das minhas novas amigas curiosas, mas infelizmente era de História, o que significava que Antoni iria me dar aula. Mas, por mais que eu relutasse, ele não fez nada embaraçoso. Pela primeira vez naquele dia pude ficar sentada numa carteira sem os olhares dos outros alunos me secando. Até parecia ser outra pessoa na frente da sala de aula, ele era extrovertido e bastante claro em suas exposições. O tempo pareceu voar. E o sinal tocou de novo. O que significava que era hora de ir ao refeitório.

Antoni pareceu captar meu olhar de desânimo e fez um sinal para conversarmos. Só que antes que eu chegasse à mesa, outra pessoa chegou. Quil segurava algumas folhas desajeitadamente e falava sem parar desculpas e justificativas para entregar um trabalho atrasado.

-Vou ler, verei o que posso fazer... Mas não vai valer nota máxima, vou descontar alguma coisa pelo atraso. – Meu tio suspirou passando os olhos pelas páginas.
Quil parecia feliz com a proposta. Virando-se para mim Quil me reconheceu.

-Nossa, aprendeu rápido! Nem precisou gritar por ajuda para chegar até aqui!

Tio Antoni arregalou os olhos. Parecia não gostar que Quil já me conhecesse.

- Já fez amigos. Isso é bom... Está se adaptando rápido. Gostou daqui?

Quil aparentemente ficou mais confuso do que meu tio, ao ver que eu já conhecia um professor.

-Sim, é normal que nem todas as escolas.

- Fico feliz. Agora é melhor você ir almoçar.

Concordei e sai da sala com Quil logo atrás.

- Você conhece o senhor Felder?- Ele tentava não mostrar o quão estranho aquilo parecia ser.

- Sim. Ele é... Meu tio. Eu aparentemente moro com ele de agora em diante.

Um silêncio um pouco desconfortável se instaurou. Quil de repente parou e parecia que uma lâmpada tinha se acendido sobre sua cabeça e uma idéia brotado instantaneamente.

-Então você podia pegar uma cópia das provas! Nossa que maravilha, ia ser moleza pra você.

- Não, eu não vou roubar coisa alguma.

-Qual é!

- Sério, eu não quero fugir da linha. – Pelo menos não de novo. – Tenho certeza que consegue passar sem trapacear.

Ele resmungou alguma coisa que eu não entendi. Seguimos até o bloco B e viramos por trás dele. Uma construção baixa e grande estava cheia de alunos e um cheiro meio enjoativo de comida vinha lá de dentro. Lá dentro havia um balcão onde bandejas vazias eram trocadas por outras cheias, e uma mulher de aspecto grosseiro jogava colheradas de algo de dentro de várias panelas prateadas nos pratos dos alunos que passavam em fila. O restante do espaço era ocupado por mesas e mais mesas circulares. Entramos na fila.

- Mas e então, fez amigos?

- Além de você, conheci duas garotas, Judity e Helen. Conhece?

-Não. Pelo menos não pelo nome. Depois você aponta quem elas são.

-E você, qual é a sua rodinha? - Olhei os aglomerados de cada mesa, procurando um grupo que parecesse o dele. Atletas, nerds, músicos... Todos pareciam se segregar. Como de costume.

- Aquela. - Ele apontou um bando de garotos altos e fortes de pele avermelhada. - Ou pelo menos era.

-Como assim? – Me concentrei mais no grupo. Pareciam ser irritadiços e um pouco contidos. As posturas muito firmes embora cada um tivesse uma bandeja cheia de comida a sua frente e a devorasse com vontade. Havia uma única garota no grupo. Ela também era alta e tinha cabelos bem longos, com um quê de aventureira, como garotas que estão estampadas na capa de panfletos de esportes radicais.

- Bom, eles eram meus amigos, mas essa agora é a gangue do Sam. É o da esquerda.

– Ele apontou o que parecia ser o mais velho. – Ele é muito estranho. No começo ele era só aquele valentão solitário que ninguém entende, foi então que Paul começou a segui-lo e depois todo o resto deles. É muito estranho, porque Jake e Embry sempre acharam o cara sinistro e jamais seriam amigos dele... Embora que agora só andem com ele, provando que estava enganado.

Quil estava muito chateado com a situação, ele era um cordeiro desmembrado de seu rebanho, assim como eu era. Um pouco de simpatia se instalou entre nós. Ambos estávamos no mesmo barco. Coisa que eu realmente não gostaria de admitir.
Observei Sam com mais atenção. O cara realmente deveria ter algum dom para influenciar pessoas, como o tipo de gente com quem eu costumava andar no meu último ano de desventuras, mas havia algo de estranho naqueles olhos escuros. Eu sabia que já os havia visto e mesmo naquele dia.

Vasculhei minha memória sem sucesso enquanto vasculhava suas feições. Seus olhos encontraram os meus por alguns segundos e depois ele se virou de costas rapidamente. E então eu vi! Uma tatuagem preta e circular com algum padrão que eu não descobri se via por baixo da leve camiseta branca que ele usava. A mesma tatuagem do garoto Quileute que me empurrou mais cedo.

O sangue começou a fluir para as extremidades do meu corpo. Ele era um tremendo de um troglodita, eu ainda podia sentir meu ombro latejando por causa do impacto, e tinha roubado os amigos de Quil. Está certo que eu não estava tomando as dores dele realmente, e sim achando um alvo para descarregar toda a minha raiva acumulada.

A moça do balcão jogou algo pegajoso no meu prato e Quil pegou um pudim para juntar ao meu “almoço”. Eu não queria arranjar encrenca, não mesmo. Só que parte de mim gritava para eu me atrever. E essa parte gritava bem alto. Comecei há muito tempo atrás a ponderar até onde era certo ouvi-la, porém eu sempre me convencia a ceder espaço e seguir as instruções que ela me ditava. Como agora, eu não necessariamente estaria me encrencando, simplesmente podia ir até lá e conversar. Conversar era algo bem tranqüilo e nada fora da linha. Eu podia muito bem ir até lá e conversar com Sam...

Quil me olhou com as sobrancelhas arqueadas sem entender meu conflito interno, ele se encaminhava até as mesas enquanto eu estava empacada no final do balcão.

-? - Foi tudo o que ele conseguiu dizer antes de eu virar e ir em direção da mesa dos trogloditas viciados em esteróides. Pude ver sua boca escancarada antes de chegar até lá.

-Com licença! - Ensaiei um sorriso mais ou menos educado enquanto o burburinho parava e as cabeças à mesa se voltavam para mim.

- Sim? - Um dos garotos perguntou com uma risada estranha.

- Bom... Eu sou nova aqui... – Não acreditava que estava falando aquelas palavras. Apoiei minha bandeja num canto da mesa.

- É, deu pra perceber! - Outro garoto respondeu se ajeitando na cadeira.
Eles estavam caçoando de mim. Claro que isso aconteceria; só que eu ia virar a mesa. Puxei a cadeira do tal Sam, ele estava de pé, girei-a e me sentei de frente para ele. Olhares desconcertantes me cercaram, alguns de raiva e outros de espanto.

-Bom, eu queria começar com o pé direito, sabe. – Aconcheguei-me em sua cadeira. –Toda a escola que se preze tem um valentão, mas obviamente esta aqui tem uma ótima reputação! - Algumas poucas pessoas que ouviam nas mesas em volta riram. - Eu só quero garantir que não haverá problemas futuros, como empurrar pessoas e não se desculpar, isso realmente me incomoda.

Levantei as sobrancelhas insinuativamente para Paul e pude ver um traço de reconhecimento em seu olhar. Paul se inclinou por sobre a mesa derrubando bandejas com os punhos a mostra, seu corpo tremia com a raiva e seus olhos estavam muito escuros. Inclinei meu rosto para o lado sem realmente sair do lugar. Rapidamente dois dos garotos caíram por cima dele para detê-lo. Eles o arrastaram para fora do refeitório e tentavam acalmá-lo.

-Pavio curto o do seu amigo... – Balbuciei para Sam quando me recuperei do susto. Apenas ele tinha sobrado à mesa.

-Nós não queremos encrenca. Nunca quisemos, mas a encrenca sempre aparece... Não precisa se preocupar connosco, não seremos problema para a aluna nova! - Observei-o se levantar e sair pela porta lateral que ficava logo ali a menos de dez passos.

Os olhares de Helen e Judity e mais umas dezenas de outras pessoas se prendiam em mim. Minha bandeja agora estava virada de cabeça para baixo no chão. Caminhei para fora do refeitório e tomei o caminho oposto ao do que Sam tomara. Eu ficaria de olho naquele grupinho!


5. Mentiras

As semanas passavam mais depressa do que imaginava ser possível. O tédio arrasador me deixava numa rotina desgastante, mas ao invés de fazer o tempo se arrastar infinitamente tudo o que ocorria era um encurtar do meu tempo para qualquer atividade. Já estava me sentindo como um vegetal.

Eu sentava em frente da TV e quando dava por mim o dia inteiro havia passado lá fora pela janela sem ao menos se preocupar em dar um olá; ou então me deitava para tirar um cochilo e quando via já tinha virado 12 horas seguidas dormindo.

Nos dias de semana o tempo voava de sala em sala e de aula em aula. Graças ao meu tempo livre na educação física não precisava perder mais tempo em casa com o dever que ironicamente era intitulado para ser feito em casa, e assim meu tempo vago se abria diante de meus olhos como um oceano gigantesco. Para não dizer que nada ocupava o espaço cada vez mais oco dos meus pensamentos, eu me empenhava em duas coisas: observar bem de perto o grupo os nativos cheios de esteróides e mal encarados na escola e mergulhar sem ser chamada na pesquisa sobre os Quileutes de meu tio em casa.

O resto da minha mente era um borrão disforme, incluindo os problemas na escola. Helen e Judity já estavam ficando irritadas com minha falta de interesse em ouvir suas ladainhas ou dividir minhas experiências de vida. Eu não me esforçava nada para mantê-las por perto e sentia o pequeno elo que tinham criado se enfraquecer aos poucos. A verdade é que seria muito fácil chamar a atenção ali, eles só queriam histórias fabulosas! Jogavam verde todo o tempo para terem contos novos e escutavam tudo com olhos brilhantes feito um bando de crianças. Cada pequeno sussurro que se tratasse sobre LA rodava a escola em menos de um minuto e era fácil ver pessoas parando de falar abruptamente quando eu chegava. O problema de minha boca fechada é que se eu não podia contar as historias, então qualquer outro podia. Um bando de boatos medonhos corria pelas paredes, parte das conversas chegou ao meu ouvido e era absolutamente assustador ver o quanto conseguiam aumentar ou se aproximar da realidade.

“Ela é toda tatuada!”

“Jura? Bom, eu nunca vi nada.”

“Você já viu o piercing no nariz e nas orelhas, aquilo não é nem metade! Eu vi no vestiário do ginásio, ela tem mais um monte de tatuagens e piercings...”

“Uau, onde? O que ela tem tatuado?”

“Ah, eu não fiquei examinando a garota, se quiser vá você verificar, seu tarado... Mas, tem uma nas costas de um dragão vermelho e preto e outras de uns símbolos estranhos. Não sei bem o que eram. Deviam ser de gangues ou mesmo da cadeia.”

“De gangues?! Da cadeia?! Vocês estão brincando, não é?”

“Lógico que não! Ela não estaria brincando sobre uma coisa dessas. E, além disso, eu mesma sei que ela esteve com a ficha suja! Por que você acha que a família a mandaria pra cá? Mesmo sendo expulsa do colégio ela poderia entrar em outro qualquer lá mesmo.”

“Ela tinha que fugir dos tiras! Ou mesmo de alguma das outras gangues com as quais se envolveu... Ninguém nunca viria procurá-la pra cá.”

“Opa, opa... que outras gangues? Você nem sabe se ela fazia parte de uma gangue e agora ela já fez parte de um monte delas!”

“Não seja burro! Ela tinha tatuagens demais pra ser só de uma gangue. E eu tenho certeza que ela fez parte de gangues! Você não viu como ela foi pra cima do Sam?”

“Claro que vi, não sou cego! E em que tipo de gangue você acha que ela esteve?”

“Meu Deus! Não era do tipo de sociedade filantrópica e de trabalho comunitário que estou falando.”

“Você que dizer que ela fazia parte do tráfico... de drogas.”

“Sim. Drogas, armas, peças de carros roubados... prostituição.”

“A garota é uma puta! Deus, alguém me passa o telefone dela, quem sabe ela cobra barato...”

A conversa parou aí em meio de risadas enquanto eu virava no corredor em frente do grupo. Alana e Serena que falavam com um garoto pálido do time de beisebol. Eu não reagi na hora. O que foi uma infelicidade porque tudo só piorou... Exponencialmente.

Defender-se de ataques desse tipo é estranhamente complicado. Se eu negasse estaria afirmando todas as mentiras que contavam. Se eu batesse nas duas megeras estaria afirmando novamente. E quando eu passei por elas sem fazer nada, estava ignorando porque sabia que era verdade e não teria como desmentir. Bom, pelo menos essa é a brilhante forma de detectar mentiras da sociedade norte americana.

O engraçado é que quanto mais essas mentiras cresciam mais popular eu ficava, e Judity e Helen queriam continuar minhas amigas. Elas me defendiam com unhas e dentes nas discussões requentadas contra Alana e Serena e empinavam o nariz sempre que ouviam burburinhos.

Claro que depois disso tudo elas queriam reconhecimento e confiança... E mais uma pilha de perguntas para serem respondidas choviam sobre mim. Como isso não estava dando lá muito certo, sempre que podiam me contavam algo sobre si mesmas que deveria me instigar a dividir meus segredos com as duas. Eu comecei a ficar tremendamente exausta com aquela pressão vinda de todos os lados, e principalmente vinda de minhas “protetoras” e acabei contando pequenas coisas aqui e ali.

Eu não queria me lembrar da velha e de todos os seus deslizes, só que elas de certa forma me consolavam.

Ter aquelas imagens de um passado confiadas a alguém era como ejetá-las do meu ser e isso me deixava mais leve. Infelizmente a sensação durava pouco, e lá vinha o bando de consolações chorosas e afetadas de minhas amigas.

E as línguas continuavam andando soltas. As mentiras em si eram quase insignificantes. Um mero zumbido de abelhas que teimava em não parar nunca. As histórias não tinham pé nem cabeça. Eu sequer fazia aulas de educação física para alguém ver qualquer tatuagem e muito menos relacioná-las com minhas atividades ilícitas. De fato eu já não tinha tatuagem alguma (já que eram de rena) ou piercings escondidos! O pior era como eles difamavam minha família e viviam dizendo que a nossa renda vinha da venda de nossos corpos e de pó.

Se eu lutasse aquela batalha sabia que perderia. A parte de ser membro de uma gangue e ter sido presa era pura verdade e uma hora essa verdade acabaria aparecendo se eu desmentisse tudo. E quando a verdade chegasse tudo aquilo mais que disseram sobre mim voltaria à tona. Se eu mentia sobre uma coisa, porque não mentiria sobre mais três ou quatro... Era apenas dar murro em ponta de faca tentar responder aos boatos. O melhor a fazer era esperar que algo mais interessante surgisse para ocupar as mentes da escola.

Minha única forma de fugir da pressão era Quil. De certa forma ele era imune à epidemia que assolava o colégio todo. Nada sobre os boatos era comentado por ele, e muito menos havia cobrança sobre qualquer memória do passado que deveria compartilhar. Era revigorante passar um tempo conversando com ele. A pressão parecia sumir.

O único outro foco de imunidade era o pequeno grupo de nativos de Sam. Eles não entravam em conversas sobre o assunto. Na verdade eles jamais entravam em conversas com ninguém fora de sua rodinha.

Quil sempre ficava estranho quando os via. Sua única repreensão contra mim era a cerca da minha pequena discussão com o grupo. Ele dizia que aquilo foi imprudente, o que soava extremamente engraçado aos meus ouvidos, como se fosse um pai de algum amigo meu dizendo aquelas palavras e não alguém da minha idade.

Mesmo assim, não havia nada que de fato me prendesse àquele lugar como eu me sentira presa aos meus antigos amigos um dia. E conforme os dias passaram tornaram-se mais tediosos.

Depois de um mês meu tio achou que seria uma grande idéia passarmos um final de semana diferente. Eu não discordaria! Já estava querendo roubar as chaves do carro dele e sair daquela cidade enfadonha. Mas sua idéia de ‘diferente’ não era muito parecida com a minha.

- Vamos à casa do Billy! - ele disse todo animado depois de terminarmos o jantar de sexta-feira.

Minha cara de desentendida o fez continuar.

- Ninguém melhor do que Billy para conhecer esse lugar. Depois da casa dele podemos ir até a praia de La Push. Você ainda não foi lá, foi?

-Não, mas já ouvi falar. – Revirei um pouco do macarrão ao molho branco que tinha feito mais cedo.

Na verdade tínhamos passado pela praia quando viemos para a casa de Antoni, no meu primeiro dia neste inferno. O fato é que nem me dei ao trabalho de ver a paisagem que não ficava a nem 10 km depois da primeira vez.

Mas aquele passeio não seria apenas um passeio.

Meu tio sabia como todo mundo sobre os boatos no colégio. Até os professores já sabiam. Às vezes eles tentavam apartar as conversas, mas isso era uma missão impossível. Até a enfermeira que fazia vezes de psicóloga informal já tinha tentado falar comigo sobre o assunto. Ela não me procurou depois que desviei da conversa dizendo que não ligava pra nada daquilo, da forma mais fria possível.

Só que eu sabia o que os olhares solidários de alguns significavam. Muita gente estava com pena de mim, incluindo meu tio.

Por isso eu não queria mais me manter naquele tédio mortal, tinha que demonstrar estar bem. E a oportunidade que meu tio me dava era mais uma análise do que um passeio. Eu tinha que ficar empolgada e agir de forma normal lá...
Forcei um sorriso e aguardei o dia seguinte com uma leve apreensão. Por mais que o Billy fosse amigo do meu tio ainda lembrava muito bem do meu sonho com aqueles olhos negros profundos e temia vê-los cara a cara.


6. Jake

O dia amanheceu radiante. Com um céu raro de azul animador.
Durante aquele mês em que vivi no meu novo lar gelado, raramente vi um céu assim. As nuvens cinzentas eram um triste lembrete de onde estava dia após dia. Hoje por sorte era diferente.

Só tivemos tempo de tomar o café antes de correr para a casa de Billy Black. Na verdade foi terrivelmente constrangedoramente curta a viagem. A casa ficava a menos de dez minutos dali e nem precisávamos ter ido de carro.
A casa era pequena e de um tom desbotado avermelhado sobre a madeira na estrutura externa. Um grande gramado verde estava a sua frente até as árvores, o que fazia as divisas parecerem inexistentes. Um telhadinho metálico se via sobressair na lateral da casa.

Antoni parou o carro e um homem que já conhecia estava na varanda estreita nos esperando. Billy Black nos fitava com aqueles olhos negros que aprendi a temer. No entanto, ele não parecia ameaçador. Ele estava em uma cadeira de rodas e parecia bastante indefeso, mas uma aura de poder o rodeava impedindo qualquer desrespeito. Seus cabelos em trança já não eram tão compridos ou negros.

-Billy! - Antoni o cumprimentou.

O rosto redondo abriu um grande sorriso. Ele apertou a mão de meu tio com força, os músculos de seu braço ainda eram bem fortes embora estivesse velho e naquela cadeira de rodas.
Intrigada, imaginei o que teria causado aquela perda de movimento das pernas.
Billy então se voltou para mim amistosamente. Eu o encarei sem dizer nada. Meus olhos ainda enxergando o homem assustador de meu sonho. Seu sorriso não titubeou nem um segundo, apesar de meus olhos o fuzilarem com desconfiança. Antoni se antecipou para acabar com aquele silêncio desconfortável.

-Desculpe, esqueci de apresentá-los. - Ele sorriu forçado. - Essa é minha sobrinha. . E este é meu bom amigo...

-Billy Black! - o velho Quileute o cortou, estendeu a mão para a minha que a apertou prontamente. – Vai ficar aqui por uns tempos, não? Tenho certeza de que vai gostar daqui, apesar de ser bem mais calmo que sua cidade anterior, esse lugar tem muita magia. – Ele apertou minha mão com mais força. Eu aumentei o aperto no mesmo nível. – E você é bem mais forte do que parece, também. Talvez venha bater um braço de ferro com um velho um dia desses.

-Quando estiver pronto para perder, é só me ligar. – Retruquei na hora.

Ele sorriu e se virou para o meu tio. – Não precisa se preocupar tanto com essa garota. Ela sabe bem se virar sozinha! Parece que puxou de alguém toda essa fibra.

Apesar de estar desconfiada, até gostei do elogio. Ele era simpático de uma maneira bruta e rústica. Ele não me dava o menor medo e chegava a me deixar mais relaxada. Billy nos dirigiu para dentro da pequena casa e o seguimos.
Entramos direto na sala, que tinha algumas poltronas, uma mesinha de centro e uma TV. A porta para a cozinha ficava logo à direita. Uma segunda porta entreaberta dava para um banheiro e um corredor aos fundos guiava para os quartos.

O ambiente era mais rústico ainda ali dentro. As paredes eram de um tom palha e vigas de madeira eram aparentes sobre nossas cabeças.
Algumas fotos adornavam um aparador de madeira encostado na parede do fundo da sala. As imagens mostravam cenas de pescadores com seus gigantes peixes e alguns amigos e familiares de Billy junto dele. O anfitrião aguardou que tomássemos nossos lugares e se voltou para meu tio.

- Como vão as coisas no colégio?

-Bem. A mesma coisa de sempre...

- Ah, bom. E Jake não tem dado problemas, tem? - seus olhos ficaram um pouco mais sombrios por trás da preocupação.

-Não, não... De forma alguma. Ele não é um aluno exemplar, admito, mas não causa nenhum problema.

Jake? Eu já tinha ouvido esse nome, só não lembrava onde.

-Você deve estar no mesmo ano do meu filho. – O velho me esquadrinhava pensativo. – A gente fica velho rápido... – ele sorriu tristonho.

Voltei meus pensamentos na procura daquele nome conhecido. Onde eu o tinha ouvido? Ele tinha que ser um dos garotos de pele vermelha, mas isso não reduzia muito o número de candidatos. Irritada revirei minhas conversas tentando lembrar o que a língua ferina de Judite havia dito sobre ele, afinal ela tinha comentários sobre todos.
Um som de uma moto bem próxima rondou o quintal.

- Ah, Jake agora tem uma moto, não é mesmo? Já o vi outros dias no estacionamento. - Antoni parecia um pouco preocupado.

- Pois é, não se pode fazer muito... Um garoto é sempre um garoto, não importa quantas advertências façamos. - Ele deu de ombros. - Sorte sua não ter problemas com isso, já que cuida de uma dama.

Sua face redonda se virou para mim e ele deu uma piscadela sutil. “Você está brincando comigo, seu velho?”. Remexi-me desconfortável na poltrona. Antoni ficou calado fazendo apenas pequenas concordâncias.
Ou aquele homem estava me provocando ou ele não fazia idéia do que falava. Eu podia fazer coisas muito piores do que andar de moto. Já havia feito coisas piores e inclusive já tinha andado de moto algumas vezes.

Embora uma coceira terrível me atingisse, guardei a vontade de falar qualquer coisa. Era melhor que ele continuasse pensando dessa maneira. Tentar não aparentar ser mais do que os olhos de Billy acreditavam ver, afinal eu não confiava nele.

Então, passos subiram na varanda e a porta se abriu. Meu sangue congelou nas veias. Eu conhecia aquele cara e não fazia a menor idéia de que iria encontrá-lo ali.
O susto me fez arregalar os olhos e ficar instantaneamente de pé. Eu queria dar meia volta e sair dali.
Jake era alto e forte de forma a beirar o ridículo. Ele estava sem camisa e todos os músculos de seu abdômen estavam aparentes e bem formados. Seus cabelos curtos e pretos emolduravam um rosto levemente arredondado como o do pai, outra grande herança eram aqueles olhos escuros e profundos. Mas o que mais me assustou foi reconhecer de imediato a mancha negra em seu ombro. A tatuagem. Ele era um dos garotos da gangue de Sam.

Billy me olhou curioso. Eu apenas voltei a me sentar e fingi olhar para outro lugar. Antoni estava ocupado olhando para o garoto na porta e já ia cumprimentá-lo, portanto não viu meu pulo. Billy sem a menor dificuldade deu impulso com os braços e girou as rodas de sua cadeira até chegar ao filho.

-Jacob... - Ele sorriu e depois se voltou para mim. - Essa é , sobrinha de Antoni. Acho que vocês já se conhecem do colégio.

Jake levantou um canto da boca num meio sorriso e murmurou. - Já conheço, sim.

Pela sua cara, estava achando tudo muito divertido. Ele me conhecia muito bem da minha pequena cena no refeitório. Não sei se no fundo estava com raiva, ele apenas mostrava aquele sorriso irônico irritante.

-Que ótimo!- Exclamou meu pobre tio.

-Realmente. Já que se conhecem, Jake pode muito bem ir até a praia com você na frente, e assim deixam um tempo para dois velhos conversarem.

Obviamente, os dois Black estavam se divertindo muito as minhas custas naquele dia. Olhei atônita de Jacob para Billy. Os olhos subindo e descendo entre as duas formas de estaturas tão diferentes.
Antoni concordou na hora, sem notar minha completa confusão. Levantei e fui até eles sem muita firmeza. Sorri amarelo para Jake e engoli em seco quando Antoni e Billy praticamente nos empurraram para fora da casa e fecharam a porta as nossas costas.

-Divirtam-se! - pude ouvir meu tio gritar de dentro da casa. “Uh, tenho que tomar cuidado para não me divertir demais a ponto de morrer”.

Amargurada caminhei para fora da varanda. Jake colocou as mãos no quadril e pendendo a cabeça para trás deu uma grande gargalhada. Tive que me segurar para não correr de volta para dentro de casa. Não faço idéia de qual seria o tipo de humor que aqueles garotos super desenvolvidos tinham. Talvez aquela fosse uma risada diabólica antecipada.

-O que foi? - mesmo com toda a firmeza que consegui juntar, as palavras saíram fracas.

-Nada... Só não achei que chegaria a esse ponto! Ficar de olho na gente até nas nossas casas?
Abaixei os olhos. Estava desconfortável com a situação, mas ele não.

-Espera um minuto. – Ele olhou firme para mim e depois correu para a lateral de fora da casa.

Até parece que eu ia ficar ali parada, aceitando ordens dele! Fui até a mesma lateral da casa. A estrutura do telhado metálico se escondia lá. Sorrateiramente espiei tentando enxergar lá dentro. Não consegui ver nada. O ângulo era muito ruim, apesar de estar ao lado da casa, a estrutura ficava um pouco mais para trás da fachada e a porta mais próxima de mim estava encostada.
Parecia uma espécie de galpão, talvez uma garagem. Pé ante pé, comecei a seguir até as portas duplas do galpão. O caminho esmagado entre a casa e o galpão era de terra e não daria passagem a mais do que um carro pequeno. O barro ainda levemente úmido mostrava as marcas finas de pneus gravadas repetidamente. Pneus menores que o de um carro. A moto dele devia ficar guardada lá dentro. Cheguei quase até a porta, quando Jacob saiu por ela usando uma camiseta branca.

-Não foi aqui que pedi para ficar. – Ele fechou a porta.

Dei de ombros. Não estava recebendo ordens dele ou de ninguém. Notei que o tecido de sua blusa era muito mais fino do que da minha. Era um dia de sol, mas não achei que estivesse tanto calor assim.
Talvez aquele fosse uma tolerância genética ou adquirida pelos moradores da região. Embora a maioria das pessoas estivesse com malhas o tempo todo desde minha chegada. Apenas o grupo de Sam parecia estar imune ao frio, eles sempre iam com regatas ou camisetas de manga curta para a escola.
No começo só achei que fosse para exibicionismo. Só que eles não agüentariam de frio tanto tempo assim. Na verdade ele nem estava de camiseta até alguns minutos atrás. Estranho.

- Guarda a sua moto aí? - apontei para a porta, já me dirigindo a ela.

- Não. – ele não saiu da frente da porta.

Apontei para as marcas de pneu no chão com desdém. Ele seguiu meu dedo até as marcas no barro.

- Não é da sua conta... – Sua face ficou tensa e suas sobrancelhas se curvaram. - Vamos logo pra praia.

Caminhamos pela frente da casa e seguimos em direção ao mar. A trilha, como já era de se esperar, não era asfaltada, embora algumas pedrinhas tivessem sido assentadas para marcar o caminho. As pedras eram cinza e sem graça. A mesma cor que o céu começava a adquirir. Fitei o céu com raiva. Não podia haver um dia sem chuva?

Já estávamos longe da casa de Billy e o caminho estava rodeado de árvores.
Estávamos andando já fazia uns 15 minutos. A mata só ficava mais densa e o percurso mais inclinado. Um paredão de pedra surgiu à nossa direita e se estendia acima das árvores. O silêncio e o andar monótono estavam me dando raiva. Quanto mais eu teria de suportar aquele passeio?

- Seria mais rápido se não viéssemos a pé. - Resmunguei alto o suficiente para Jake me ouvir.

- Isso aqui é um passeio. Não daria para ver muita coisa se fosse de carro. Tente apreciar um pouco da paisagem e deixe de reclamar.

Olhei ao redor. Era tudo verde. As árvores, a grama, as plantas parasitas sobre os galhos, o limo sobre as pedras e cascas dos troncos... Encolhi-me, aquele lugar não tinha nada do verde saudável que a gente vê na teve. Era úmido e sufocante. Doentio como mofo no armário. Tentei buscar o foco em outra coisa e meu olhar foi barrado pela parede de pedra.

- O que é aquilo? - indiquei a formação rochosa.

- Vai me dizer que não tem penhascos na cidade grande?

Parei de andar. Não ligava para os murmurinhos dentro da escola, mas não estava acostumada a ouvi-los fora dela. Muito menos vindo de uma das poucas pessoas que acreditava ser imune. Jake parou alguns passos à frente. Ele inspirou profundamente e depois se virou.

-Foi mal, não quis dizer aquilo.

-Relaxa. Não ofendeu. Se me ofendesse só com isso...

Uma sombra de entendimento percorreu Jake. Ele balançou a cabeça e deu um sorriso azedo. Minha situação não era a das melhores naquela cidade. Não havia muita gente que já não soubesse de mim e toda a minha fama. Ele olhou para mim e depois apontou para a parede cinza atrás das árvores.

-Aquele é um dos penhascos que seguem pela beira do mar. Chega a uns bons 200 metros nas partes mais altas. Muita gente mergulha do alto do penhasco aqui na reserva.

Sorri. Era algo insignificante, mas estava tendo um pouco de colaboração. Pelo menos minha caminhada não precisaria ser silenciosa e amedrontadora.

-Não consigo imaginar metade dos alunos mergulhando de um penhasco... – “embora gostasse muito de empurrar alguns”. Imaginei por um segundo Alana e Serena caindo do alto de um pedregulho.

-Não, mesmo. Só alguns de nós fazemos isso. É algo meio radical de mais para a maioria, mas é incrivelmente eletrizante.

- Pelo jeito que você fala, não preciso perguntar se já saltou de um penhasco.

Ele riu. Não precisava de uma confirmação melhor. – Apesar disso. Tem gente que nem dá para acreditar que pulou. Gente que quase morreu.

O vento soprou gelado, uivando alto em minhas orelhas. Agarrei meu casaco num abraço apertado tentando manter quente. Jacob se quer estremeceu. As árvores abriram espaço para a paisagem desolada da costa.
O chão era encoberto por pedras soltas, as ondas vibravam ao longe e se ouvia o som das cristas se quebrando contra o penhasco.
A parede de rocha se elevava imponente à direita restringindo a praia. No seu topo, mais pinheiros frondosos apareciam. Outras pedras de tamanhos variados, chegando ao de um carro, se erguiam pela lateral esquerda. O solo sobre nossos pés ainda era fofo e úmido e alguns tufos verdes de grama se erguiam até o limiar das pedras.

Segui em frente. Aquela extensão de pedras e areia grossa entre a floresta e a praia era de uns bons quinhentos metros.
Uma estrada passava em paralelo ao mar, fazendo às vezes de divisa entre o verde e o azul. O mar era escuro e o vento que trazia suas ondas era gélido.
Era estranho pensar que aquele era o mesmo oceano que banhava minha ensolarada Los Angeles. Eu pensei que adorasse praias, mas aquela me fazia rever meus ideais.

Segui Jake em silêncio, enquanto tentava entender aquele lugar. Chegamos junto das ondas que levemente puxavam e empurravam o cascalho sobre a areia opaca.
Simplesmente melancólica; essa foi de longe a melhor descrição que encontrei para a praia. Não havia ninguém na região pálida. A areia era tão pouca e espessa que duvidava um dia ter vontade de me deitar nela, o mar soava amedrontador demais para que alguém quisesse nadar nele, embora as ondas fossem bem menores do que as dos surfistas animados da encosta californiana.
Tudo parecia tão oposto às praias que conheci.

Imaginei que algum pintor deprimido tivesse pintado a cena. Porque apesar de não ser nada convidativa, a praia de La Push tinha uma beleza sinistra.
A forma como a pouca luz caia sobre as ondas azul-escuro e as pedras cinzentas e beges, era encantadora. O penhasco produzia um sombreado fantasmagórico e algumas escarpas de sua forma e dos pinheiros no topo poderiam ser confundidas com mastros de um navio na neblina. Os tons verdes das árvores ao fundo complementavam o cenário.

Sentei em uma pedra vendo o mar ir e voltar sem muito interesse. Jacob continuou de pé fitando de modo estranho o mar. Seu corpo ainda era um choque para mim. Eu não sabia se devia admira-lo ou temê-lo.
Tentei imaginar no que pensava, mas não consegui. Então me lembrei da última coisa que ele tinha dito. Alguém quase morreu ali, naquela encosta, pulando de um penhasco. Talvez fosse alguém que ele conhecia.

- Alguém quase morreu pulando dali. – Encarei com respeito a pedra sendo atacada pelas ondas.

- Não exatamente dali. Essa não é uma das partes mais altas da encosta.

Fiquei assustada. Se aquilo não era alto... Não sei o que seria. Mesmo assim, Jake tinha mordido a isca da conversa. Ele obviamente conhecia a tal pessoa que quase morreu.

- Sério? Então da onde pulou?

Seus olhos se espremeram como se vissem através da pedra por mais centenas de quilômetros, até realmente parar sobre o local.

- Ela pulou bem longe daqui. – Sua voz estava firme e séria de um modo triste.

-Então, é ela. – Olhei-o intuitivamente com o canto do olho.

Ele riu, mas sem muito ânimo. Depois começou.

- É. Você quer mesmo saber essa história? - Apenas sustentei seu olhar tempo o bastante para que ele sentasse e se rendesse.
Numa pedra um pouco mais alta que a minha, Jake fitou o mar por um instante, buscando as palavras. Ele juntou alguns seixos na mão e ficou girando-os entre os dedos. Sem aviso se virou para mim e começou.

- Nem todo mundo deveria pular de tão alto. Eu e... os garotos pulamos do topo, mas a maioria pula de lugares mais baixos. Eu falei sobre isso para ela. Embora fosse sem sentido, porque ela não era do tipo de gente que gostaria de fazer esse tipo de coisas. Na verdade achei completamente fora do normal Bella querer andar de moto... – Ele parou, notando que tinha falado de mais. Fiquei quieta. Se eu falasse alguma coisa, ele poderia não falar mais. Por sorte ele continuou. – Um dia ela foi sozinha e pulou do penhasco. Ninguém deve pular sozinho! Já é muito perigoso em grupo... Pular é fácil, mas quando atinge o mar, as ondas são violentas. Ela quase se afogou. Se eu... Se não estivessem por perto para salvá-la, seria muito tarde.

Os seixos caíram um por um de sua mão. O som das ondas se tornou o único som presente.

- Mas ela ficou bem, certo?

-Sim.

-Bella... Não acho que tenha ouvido esse nome ainda. Ela estuda no nosso colégio? - Engoli em seco. Esperava não estar indo longe demais.

Ele abanou a cabeça. Silêncio. Já tinha conseguido coisas demais daquela dolorosa conversa, não esperava mais do que isso. Calei sem consentir, mas satisfeita. Pelo menos eu achei que a conversa tivesse acabado.

-Ela estuda em Forks. – Jake murmurou tão baixo que imaginei ser apenas o som do vento e das ondas.

Billy e Antoni atravessavam as pedras em nossa direção. Quando me virei deparei-me com uma poça d’água atrás da rocha em que me sentava. As cores de algas e pequenos peixes e crustáceos me surpreendeu. No meio de todo aquele cinza sem graça havia mais cor do que imaginava. Aquela piscina natural era exatamente como minha primeira visão de Jake e Billy, no inicio pareciam algo bruto e sem graça, mas eram bem diferentes disso. Embora ainda não confiasse em nenhum dos dois...

7. Revanche

A semana seguinte só me deixou mais entediada. Judite e Helen deviam não ter muito o quê fazer, porque bastava olhar para trás e lá estavam elas, me seguindo como sombras. Em certos momentos até me comovia com a insistência de seu apoio, mas isso passava logo.

Atualmente meu único meio de manter um pouco de sanidade era carregar os fones de ouvido por todo o colégio. Não estava mais insensível aos murmúrios dos corredores. A sensação era estranha, todos pareciam estar escondendo algo, disfarçando suas atitudes com mudez e gestos de ansiedade, como enrolar o cabelo nas pontas dos dedos ou balançar a perna, mas eu ainda ouvia os cochichos as minhas costas. E, ao invés de minha primeira impressão, não era como o som irritante embora aturável de abelhas zumbindo, lembrava mais uma catedral cheia de fieis rezando a meia voz. Eram palavras inteligíveis na maioria, com uma ou outra se destacando em meio às frases e todas sem dono. Nunca sabia quem estava falando. Os fones encobriam o som, só que quando eram retirados faziam tudo voltar parecendo dez vezes mais alto.

As únicas pessoas identificáveis no mar de vozes eram Alana e Serena. Isso não era reconfortante. Nada era. No refeitório deixava meu olhar vagar pelas mesas, surda a tudo, com os fones pendurados nas orelhas. E não importava o quanto vagassem, meus olhos acabavam parando na mesa de Sam. Ou será que agora deveria rebatizá-la de mesa do Jake? Só sei que no final me centrava nele. Eu o encarava sem piedade, bom pelo menos até ele perceber e eu ter de desviar minha atenção para outro lugar. Fiquei envergonhada em pensar quão descarada estava sendo. Mas era difícil não olhar para lá. Todos naquela mesa pareciam outdoors iluminados para mim. Não tinha dado atenção a isso antes, embora soubesse que nenhum deles tinha começado a ser bonito naquela semana. Eu só os olhava com desconfiança e raiva antes, por causa de minha adesão ao movimento de Quil anti-Sam. Embora já não pudesse acreditar que foi por isso mesmo que tudo começou. Agora que parei de deslocar minha raiva para eles, notei que tudo a minha volta me irritava imensamente e só então os murmúrios se tornaram um problema. E Quil nem estava ali.

Esse era outro mistério. Não apareceu nenhum dia. Na quinta comecei a me desesperar. Passava boa parte da aula me distraindo com perguntas sem resposta: Onde está Quil? Ele está doente? Será que ele se mudou? O que ele acharia de eu ter falado com seu ex melhor amigo, Jake? O que Jake pensa de mim? Será que ele pensa o mesmo que todo o resto? Como faço pra pararem com os boatos?!

As perguntas ecoavam em minha cabeça, e esse som nem os fones abafavam. A revolta aumentava e sentia que eu era uma panela de pressão preste a explodir. Na sexta eu finalmente explodi.

Acostumei-me a sair um pouco depois dos demais alunos que debandavam com o termino das aulas. Eu não tinha motivo para pressa, teria de esperar tio Antoni de qualquer forma. Antes de sair do colégio, fui até meu armário buscar alguns livros e achei uma folha de papel amarela colada na porta. O corredor já estava praticamente vazio. Olhei sem entender o pedaço amarelo de papel. Arranquei-o da porta e li primeiro devagar. As letras não pareciam fazer sentido. Depois li rápido e aquilo foi a gota d’água.

O papel era um folheto de grupos de apoio: Reabilitação para dependentes químicos. Damos apoio para você largar seu vicio e temos amplos programas de reinserção na comunidade. Reuniões toda a semana as quartas e sábados.

Tirei meus livros de dentro do armário e bati a porta. Já ouvia coisas do tipo, só que impressas ali, essas letras me esfaqueavam. Um dos fones saltou da minha orelha com a batida da porta. Um riso ecoava no corredor. Estreitei os olhos para a folha amarrotada em minha mão. Será que até as letras estavam caçoando de mim? Não havia mais ninguém naquele corredor...

Então eu vi. Alana e Serena abafando os risinhos entre as mãos, estavam escondidas num canto junto à escada. As lágrimas já estavam enchendo meus olhos. Respirei fundo e as engoli. Tentei ser o mais calma possível, para não sair correndo até as duas e espancá-las.

-Alana. – minha voz saia num tom amistoso bastante forçado. A garota loira olhou ao redor e depois parou com cara de surpresa apontando para si mesma. – É, você mesma querida...

Serena deu um passo atrás aproveitando que eu não falava com ela. Alana se ajeitou e esperou solicita com um meio sorriso irritante.

-Acho que esqueceu isso. – levantei a folha para o seu campo de visão.

Ela encobriu a boca escancarada com uma das mãos. Com um falso espanto balançou a cabeça. Depois disse com horror:

- O que é isso, eu não sou... Deus me livre, drogada. Nunca, como pode pensar isso de mim. – E seu sorriso se tornou venenoso. – Mas isso não estava no seu armário?

- Acho que você pode ter se enganado de lugar... Sabe, a fama de loiras não é das melhores. Principalmente as oxigenadas.

Alana colocou a mão sobre a cabeça. Algumas das raízes estavam aparecendo com um tom mais escuro. Serena olhou para mim. Suas sardas se juntando nas bochechas enquanto ela abria a boca.

-Como você... – a frase ficou no ar.

O rosto de Alana ficou deformado por um segundo e logo ela retrucou radiante.

- Pelo menos eu posso pagar pela tinta sem ter que ficar girando bolsinha nas esquinas como uma...

Ela não pode terminar o que ia dizer. Empurrada, ela se chocou contra a amiga e caiu sobre os primeiros degraus da escada. Joguei os livros no chão e cai em cima dela. Serena sumiu. Fugiu, com certeza. Alana tentava me desgrudar dela. Minhas unhas se fincaram em seus braços. Ela também tentava me arranhar, mas minhas mangas não deixavam. Ergui meu braço com a mão fechada pronta para um forte soco. Ela então puxou meus cabelos para impedir meu punho de atingir seu rosto. Seu rosto exibia um ânimo assustador. Senti alguns fios serem arrancados. Uma joelhada em seu estômago e ela largou. Levantei o punho com a mira preparada. Ia acertar seu nariz. Ela me olhou com pânico nos olhos. Minha mão desceu e...

-Professor ela vai bater nela!

Serena estava correndo com o professor de educação física. Eu nem o conhecia, só o vi quando entreguei meu atestado. Minha mão parou a poucos centímetros do nariz arrebitado de minha rival. Seu sorriso de triunfo brilhou por um instante.

- O que é isso! - o brado do professor cortou o ar.

Levantei e afastei-me da briga. Ele era mais alto que eu, embora menor que Jake ou Quil. Era forte, mas de uma forma estranha, uma barriga protuberante se formava sobre seu abrigo cinza da Nike. Ele tinha cabelos ralos e pretos, grisalhos nas têmporas. Seus olhos eram miúdos e um pouco puxados, só que incrivelmente bravos. O tom marrom escuro parecia ficar avermelhado.

-O que está acontecendo, responda!

- Ela colocou um folheto... – Olhei em volta, eu não estava com folheto nenhum e ele também não estava na porta do armário ou no chão.

Serena sorriu e ergueu uma folha amarela amassada de dentro da bolsa. Ela estava atrás do professor e eu não tinha como argumentar mais nada. Na escada Alana começou a se levantar em meio a gemidos falsos. O professor me encarava sem ceder. Respirei fundo e me recobri do meu sarcasmo.

- Eu estava quase batendo nela, antes de ser interrompida. – dei de ombros.

- Acha que a sinceridade vai aliviar o seu lado.

-Não sei. Adiantaria alguma coisa eu tentar me justificar sem provas?

Ele manteve a postura séria, mas sentia que estava ficando mais maleável.

- Serena, ajude sua amiga a ir até a enfermaria. Eu vou levar essa garota até a diretoria.

-A gente não devia ir junto? - Alana falou depressa se levantando rápido demais, esquecendo-se de gemer de mentira.

- Não, do jeito que está machucada... - ele ergueu as sobrancelhas. - É melhor antes ir até a enfermeira, depois vá até a diretoria também.

Serena deu apoio para Alana e começou a levá-la para um lado do corredor. O professor andou para o outro lado. Agarrei meus livros do chão. Alana deu uma última olhada para trás com raiva. Corri para acompanhar o professor.

- Acho impressionante que alguém com o joelho machucado possa ter se saído bem em uma luta. – ele murmurou durante o caminho.

Apenas desviei o olhar para o chão. A diretoria ficava junto à secretaria, numa saleta ao lado. Nunca estive ali dentro, mas a plaquinha metálica “diretoria” diz tudo. Preparava-me mentalmente para o confronto com um diretor desconhecido. Eu tive sorte com o professor de educação física, só que nem sempre o mesmo método funciona com outras pessoas.

- Bom, esteja pronta semana que vem para a aula no ginásio. Não tenho piedade de pessoas mentirosas e preguiçosas. – paramos na frente da porta da diretoria. - É só isso, pode ir.

Fiquei sem entender nada. Ele não apontava a diretoria, mas o estacionamento e a saída do colégio.

- Eu não devia falar com o diretor?

Ele riu. Parecia um trovão distante. - O diretor não está. Vou lhe dar como detenção: participar das minhas aulas durante este mês ao menos. Se tiver percebido bem, não teremos problemas com nenhum joelho. Depois disso pode arranjar outro atestado...

Pisquei e não sai do lugar. Depois assenti e caminhei para o estacionamento sem entender nada. O castigo seria assistir as aulas de ginástica? Isso era ridículo. Não iria reclamar, mas era ultrajante.

Esperei por meu tio, sentada no meio fio, atrás de seu carro. Quando ele chegou não comentou nada, apenas se desculpou pela demora. O professor não devia ter comentado nada nem com os seus colegas de trabalho, e duvido que comentasse com o diretor mais tarde. Alana também não gostaria de contar a derrota. Tudo voltaria a ser o que era antes do sinal tocar para o final da aula daquela sexta. Segunda eu encontraria o mesmo burburinho de sempre, a menos que eu fizesse alguma coisa...

***

Segunda eu já tinha minha idéia formada. Precisei fazer uma pequena excursão não supervisionada no sábado para conseguir algumas coisas e talvez até para ganhar um pouco de coragem. Andar sozinha pela cidade desconhecida de Port Angeles me deu um novo ânimo. Quando voltei com o carro “seqüestrado” de Antoni, ele não ligou. Isso me acertou como um soco no estômago. Todos estavam me tratando com aquele diferencial bondoso. Eu queria as conseqüências de meus atos. Não queria apenas que passassem a mão sobre a minha cabeça quando fazia besteira, como as mães de coração mole fazem. Pelo menos em L.A. não tinha esse tratamento especial. Quando as coisas ficavam feias mesmo, acabava na prisão e ponto. Eu era como todo mundo... Sem privilégios.

Bom, mas agora iria conseguir o que queria. As rezas do corredor iam parar de um jeito ou de outro. Ao invés de ir para a aula fiquei rondado a escola até não agüentar mais de ansiedade. E fui até meu futuro palco. Diante das portas do refeitório, parei. Pareciam bem mais aterrorizantes do que imaginei. Vacilei por um segundo. Depois de ter calculado o que seria o melhor a se fazer... Já não tinha tanta certeza.

Ajeitei a jaqueta sobre meus ombros e tentei tornar meu vestido um pouco mais comprido puxando para baixo em direção aos meus joelhos. Estava gelada. Segurei a bolsa e respirei fundo. Atravessei as portas do refeitório.

Meia hora depois os sinos tocaram e a multidão confluiu para a comida, bando de mortos de fome.

Esperei paciente que todos estivessem em seus costumeiros lugares e só então entrei novamente. As conversas estridentes rapidamente viraram murmurinhos. Senti os olhares me fuzilarem enquanto caminhava com o máximo de determinação que consegui juntar. Eu não estava nada dentro do meu visual normal. Usava saltos enormes, um vestido curto e sem alças vermelho e uma jaqueta preta. Caminhava em direção as mesas e não ao balcão.

- Olá, meninas. – sorri teatralmente indo para a mesa de uma Alana confusa. Parei de frente para a mesa. – Posso me sentar.

Todos se mexeram desconfortáveis nas cadeiras. A única vazia foi encoberta pela bolsa de Serena. Olhei-a com desdém.

- Ah, não tem nenhuma cadeira sobrando? Sem problemas.

Empurrei as bandejas da mesa e me sentei ali. – Sabe é até mais agradável, olhar você no seu devido lugar. Um degrau abaixo, não é?

-Você ficou louca? - Alana se levantou, arrastando a cadeira. O som ecoou pelo silencioso refeitório.

- Não fiquei não. Esqueceu? Eu sou drogada, não tenho plena consciência do que faço...

Alana apertou os lábios com força. – Na verdade eu podia até cometer algum crime e alegar que não estava em mim, que estava sobre efeito de alucinógeneos e não me lembro de nada. É uma coisa bastante estranha... Eu lhe recomendaria cuidado. Até mesmo cigarros não lhe fariam muito bem.

Ela arregalou os olhos. Eu sabia que ela fumava escondida. Tinha visto no final da aula enquanto esperava Antoni no estacionamento. Ela olhou pra todo lado antes de ter certeza de não ter ninguém olhando, depois abriu a bolsa, tirou um maço e acendeu um cigarro deixando a fumaça esvoaçar ao seu redor. Agora, seus olhos repreendiam Serena, que balançava a cabeça em desespero, negando ter revelado o segredo.

- Calma, Alana. Ela não contou nada... Não para mim pelo menos. - Os burburinhos voltaram.

- Você não sabe com quem está mexendo, garota. Vai se arrepender... Eu vou acabar...

-Comigo? - Coloquei a mão sobre a testa fingindo desfalecer. Depois voltei à minha postura normal. – Sei que vai... Mas, isso arremete a alguns probleminhas.

Levantei da mesa e tirei uma algema de dentro da bolsa. Ela franziu a testa perante o metal brilhante. Levantei as algemas e as sacudi no alto para que tilintassem.

- Não se preocupe, não vou te prender. Deixaram comigo de lembrancinha, depois que sai de lá, sabe. – Dei de ombros. Alguns riram. O povo já estava entendendo o que estava acontecendo. Serena e Alana ainda não.

- E o que eu tenho a ver com isso? - ela cuspiu as palavras se erguendo acima de mim. O que geralmente não precisava ser feito, porque ela já era mais alta. Agradeci meus saltos naquele momento.

-Tudo. Sabe, se me matar nem tanto... Mas, posso aliviar o seu lado quando você precisar. Conheço muita gente lá de dentro. Não custaria nada.

- Eu não preciso da sua ajuda, sua ladrazinha suja.

Vaias soaram pela sala. Eu sorri animada. Levantei os braços em rendição.

-Só queria seu bem. Não devia recusar assim... Sabe o pessoal do tráfico de armas não ia gostar... E uma coisa que não se quer é que eles não gostem de você.

- Você está mentindo!

-Estou? Mas eu tenho todas as tatuagens de gangue deles... Sou do círculo mais interno de confiança. Você mesma viu, não viu?

Os olhos estavam todos focados em Alana e ela já estava percebendo. – Eu não... – Ela parou sem saber o que dizer. – Não sei bem o que vi.

-Sério? Parecia que tinha certeza... Era um dragão vermelho, e umas letras árabes, uns brasões... Não era isso que você disse? - As pessoas balançavam a cabeça e murmuravam sim.

Ela ficou muda. A cabeça abaixada, os olhos me fitando de baixo dos cabelos loiros que caiam por sua testa.

- Era no ombro o dragão, não era... -Abaixei os ombros da minha jaqueta. – Mostra pra mim!

Ela olhou minha pele lisa e sem marcas de tinta ou algo que lembrasse um dragão. A multidão ria.

- Ela escondeu! - gritou de repente. Apontava para minhas costas.

- Ouviram... Eu escondi! Onde? No fundo do quintal com minha plantação de ervas?

Mais risos. Alana estava com olhar furioso e suplicante ao mesmo tempo. Já estava na hora de parar. Eles não acreditavam mais no que ela dizia e era esse o objetivo. Coloquei a jaqueta de volta sobre os ombros. Mudei para um jeito mais amigável.

-Percebeu, Alana? Eu não quero mais continuar com esse joguinho de intrigas e mentiras. Tenho certeza que você é bem mais do que isso! – Coloquei a mão sobre seu ombro. Ela me olhou ferida e humilhada, mas não furiosa. Mesmo assim, podia ver-se como ela era bonita, feito uma boneca ou atriz. – Desculpa...

Estendi a mão entre nós, ainda incerta. Um longo momento se passou. Ela tinha algum conflito interno bem grande naquele momento. O público a acompanhou com os olhos. Ela ergueu os ombros e estendeu a mão para apertar a minha. Selena se levantou e bateu palmas. Outros alunos a copiaram e achei aquilo meio excessivo, mas tinha funcionado...

Ela sorriu em meio ao som das palmas. Sorri de volta.

- Só tente cuidar melhor do seu nariz... – Falei entre as palmas, mais ninguém ouviu além dela.

Ela entendeu. Eu quase tinha quebrado o seu nariz na sexta.

- Quer se sentar com a gente? - Ela apontou a mesa, sorridente.

Balancei a cabeça. Sequer estava com fome. Ela assentiu. Helen e Judite estavam logo atrás de mim. Elas sorriam de forma amarela e me parabenizavam. Não sei por que, mas não acreditei em uma palavra do que diziam. Quando apontaram para que me sentasse com elas, balancei a cabeça da mesma forma e saí sem maiores explicações do refeitório que se acalmava.

Logo após a porta, percebi uma atmosfera diferente. Algo estranho, como a mudança de pressão após a aterrissagem de um vôo muito longo. Ouvi-o antes de ver.

- Meus parabéns. – Um sorriso muito branco aparecia nas sombras. Caminhei em sua direção e vi que era Jake.

- Obrigada, obrigada. – Fiz uma grande reverência, algo parecido a um agradecimento de ator. Ele revirou os olhos.

- Acabou com todas as mentiras, acho que não vai ter mais com o que se ofender...

- Sabe, já estou quase sentindo saudade disso... – Olhei para seu rosto cínico por alguns instantes. - Não, mesmo! - Admiti satisfeita.

Ele sorriu.

- Foi legal não ter batido, nem humilhado de mais a Alana...

Não ter batido? Ok, quase bater é bem diferente de bater. Ou não? Talvez uma joelhada conte... Melhor deixar que ele acredite que não bati.

-É...

Seu rosto ficou me encarando. Não consegui identificar o que ele queria com aquilo. Eu estava sem muita reação pelo ocorrido no refeitório e agora ainda ser apanhada de surpresa por aqueles olhos escuros e assustadores... Coisa demais para alguns minutos!

A falta de assunto e seu olhar me deixaram desconfortável. Se estivesse com um relógio iria olhar para ele e falar “olha só as horas... tenho que ir!”. Ao invés disso usei o frio como desculpa. Ele deu de ombros, deu tchau e entrou no refeitório. Depois daquele dia, decidi me dar folga da escola e fui para a saída mais próxima.

Em casa, peguei os fones de ouvido e guardei bem fundo no meu armário, não iam mais ser tão necessários.



N/B: Vocês mandaram bem! Foi show! Nem eu faria melhor! Mas bem que a Alana merecia um soco no nariz! Adorei meu teacher de Ed. Física! Se todos fossem assim…a humanindade juvenil estava salva do fim do mundo! Aushauhsuahs. Dramatizei aqui, hein? Aushauhuahs

E que foi isso do Jake vos vir parabenizar? OMG! Eu quase tive uma síncope só de olhar aquele homem MA-RA-VI-LHO-SO!

OMG! O Quil vai virar lobo e vocês vão ficar largadas às traças de novo. Ele era o vosso único amigo de verdade naquela escola! TENSO!

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Kisses da Baby


8. Eu Avisei

As pessoas pararam de me atormentar da forma que faziam antes. Embora isso não signifique que não me atormentassem de uma forma completamente diferente. Não que eu pudesse reclamar, elas me tratavam bem, mas elas pareciam estar muito focadas em mim, à espera de alguma coisa. Não desejava por apenas um instante que essa situação se prolongasse. Deixei que continuassem com suas expectativas sem dar respostas as mesmas.

Com o espaço livre na mente notei que estava sendo muito pouco eficiente na investigação sobre os trogloditas da mesa de Sam, os boatos me ocupavam a cabeça. Agora estava livre o suficiente para seguir de uma forma mais agressiva.
Pus as engrenagens do meu cérebro para funcionar. As opções eram muitas. Podia fazer outro escândalo no meio do refeitório... Descartei logo a idéia. Eu queria descobrir algo para desmoralizar Sam e acabar com sua gangue e ao mesmo tempo não queria que Jake me odiasse. Tudo isso parecia meio incompatível! Eu queria brigar com eles para estar perto deles, ou melhor, dele. No meu subconsciente já tinha pintado uma história maluca na qual poderia acabar com a influência de Sam, colocar Jake e o outro - que esqueci o nome - de volta na lista de amigos de Quil e conseqüentemente na minha lista de convivência.

Eu não tinha idéia de por onde começar. Então me lembrei do passeio até a praia de La Push. Jake falou algo sobre uma garota de Forks... Bella. Pelo jeito que ele falou, com certeza a conhecia. Não era algo que me agradasse pensar no quê esse “conhecia” incitava. Mesmo assim ele devia ter ido a Forks algumas vezes e isso já era um começo.
Estacionei a picape prata na rua estreita em frente à lanchonete. Dessa vez eu tinha pedido permissão para meu tio antes de sumir atrás do volante. Ele até gostou da idéia de eu estar dando umas voltas em Forks, praticamente me empurrou para dentro do carro.

Eu já havia rodado um pouco. Passei pelo colégio em que Bella estudava. As aulas já haviam acabado naquela terça feira e era pedir muito que ela ainda estivesse lá para ser encontrada. O colégio não pode passar as fichas de seus alunos, a velha baboseira de ética e blá blá blá. Mesmo assim podiam me garantir que ela estudava ali e até deixaram escapar que seu pai trabalhava na polícia na cidade. O nome dele era Charlie e se eu fosse apenas um pouco mais cara-de-pau a secretaria me passaria até o endereço. Não insisti com ela, a casa de um policial era o último lugar aonde gostaria de ir.

Vaguei pelo colégio e topei com um número razoável de alunos zanzando por ali que podiam me passar alguma informação. Obviamente não deveriam deixar alguém de fora andar livremente pelo colégio, a segurança não era o forte do lugar. Poucas pessoas sabiam algo sobre Jake, mas arranquei de uma fonte que ele já havia aparecido por ali raras vezes. A descrição não deixava enganar: alto, moreno, forte, com cabelos pretos curtos e um pouco espetados e outras vezes bem compridos, numa moto preta.

Depois consegui saber de uma loja de esportes onde supostamente Bella trabalhava e uma lanchonete que muita gente costuma frequentar. Claro que “muita gente” na escala deles ficava muito aquém a minha própria definição. O fato é, quando a pergunta era sobre Bella era muito mais fácil conseguir informações. Ela estava ali não fazia muito tempo, fazia um ano e meio, mais ou menos. Todos pareciam de olho naquela garota, mas minha impressão era de estarem mais interessados no seu relacionamento. Sim, ela tinha um namorado estilo top da região. Era estranho ver como as pessoas que falavam sobre Bella sempre metiam o nome Edward no meio. Parecia que eles tinham nascido grudados. A descrição dele então era enigmática.
Esse namorado apesar de ser um figurão, não parecia ter amigos. Ninguém conhecia de verdade Edward Cullen. Ele e a família tinham se mudado para a cidade fazia alguns anos e eles moravam afastados de todo mundo e não andavam muito pela cidade. O pai era médico, Carlisle Cullen, ele parecia um poço de bondade segundo as descrições. Os seus admiradores que ficassem com suas opiniões. Depois de um policial a última pessoa que visitaria seria um médico.

As únicas pessoas com quem Edward era visto, além de Bella, eram seus irmãos e irmãs. Uma família grande e estranha.
Na lanchonete pedi um sanduíche e um suco. Um grupinho de colegiais mais velhos, que já pareciam estar no último ano, conversava numa mesa perto da janela. Não havia muita opção de colégio ali, o que os colocava na lista de possíveis amigos de Bella. O impulso quase me jogou com um caderninho de perguntas para cima deles. Mas eu não sei bem que tipo de informação ia querer encontrar. Afinal eu estava investigando uma gangue de trogloditas ou a vida amorosa de Jake? Não faço idéia. Voltei minha atenção para minha comida e esqueci-os por um instante.

- Olá. – Um garoto loiro de sorriso amigável sentou na cadeira ao meu lado depois de eu assentir que podia se sentar. – Meu nome é Mike.

Não consegui deixar de pensar em como ele se parecia um cachorrinho de estimação. O mesmo sorriso amigão que um labrador teria surgia em seus lábios.

- . – Me apresentei simplesmente antes de dar um gole no suco.

- Eu posso estar enganado, mas acho que nunca te vi aqui...

“Não viu mesmo!”. Sorri e respondi. – Não, eu me mudei faz pouco tempo. Estudo no colégio da reserva.

Esperei a reação. Como a maioria ele murmurou um “ahm” preconceituoso e se remexeu na cadeira. O encarei, mostrando que sabia no que ele pensava.

- Não é por nada não, mas não tem nenhuma epidemia afetando o pessoal de lá ou algo do tipo. Embora, como não sou realmente de lá, não possa dizer o mesmo sobre mim...

Ele deu uma risadinha nervosa e se acalmou um pouco.

– Vocês não têm uma impressão muito boa do povo de lá... Eu só ainda não entendi o motivo.

- Nada em particular. Acho que é uma rivalidade que sempre existiu. Algo como a inimizade entre Inglaterra e França.

-Ahm. Eles causam um pouco de problema quando vem pra cá?

-Não... – mas ele parou um pouco para pensar nas próximas palavras. – Embora aquele Jake seja um tipinho bem irritante.

Ele falou baixo. Eu estreitei os olhos. Mike conhecia Jake. Precisava jogar uma isca antes que a conversa fosse embora.

- Jacob Black? Acho que você tem razão, ele é um tanto estranho... Mas não sei bem do que estou falando, foi só uma primeira impressão, não conheço ninguém por aqui...

Seus olhos azuis me analisaram de soslaio. Depois ele puxou a cadeira mais para junto e ficou com o corpo curvado por sobre a mesa. Olhei-o incerta.

- Se quer saber ele é meio violento. Já fui uma vez no cinema... E ele também. Não gostei da idéia desse cara ir, mas se a Bella tinha convidado...

- A filha do policial? - Ele fez que sim. – Mas ela não tem namorado?

- Sim, mas as coisas estavam meio estranhas na época. A família Cullen saiu de Forks por um tempo e a Bella não se recuperou necessariamente bem disso... Parecia um zumbi sem alma. O importante é que esse Jake ficou amigo dela e foi ao cinema com a gente. Eu não estava passando muito bem e o cara explodiu e veio pra cima de mim do nada. E não sou só eu... Já ouvi que ele é bem briguento. Ele não tem o menor controle sobre si mesmo!

Fiz a maior cara de espanto que consegui. Não tinha muita confiança em tudo o que ele dizia, mas não o impedi de continuar a contar tudo o que queria. Fez uma imagem grotesca de como Jake era briguento e insano. E como ele era o oposto. Eu ouvi e acrescentei comentários que lhe agradassem. Era um garoto sem muita graça, que se esforçava ao máximo para ser divertido. Na verdade, era bem fácil de fazer amizade com ele. Ele, além disso, trabalhava na loja de esportes junto de Bella. Tentei não parecer interesseira, mas o fato era que Mike conhecia meus dois objetos de estudo e isso bastava para que fosse sua amiga.

***

Na quarta-feira, o céu amanheceu cinzento. Mudança de tempo. E tudo dizia que os dias de sol fraco iam tirar uns bons dias de férias. Se fossem minhas férias, estaria indo para LA. Suspirei e tentei juntar os pensamentos antes de ir para meu martírio diário.

No colégio, soube que a mudança não era só meteorológica. Algo estava muito diferente. Quil tinha voltado de seu sumiço misterioso. Ele estava no grupo de Sam, sentado entre eles no refeitório. Olhei desconcertada para o primeiro amigo que fiz naquele lugar. Ele estava mais forte... Os olhos mais escuros. Seu olhar se cruzou com o meu e parecia frio. Estremeci. O que diabos estava acontecendo ali?

Busquei o olhar de Jake e indiquei com a cabeça a saída do refeitório. Sai e continuei caminhando até estar junto das árvores que rodeavam a lateral do colégio. Esperei alguns minutos até a figura gigante aparecer. Seus olhos não emitiam nenhum brilho e ele não sorriu ou deu olá.
Se ele não ia seguir as formalidades, eu não iria.

- O que vocês fizeram com Quil?

Ele olhou para a floresta de um modo sombrio, depois se dirigiu para mim com o rosto firme e sério. - Nada.

Eu cruzei os braços e dei a risada mais infame que consegui apesar do medo. Meus olhos verificaram os arredores instintivamente. Ninguém à volta. Não foi uma boa idéia sair do refeitório. Contive um estremecimento.

- Você vai ter que mentir melhor do que isso para me convencer! Acha que eu realmente vou acreditar nisso... Não seja idiota, Quil odiava Sam e a ganguezinha que ele criou, por que motivo ele se juntaria a vocês?

Ele apertou os maxilares e balançou a cabeça. Seu olhar era um lembrete perfeito: Não se meta, eu estou te avisando. – Sam não fez nada.

Seu tom de voz não deixava margem para mais perguntas. Seus ombros ficaram rijos e notei que seus punhos se fecharam. Ele respirou fundo se virou e foi embora. Eu fiquei plantada sem me mexer junto às árvores. Não voltei para o refeitório. Não tinha mais fome.

As aulas chegaram ao fim. Juntei-me à debandada pouco sincronizada dos alunos. Antoni tinha permitido que eu saísse com sua picape logo após o final do dia letivo desde que mais tarde voltasse para buscá-lo. Não ia desperdiçar essa chance. Entrei no carro e aguardei um pouco. A moto de Jake começou a seguir pelo estacionamento, atrás vinha outra moto e um carro. Não identifiquei todos, mas pude ver Quil entre os ocupantes do carro.

Dei-lhes um minuto de vantagem, liguei o motor e os segui para fora do estacionamento. Mantive uma distância segura do carro para não ser percebida; o que era fácil, pois muitos carros faziam o mesmo caminho. Aos poucos os outros motoristas foram minguando. Sumiam por ruas laterais. O caminho foi ficando mais familiar e num instante já sabia onde estávamos indo. Deixei que se distanciassem mais... A ponto de não vê-los a minha frente.

Segui devagar até a casa vermelha de madeira com o galpão metálico ao seu lado. O carro e as motos estavam parados no terreno em frente da casa. Estacionei a picape um pouco mais atrás de qualquer jeito. Pensei em impedir a passagem do carro para que não pudesse sair antes de mim, mas não havia como, o espaço era muito aberto. Desliguei o motor e apurei os ouvidos. Não parecia haver ninguém dentro da casa. Não havia movimento, som ou luzes acesas. Um trovão soou distante. Encolhi meu corpo contra o acento.

Começou a chover. Tentei tomar coragem para sair do carro. Peguei o celular e a chave. Bati a porta a minhas costas e segui rumo à casa de Jacob. Subi na varanda e, mesmo que tudo indicasse que não havia ninguém em casa, espiei para dentro de cada janela. Nada.
Fui até a ponta da varanda e espiei o galpão. Ele estava escuro e fechado. No caminho enlameado entre a casa e o galpão havia pegadas. Respirei fundo e desci da varanda para seguir o rastro. A chuva caia fina ainda. O que não importava. Meu passo lento e hesitante já me deixava sob a chuva tempo o bastante para começar a ficar encharcada.
A grama voltava a aparecer no quintal aos fundos da casa. As pegadas não eram mais vistas. Nenhum sinal de vida nas redondezas. Era um campo aberto sem nenhum provável esconderijo. À minha frente, a parede homogénea de vegetação da floresta me encarava. Segui certa de estarem em algum lugar na mata. A chuva se intensificou. O casaco moletom já era ultrapassado pela umidade e a blusa por baixo já estava grudando em minha pele. O capuz estava retendo mais água do que a repelindo. Corri os últimos metros até as árvores. Sobre as copas verdes a chuva pareceu imediatamente soar diferente. Era como estar em uma catedral. As folhas no alto impediam a força total da chuva.

Abaixei o capuz para ter uma visão mais ampla. Havia arbustos e árvores demais para serem contadas e todas eram tão iguais que girando nos calcanhares não saberia mais de onde viera. As gotas pareciam ecoar mais alto, mas outros sons também se ouviam. A floresta tinha vida própria. Ao meu redor pequenos piados e vultos começaram a se mesclar com a cor verde. Parecia que as próprias árvores piavam e se moviam. Mesmo morrendo de medo, não pude deixar de pensar que aquilo era lindíssimo. Caminhei sem pressa, com cuidado, para não mudar de direção enquanto evitava raízes e galhos secos no chão.
Palavras. Eu ouvi vozes mais para a direita e segui em sua direção. Tentei ficar sempre encoberta pelos troncos, deslizando entre um e outro.

-... Eu não sei como.

-Lógico que sabe como. – A voz era firme embora não houvesse raiva.

- Não sei. Eu não controlo! Eu só... Sinto tanta raiva. – Essa era a voz de Quil e estava mais próxima.

Agachei-me entre alguns arbustos. Movi devagar os ramos e consegui ver uma pequena fresta entre a ramagem.

- Não é assim que funciona. Se você só mudar com a raiva, então já era... Vai ser ela quem vai te controlar! - Sam falava enquanto andava em círculos em torno de Quil. Sam estava calmo e agia com elegância e autoridade. Enquanto Quil ofegava como um maratonista após uma prova.
Um pouco distanciados de Sam e Quil estavam os demais. Eles estavam todos sem camisa, exceto Leah. Notei quase instantaneamente as tatuagens escuras em suas omoplatas, todos tinham uma, menos Quil. Paul se adiantou para Quil.

- Acho que ele não serve para isso... Olha só, deplorável. – Paul o observava com reprovação e escárnio.

Quil começou a tremer de raiva. Embry empurrou Paul que cambaleou para frente.

- Ele só não é igual a você, que pega fogo logo com a menor fagulha. Acho que você é só um grande cabeça quente. – Embry mostrava os dentes para Paul.

O rosto de Paul era uma mascara de fúria. Quil tremia mais violentamente ainda agora. Sua forma ficava um pouco embaçada como se suas moléculas estivessem saindo do lugar. Então Paul virou para Embry, deu alguns passos apressados em sua direção e...

E tudo ocorreu em câmera lenta. Paul pulou e pairou no ar por um segundo e quando caiu no chão novamente não tinha mais pés, e sim patas. Ele explodiu numa grande bola de pêlos cinza escura furiosa. Embry deu um passo para trás e mostrou os dentes, no segundo seguinte era um lobo cinza claro gigantesco de dentes afiados. Paul e Embry colidiram com força. Quil gritou alguma coisa e correu para os dois. Eu me levantei nesse instante. Era impossível ele não ser morto por aqueles dois monstros.

Foi impulsivo. Eu me levantei e gritei em pânico. Eles iam matar Quil!
Já estava chocada o bastante, e não imaginei poder ficar ainda mais. Bom, eu estava errada. Em seguida vi Quil explodir em outra bola de pêlos marrom. Pensei que eu fosse cair para trás e ficar ali paralisada. O Quil era um lobo agora... Eu não sabia o que pensar. Todos eles eram lobos. Isso é impossível!
Meu temor por Quil logo sumiu, encoberto pelo medo de ver todos os olhares escuros e profundos se virarem para mim.
Paul em forma de lobo se lançou em minha direção. Forcei meus músculos a se moverem para sair dali, mas minhas pernas não se moveram. Ele mostrou os dentes afiados como navalhas. Eu estava morta! Tinha passado um tempo da minha vida temendo morrer de tudo quanto é jeito e agora isso ocorreria da forma mais improvável. O slogan de uma empresa de segurança irritantemente entrou em minha cabeça “Os maiores riscos são aqueles em que você ainda nem pensou”.

O lobo pulou no ar e ia cair em cima de mim em segundos. Eu ainda não estava a fim de desistir. Não ia morrer com um maldito slogan barato sendo meu último pensamento. Onde estava a dignidade nisso? Como minhas pernas ainda não respondiam, joguei meu corpo para o chão. O mergulho foi bruscamente doloroso. A lama empapou o lado esquerdo do meu corpo, que bateu no solo. Soltei o ar com o impacto e olhei para cima no momento exato em que outro lobo se chocou contra o corpo do primeiro.

Os dois caíram sobre um tronco que estalou. Estavam mais longe de mim. Uma briga se iniciou. Algum deles estava impedindo Paul de me matar! Não sabia bem quem estava vencendo, não ficaria ali para descobrir. Minhas pernas retomaram o movimento e obedientes se lançaram numa corrida para longe dali. Ouvi o ganido agudo de um dos lobos e virei para trás sem ver mais a briga, só via arvores para todo o lado.

“Por favor, não seja Quil...”. Lembrei dos três lobos enormes e imaginei a luta medonha que deveriam estar tendo. De repente parei de correr, meu corpo se chocando com algo no caminho. Uma árvore? Não. Mãos fortes apertaram meus pulsos. Reconheci no mesmo instante o rosto à minha frente. Jake tinha um olhar sinistro e não mostrava o menor traço de um sorriso nos lábios. Puxei meu corpo para trás tentando me soltar de suas mãos.

- Aonde você vai? - Seus dedos forçaram mais o aperto em torno de meus pulsos.

- Solta! Sai da minha frente, Jake!

Ele não se moveu um centímetro. Minhas mãos começaram a formigar, a força do aperto estava impedindo o sangue de circular. Meus pulsos estavam fervendo e doíam como se fossem se quebrar a qualquer momento.

- Para onde você vai, ?- Seus olhos se tornaram fendas de tão apertados que ficaram.

Confusa, tomei conta de que não sabia mais onde estava. De onde eu tinha vindo? A paisagem era igual em todas as direções e a chuva criava uma cortina ao redor. Puxei os braços de novo sem conseguir soltá-los. Mesmo sem saber para onde, eu precisava correr para longe dali. Mas ele já havia notado minha confusão e entendeu que estava perdida.
Uma de suas mãos se soltou. Tentei freneticamente soltar a outra. Tarde demais. O mesmo braço que me soltara agora enlaçou minha cintura. Fiquei sem reação enquanto era jogada para cima de seu ombro. O braço prendeu meu corpo contra o seu e ele começou a correr.

- Me põe no chão! - Comecei a esmurrar suas costas com toda a força.

Ele não parecia sentir nada. Ele era realmente um troglodita medieval! Mas eu estou longe de ser a dama frágil medieval! Não fui uma carga fácil, me debatia tentando fugir com o mesmo empenho que uma minhoca tentando sair do anzol. Jake apenas correu agilmente sem ligar para isso.
Em pouco tempo estávamos na varanda da casa dos Black. Jake finalmente me colocou no chão. Suas mãos me prenderam imediatamente.

- Prometa não fugir!

“Eu não ia prometer merda nenhuma”. Encarei-o de volta.

- Prometer? Até parece. Não faço acordo com monst...

Uma mão grande e quente encobriu minha boca. A outra mão voltou a apertar meu pulso. Senti um impulso de gritar com a nova onda de dor e calor.

- Se você não gritar ou sair correndo te deixo em paz.

Eu não dei sinal de concordar ou discordar. Um longo momento se estendeu naquela situação; Meus olhos estavam ardendo de raiva, mas não piscavam. As lágrimas estavam difíceis de segurar. Ele soltou.
Escorreguei pela parede e sentei no chão de madeira. Minhas roupas pingavam formando uma lagoa ao meu redor. O mundo não fazia o menor sentido para mim agora. O que eu tinha visto exatamente? Ele virou um lobo! Jake ficou sentado na minha frente, encostado no cercado da varanda. Nós dois parecíamos lutadores de boxe cada um no seu canto do ringue arfando durante o intervalo entre os rounds. Ele mudou a expressão, parecia desconcertado, desolado.

- Eu te avisei! Por que tinha que... Ah, sabia que você seria um problema.

- Você não avisou! Se tivesse dito que todos ali viravam um lobo maior que um cavalo e que por isso eu não devia segui-los, aí sim seria um aviso! - Esfregava meus pulsos doloridos e tentei manter um tom de voz baixo e calmo.

-Você teria vindo do mesmo jeito.

- Como pode ter certeza disso, senhor Nostradamus?

- Não tente se enganar, você é exatamente o tipo de pessoa que não aceita uma placa de “proibido entrar” numa boa.

Verdade. Ele estava me analisando? Senti um desconforto agradável. Não sabia dizer se era bom ou ruim que sua atenção se voltasse para mim.

- E o que mais concluiu?

- Nada. O que você concluiu?

- Você também é um lobo. - Os olhos escuros se desprenderam dos meus e olharam a chuva ao redor. - Estou certa, não é? Vocês são todos como os guerreiros lobos que tinham um espírito de lobo para lutar e... As lendas estão certas!

Sua resposta foi o silêncio. Seus olhos voltaram a me encarar. Toda a pesquisa de Antoni rodopiava pela minha cabeça. Eu lia por distração, mas agora toda aquela maluquice enfim fazia um sentido, tinha uma projeção real neste mundo. E essa projeção me encarava com os olhos mais pretos e embriagantes que já vi. Antoni ficaria louco se soubesse! Mas algo nas histórias não fazia sentido. Eles eram lobos para proteger o povo de um tipo de demônio estranho...

- Vocês são os mocinhos da historia, então quem são os frios?

Sua expressão de espanto me surpreendeu. Ele se levantou e me olhou do alto.

-Você sabe demais! Não pode contar isso...

- Por isso precisa me silenciar? - Minha voz saiu tremula e sem expressão.

Ele franziu a testa e pareceu cogitar aquela minha idéia estúpida. Por alguns segundos amaldiçoei minha boca grande e esperei que ele não fosse realmente proteger seu segredo com unhas e dentes. O momento passou e os frisos em sua testa se soltaram. Depois ele abriu um meio sorriso e me estendeu a mão. Eu coloquei minha mão na sua sem pensar, seu braço me ergueu do chão e fiquei de pé. Minha mão ficou quente com a dele, ele a soltou e abriu a porta da casa. Nós entramos e seguimos pela sala até o corredor, ele entrou em uma das portas do corredor, só que eu não o segui mais. Empacada na frente da porta, não conseguia decidir se podia ou não confiar em uma materialização de um mito.

Ele voltou para o corredor e pareceu não me entender. – O que foi?

- Você... Não vai realmente me silenciar, certo? Eu não devia ter dado essa idéia estúpida!

Ele riu.

- Não vou te matar! Tive vontade disso há alguns minutos e Paul também, mas não vou. - Ele esperou alguns segundos para continuar, já que eu não estava acreditando. - Agora, se não acredita em mim... Pense assim, eu até podia te deixar morrer de hipotermia, mas não vou.
Ele ergueu o que trouxe de dentro do quarto. Uma camiseta, uma toalha e algo que deveria ser um short ou uma calça jeans. Olhando para trás, percebi o rastro de água e lama que deixei pelo caminho e fiquei envergonhada.

Meu corpo estava realmente gelado, e notei que meus lábios tremiam com a minha respiração falha. Era uma perfeita burra com sonhos de ser rei, ou rainha. Não estava em situação de barganhar. Agarrei as roupas de sua mão e tentei manter a pose, embora já estivesse irremediavelmente destruída.

- Segunda porta a esquerda. - Ele cantarolou.

Engoli meu orgulho e fechei a porta atrás de mim. Não esperei mais e entrei em baixo do chuveiro agradecendo a água quente que reanimava meu corpo. Uma onda de calor revigorante! Mesmo relaxada e finalmente aquecida não pude deixar de pensar: O lobo saia triunfante dessa vez...


9. Ninguém escolhe o sangue

Só a blusa de Jake já me servia de vestido. O short era grande demais para mim. Eu não era de forma alguma uma garota anã, embora perto de Jake começasse a me sentir numa terra de gigantes. Na verdade eu tinha uma estatura bem normal: 1,67m. Nem a mais alta e nem a mais baixa das garotas, e talvez sempre fosse nesse meio das estatísticas que eu ficava: Nem tão chata, nem tão legal; Nem gorda, nem magra; Nem tão feia, nem tão bonita.
Eu gostava desse meu estilo mediano, mas não gostava muito disso agora. Queria pelo menos nesse instante fugir um pouco daquela faixa dos 50%. Contemplei meu reflexo no espelhinho do banheiro, desanimada.
“Nem tão feia, nem tão bonita.”
Os olhos verdes me encararam de volta na face fina e levemente oval. Tentei arrumar os cabelos molhados com os dedos, colocando um lado para trás da orelha. Meus cabelos escorridos e molhados estavam naquele tom mais escuro de marrom que ficavam sempre que encharcavam e desciam quase até minha cintura.

Não tem muito como melhorar a situação dessas coisas, só dava para ir até a porta e sair do jeito que estava. Fiz um embrulho com minhas roupas ensopadas e girei a maçaneta.
Não havia nenhum par de olhos escuros me esperando na saída. Segui com meus pés descalços até a sala, a trilha de barro e água tinha sumido, deixei meu celular e chaves na mesinha. Gostava mais do calor do pequeno banheiro abafado, o frio agora entorpecia minhas pernas nuas. Deixei a trouxa de roupa na varanda para não molhar mais nada.

O par de olhos escuros me reencontrou quando ia entrando de volta na casa. Desviei meus olhos rapidamente, uma insegurança estúpida da minha parte.

- Deixei lá fora pra não molhar mais nada... - Por que eu estava me justificando? Retomei a força e ergui a cabeça para dizer - Obrigada.

- Sem problemas. – ele deu de ombros. E completou com descaso, erguendo duas canecas. – Chocolate quente?

Aceitei minha caneca. Ele voltou para o quarto com o propósito de achar um short ou calça que me servisse. Uma busca que tinha chance zero de sucesso. Eu bem disse que não precisava. A blusa dele já chegava ao meu joelho, o que era mais comportado do que a maioria dos meus vestidos de verdade.
Jake já tinha sumido há alguns minutos e eu fui atrás dele.

- Não precisa procurar. Sério!

Ele achou um short menor que o anterior, mas nem por isso que me servisse. Sentei na cama e aguardei entediada ele voltar à busca, até finalmente bater as gavetas e portas da cômoda e se sentar no colchão, irritado. O quarto era pequeno, menor do que esperava para alguém do tamanho de Jacob Black. Só uma cama, uma cômoda e uma mesinha de cabeceira. As paredes não tinham nada pendurado que revelasse sua personalidade e a vista da janela era quase igual a minha só que do térreo. Só uma pilha de CDs gravados com nomes de bandas de hip-hop me dizia algo sobre ele. Mas o que eu queria saber mais, além do maior segredo que ele poderia ter: que vira um lobo nas horas vagas.

- E então vai me contar ou não o que está acontecendo aqui?

Ele terminou de virar a caneca de chocolate quente para responder - Nada além do que você já viu.

- Mas por quê? - Eu não sabia bem o que perguntar. “Por que vocês são como são?”

Ele riu sem o menor humor. – Se a gente pudesse escolher pode apostar que não seria assim.

- Mas, todos vocês...

- Olha bem, não é pra ficar perguntando nada. Somos o que somos, está em nosso sangue. Ninguém escolhe o sangue que tem.

Engoli em seco, eu devia saber disso melhor do que ninguém. Não escolhi ter o sangue que tinha em minhas veias.

- Então o seu pai também tem isso.

- Não, ele nunca foi como nós. A geração dele não... precisou.

-Não precisou... Ah, fala sério. Não me trate feito uma criança que não sabe de nada. Já entendi, não havia nenhuma ameaça para a tribo e os espíritos de lobo não precisaram proteger ninguém. Também sei que vocês podem se comunicar sem ter de falar, algo como telepatia, certo? E sei que tipos de inimigos vocês têm: Os frios.

-Onde ficou sabendo isso? - Jake agora lançava um olhar preocupado para mim.

- Tenho minhas fontes, nada que mais gente possa ter acesso.

- Antoni, não é? - Um brilho de entendimento cruzou seu rosto.

Assenti. – Ele não faz idéia, mas sua pesquisa ajudou muito. Só não sei quem exatamente são esses frios, para precisarem combatê-los.

Ele trincou os dentes. Só mencionar o seu inimigo já o deixava em ponto de bala. Ele se levantou e ficou andando de um lado para o outro com os punhos a mostra.

- Os frios são exatamente o que dizem as lendas. Se você as conhece tão bem deveria ter uma idéia do que são. – Sua voz era ameaçadora - Se eles não existissem seria tudo muito melhor.

Ele voltou a se sentar com um ar de lamento que não combinava em nada com sua fúria anterior. Aquele cara tinha um sério distúrbio emocional. Mas eu não conseguia ser a barreira que me tornei há tempos quando estava perto dele. Fiquei surpresa ao notar que me deixei ser levada a até ali. Quer dizer eu estava sentada na cama dele usando a camiseta dele e falando do maior segredo de sua vida. Não sei bem como isso aconteceu, ainda mais vindo de uma das pessoas mais assustadoras que já vi na vida.

- Você não gosta muito de compartilhar isso. - Fitei a palma da minha mão tentando evitar seus olhos - Então porque me conta, porque tem falado comigo na escola... Ou mesmo, me ajudado agora. Afinal de contas eu não sou exatamente sua melhor amiga.

Senti que Jake se remexeu desconfortável no colchão.

- Ótimas perguntas... Não sei nenhuma das respostas.

Levantando a cabeça pude ver dois olhos verdes, meus olhos, me encarando no reflexo dos olhos escuros dele. Meu coração batia fora de compasso. Estava começando a ficar maluca? Ele não era alguém de quem eu deveria gostar, nem humano era. Mesmo assim a proximidade de seu corpo me deixava zonza. O silêncio que se seguiu, foi quebrado por Jake.

- É estranho, me sinto como se precisasse te ajudar. Quer dizer, você não parece precisar ou querer ajuda, mas sei que precisa... Coisa de doido, mais uma esquisitice para acrescentar aos meus sintomas.

Mordi o lábio e virei o rosto. Já tinha ouvido aquele discurso. Quero te ajudar e blá blá blá. Geralmente as pessoas mais sensitivas tinham esse tipo de comportamento comigo, mesmo completos desconhecidos costumavam ser gentis comigo fazendo a velha pergunta “Posso ajudar?”. Até quando eu queria o máximo possível me perder e não ter ajuda, eles apareciam. Lembrei da gangue de traficantes de que já tinha feito parte, ou talvez ainda fizesse, eles não foram os trogloditas rudes que esperava encontrar.

Terrenci, o indiscutível líder da gangue, podia ser o pesadelo de quase todo mundo, mas era quase meu anjo da guarda naquele submundo. Ele me protegia como se fosse sua filha, e chegou a me admitir isso.
Comecei a sentir minha garganta se fechar e a velha torrente de emoção que beirava a superfície. Eu não queria a compaixão de nenhuma daquelas pessoas. Não queria o protecionismo que Jake estava sentindo. Será que eu nunca ia poder viver uma vida normal e problemática sozinha? Será que eu sempre seria a coitadinha da história? A moribunda na torre, que na verdade nem quer ser resgatada... E ainda mais aquela última palavra que ele acabou de dizer acertou em cheio minhas linhas de defesa mais profundas.

-Você não sabe nada sobre sintomas!

Esqueci onde estava e que Jake estava ali, simplesmente desabei. Senti cada bloco da minha muralha cair, as lágrimas as empurrando como uma enchente avassaladora. Jacob ficou sem reação com aquela explosão inesperada. Aos poucos ele tomou uma atitude. Com as lágrimas era difícil ver seu rosto logo na minha frente, suas mãos seguravam meus ombros forçando que me recompusesse.

- Ah, que diabos. O que foi?

Eu sacudi a cabeça. Não ia soltar os monstros do porão. Já eram muitos meses segurando minha depressão, sem ter para quem contar, eu podia sobreviver mais tempo.

- Fala sério! O que pode ser pior do que eu, pra você ter medo. – O pequeno toque de humor funcionou.

Enxuguei as lágrimas e funguei.

- Ok. Bem melhor. Agora, não faço idéia do que aconteceu. Se quiser você fala ou não.

- Não é sua culpa. – minha voz estava chorosa. – Só estou cheia disso...

Ele se segurou para não perguntar mais nada. Eu não queria contar. Aos poucos as imagens das lembranças foram se formando, mas eu as recebia como velhas visitantes que eram sempre bem-vindas. A dor e a desesperança eram amigas cruéis, mas bastante fiéis e não te abandonam nunca.

- Eu não deveria falar isso. Mas eu odeio toda essa... Ajuda. Esse bando de gente sendo legal comigo por caridade.

- Eu não estou fazendo caridade nenhuma.

- Mas se eu contar você vai ser exatamente... - parei abruptamente sem querer completar a frase com aquele nome. Lucca ainda era uma palavra dolorosa.

- Eu prometo não ser bonzinho, legal e nem caridoso com você, nunca! - Era o tipo de promessa mais estranha do mundo.

Esperei a imagem se formar por completo na minha memória. O quarto vazio e branco. Os toques mecânicos dos aparelhos ao redor, o som de minha própria pulsação marcado por uma máquina ao meu lado. Estava mentalmente voltando ao hospital.

- OK. Não é uma história nada agradável. A razão para você achar que preciso de ajuda é a mesma de todo o resto das pessoas mais sensitivas que conheci: pena.

Respirei fundo, tomando fôlego para a viagem de volta para o passado. Ia jogar tudo de uma vez para não ter chance de desistir no meio.

- Quando eu era pequena descobriram que eu estava doente e que ia morrer. Os médicos disseram que eu tinha leucemia. Fiz toda aquela bosta de tratamento quimio-terapêuticos e não adiantou nada. Então, fui parar na fila de espera de um transplante de medula óssea por quase um ano. O transplante funcionou, mas continuei com tratamentos para estabilizar meu estado, por mais três anos. Não é algo fácil se adaptar a um transplante... Eu sobrevivi, mas isso arruinou minha vida. Não tinha mais jeito de acabar com toda aquela piedade sentimentalista de todos que sabiam. Eles fingiam serem aquelas pessoas legais na minha frente, mas... Por isso que odeio toda a ajuda que me oferecem, mesmo que as pessoas não saibam, no fundo é por piedade que me ajudam.

“Pronto. Tudo revelado!” Espreitei Jake ao meu lado. Suas sobrancelhas se ergueram com surpresa, mas logo baixaram e sua expressão ficou indecifrável. Já tinha me tocado que enquanto meu segredo é mantido é mais fácil ver quem as pessoas realmente são. Mas agora seria diferente. Havia alguém que sabia algo do meu passado naquele estado chuvoso de Washington. Ele não disse nada e parecia que eu também não tinha dito.
Desta vez ia ser eu quem teria de quebrar o silêncio. Levantei a cabeça como sempre fazia quando precisava superar meus dilemas e firmei o queixo na pose de uma rainha autoritária que está em pleno domínio da situação. Eu não era o assunto daquela conversa, Jake é quem era!

- Então você é um lobisomem... Bom, onde eu fico nessa história?

A trovoada de risos dele fez o quarto estremecer, mas não a mim.

- Você fica na sua casa e não mete mais o nariz por aqui!

- Ah, é ai que você se engana! Agora que eu sei e você não tomou nenhuma providencia quanto a isso, faço definitivamente parte dessa loucura. E vai ter que conviver com isso gostando ou não gostando!

Eu não estava realmente tão brava. Só queria dar o fora para não encarar mais Jake. Saí do quarto em passadas largas. Sua mão grande e quente segurou meu pulso quando estava atravessando a porta. Senti uma pontada parecida com de uma agulha sobre a marca roxa que meus pulsos exibiam, mas ele não estava apertando meu pulso do jeito de antes. Era apenas sua pele quente sobre a minha.

- Eu não acho que seja uma boa idéia.

Seu corpo inteiro parecia muito menos agressivo e sua voz era apenas uma brisa quente soprando sobre mim. Senti vontade de concordar e me atirar nos braços dele. Não fiz nada disso, puxei meu braço e escapuli com minha chave e celular para o carro. Eu não estava querendo aceitar o protecionismo que ele oferecia; podia ser só sua reação ao que eu disse. Tudo que vem fácil vai fácil. E não é com meia dúzia de lágrimas e um olhar gentil que vou aceitar correr o risco de antes só para ter uma reprise de Lucca. As pessoas não podem fingir gostar de mim para sempre! Agora ele já sabe e tenho que ser mais forte que meus impulsos, se não o futuro me trará apenas dor. Se Jake ainda não acredita que não preciso de sua ajuda vou convencê-lo!
Joguei as roupas molhadas no banco de trás e dirigi para casa. Meus pulsos doíam e o perfume da blusa de Jake me deixava zonza. Eu precisava ser bem mais forte.



10. Termo de responsabilidade

O apito soou. Dez pares de sapatos de borracha chiaram contra o piso envernizado da quadra. A bola batia ritmada. Tum Tum, Tum Tum... Meu coração se sincronizou com ela. O som estava ficando mais perto. Gritos de comando voaram por cima da quadra atravessando as linhas inimigas. A bola veio para cima em arco perfeito; começou a descer e havia a certeza de ir acertar o alvo. Eu não podia arriscar. Levantei os braços e a espalmei. A bola quicou e voltou para a minha mão. Olhei ao redor e achei outro jogador de colete amarelo com os braços levantados. Fiz um passe para ele e voltei para debaixo da cesta.

- Muito bom “joelho-ruim”! – O treinador gritou.

Não gostei nada do apelido que ganhei, mas era uma sensação empolgante estar no meio do jogo. Eu não tinha joelho ruim coisa nenhuma, só achava melhor dar essas justificativas de atestados falsos do que mostrar o atestado verdadeiro em que meu médico de verdade contava toda a minha situação e que não devia fazer muitos esforços físicos. Não sei por que continuei com essa norma babaca de evitar quadras. Eu nunca dei ouvido a nenhum dos meus médicos. Eles erravam demais... para a minha sorte.

“Só mais seis meses antes da doença virar terminal...” “Ela não dá respostas ao tratamento.” “Não encontram nenhum doador compatível.” “A recuperação não vai bem!”

E aqui estava eu, contra todas as expectativas, jogando basquete! Sentia vontade de rir de todos aqueles doutores mauricinhos impecavelmente sempre brancos. Olhei ao redor e notei que estávamos sucumbindo a um novo ataque do time adversário. O jogador dessa vez não arremessou a bola, mas se atirou enterrando-a na cesta que sacolejou sob seu peso. Jake soltou os dedos do aro de metal e aterrisou sorridente. Levantei uma sobrancelha. Ele sorriu diretamente para mim. Um sorriso de chacota.

- É só isso que tem? Certeza que pode participar dessa aula?

- Fica na sua, que o jogo ainda não acabou! – gritei para ele no meio da bagunça da quadra.

O jogo estava acabando. Faltavam menos de um minuto e meio. A bola era nossa. Quem foi fazer o primeiro passe foi André. Toby o recebeu e saiu quicando a bola para o lado adversário. A marcação estava forte e ele teve de girar e passar a bola para Estela. Ela ziguezagueou e fugiu dos adversários. Perdemos a bola num passe para André. Toby recuperou-a. Eles estavam com 4 pontos de diferença. Faltava menos de meio minuto. Larguei meu lugar junto da cesta e corri desviando dos jogadores até estar na linha de três pontos adversária. Ergui os braços num pedido. “Pra mim!”. Ninguém do outro time tinha se dado conta de minha presença. Recebi a bola. Estiquei o corpo e encaixei a bola em minhas mãos, com um pulo dei impulso extra para o lançamento. A bola subiu em um arco certeiro. Estaria dentro da cesta com certeza! A nossa diferença no placar seria de apenas um mísero ponto. Os jogadores prenderam o fôlego. O treinador prendeu o fôlego. A bola começou a descer e logo no fim de seu arco estava o pote de ouro, a cesta. Do nada, duas mãos espalmaram a bola laranja. Ela despencou e quicou no chão. O apito soou.
O time adversário estourou de alegria. Meu time deu de ombros e se cumprimentou.

- Bom lance! - Toby disse com um sorriso tristonho. - Pena que não entrou... Sempre tem a próxima.

- Foi falta de sorte... - Estela acrescentou.

- Valeu gente. – acenei para o pessoal do meu time que acabava de conhecer de verdade. Antes eram só rostos na multidão.

Eles saíram para os vestiários. O treinador Northwhay apareceu com um olhar de esguelha para mim.

- Sabia que era mentira. - depois veio acrescentando. – “Joelho ruim”.

Fiquei no meio da quadra com a respiração acelerada. Um bem-estar estranho subia por mim.

-Como se sente, perdedora? - Uma voz veio de trás de mim, imediatamente sabia quem era.

- Você precisava fazer aquilo, ehm? Precisava se exibir?

- Um ponto era uma diferença muito pequena... Sem chance.

Jake me encarou de cima. Ele tinha uma bola de basquete na mão e a atirou para mim. A mesma mão que espalmou minha bola perfeita. Eu a segurei prontamente.

-Não foi justo. Um de vocês mais quatro... Contra cinco de nós meros mortais!

- Talvez esteja certa... Será que mano a mano é melhor pra você?

Espalmei a bola contra seu peito. - Mais do que bom.

Escolhemos uma metade da quadra. Jake correu e marcou seu primeiro ponto e seu segundo logo em seguida. Ele bloqueou o meu. Eu bloqueei duas outras vezes. Fiz um por sorte. A bola era minha agora. Fui batendo a bola em sua direção. Ele abriu os braços para bloquear meu caminho e ia andando de costas sem me perder de vista. Parecia um urso tentando me abraçar. O cerco estava fechando, mesmo que eu girasse tentando fugir ele voltava a me barrar. Movimentei meu corpo para a esquerda ganhando velocidade e sempre quicando a bola, ele se antecipou e eu desviei para a direita. Era a brecha de que eu precisava. Lancei a bola pela lateral com um braço e ela escorregou pela rede.

-Ponto! 2 a 2.

Ele fez uma cara de escárnio. A bola era dele agora. Ela passava quicando de uma mão para a outra. Ele não se moveu, estava esperando por mim. Seu sorriso era contagiante e sua pele brilhava com o suor. Peguei o ritmo de sua batida e fui para cima. A bendita bola chegou até a tocar meus dedos, mas ele a agarrou e correu para a cesta. Seu corpo se arqueou para trás e em seguida seus braços desceram como uma alavanca sobre a cesta. As mãos ficaram penduradas no aro de metal e a bola passou marcando o ponto final.

- Ok. 3 a 2, agora!

Ergui as mãos em rendição. Ele ganhou o jogo de modo limpo. Depois coloquei as mãos na cintura.

- Precisar usar uma enterrada... Devo ter te desesperado mais do que o normal!

- Como se fosse algo muito difícil de fazer... - Ele riu.

- Para mim é. - cruzei os braços.

Ele passou a bola pelas costas em um passe invertido. Eu a peguei e fiz uma cesta de três pontos.

- Difícil, nada! Até que sabe jogar bem...

- Uma enterrada precisa de algo mais... Tipo altura.

Jake revirou os olhos. Depois me mandou tentar, pelo menos. Eu tentei. O impulso e altura que tinha não era o suficiente para relar meus dedos no aro da cesta. Já tinha tentado duas vezes.

- De novo.

Obedeci. Empenhada, corri pela lateral do garrafão e dei impulso. A bola se desprendeu de minha mão e entrou na cesta. Meu corpo estava começando a sucumbir à gravidade. Eu não ia conseguir. De repente parei de cair e recomecei a subir em direção à cesta. As mãos quentes de Jake envolviam minha cintura e me erguiam no ar. Em segundos estava na altura certa. Meus dedos se firmaram no metal frio do aro. Eu sentia o calor, vindo das mãos que me sustentavam, entrar aos poucos em minha pele. As mãos se soltaram de minha cintura. Meu corpo estava suspenso no ar. Meus pés pendendo em direção ao chão. Um friozinho na barriga me atingiu. Frio por dentro, por fora ela estava quente pelo contato curto com a pele de Jake. Um sorriso cortou meus lábios.

- Como é a sensação?

- Muito boa. – Sorri abertamente. Soltei as mãos e esperei o impacto com o chão, flexionando o joelho para conter o impacto.

O impacto ocorreu antes do esperado, de modo abafado nas minhas costas. Olhei a assustada ao redor. Eu ainda não estava no chão... Percebi que estava nos braços de Jake. Sua mão direita segurou minhas costas e sua mão esquerda se encaixou sob meus joelhos. O frio na barriga se intensificou. Seu rosto estava dois palmos acima do meu, seus olhos se colaram nos meus. Eles brilhavam e pareciam quase sorrir. O olhar de Jake se estreitou sobre mim. Ele começou a dizer algo e parou. Depois recomeçou:

- Eu não devia estar sendo gentil com você, não é mesmo? - Não era isso que esperava ouvir. - Acho que minha promessa não é das melhores...

Ele me pousou no chão. Seu comentário cortou completamente as asas das borboletas em meu estômago. O mundo ficou um pouco mais claro e minha cabeça saiu das nuvens. O calor deixou meu corpo e o frio começou a fazer efeito sobre mim. Nos braços de Jake eu não sentira o frio que invadiu a quadra. Não era um bom clima para estar de short e regata. Envolvi meu corpo num abraço e tentei não tremer.

- Vamos logo. Eu estou morto de fome.

Jake foi para seu vestiário e eu fui para o meu. O banho quente ajudou o tremor a sumir. Ainda assim preferia o calor dos braços de Jake.

***

Nunca tinha ficado uma quarta-feira à tarde no colégio. Havia uma janta cedo ou algum tipo de lanche reforçado na cantina depois da ginástica. Os alunos eram em menor número. Olhei o refeitório já habituada com meus escândalos naquele lugar. Olhei de esguelha para a mesa de Judity e Helen. Elas tinham uma cadeira vaga para mim. Não estava escrito meu nome e nem nada, mas eu sabia que era para mim. Ajustei a alça de minha bolsa sobre o ombro e apanhei uma bandeja de comida.
Caminhei até as mesas. Na direção oposta de minha mesa de costume. Judity e Helen que me perdoassem. Eu tinha coisa bem melhor para fazer com meu horário de almoço. Parei de frente para a mesa de Sam. Jake e Quil já estavam lá. Achei estranho porque Quil não esteve em nenhuma das quadras. Eles pararam de conversar e olharam para mim. Na verdade, o refeitório parou. O ar tinha uma atmosfera pesada, se eu tivesse trazido uma bandeirinha branca comigo este seria o momento de usá-la.

-Eih, acho que não é um bom momento para eu falar porque estou aqui... - Olhei em volta, gente demais para um segredo tão bem guardado. - Mas só quero pedir desculpas por me intrometer.

Os ouvintes se desinteressaram. Não era uma briga. Ninguém respondeu nada. Remexi minha bolsa e tirei um embrulho de papel cartão.

- Bom, esperei que não fossem dizer nada mesmo. – Joguei o embrulho com as roupas emprestadas lavadas para Jake. - Isso é seu. Obrigada. Tchau.

Baixei a cabeça e fui saindo dali. Certamente não foi como eu planejei. Eu não estava magicamente bem-vinda na seita deles. Certamente já era um bom passo nenhum deles tentar me matar...

- Parem com isso. – Quil falava. Ele olhou em volta da mesa com um sorriso de garoto – Pode sentar com a gente !

- Você não manda aqui! - Paul ameaçou com os dentes de fora.

- Ora, Paul o que ela pode fazer? Deixe a garota sentar se ela quer. – Sam, ele estava me apoiando? Podia chamá-lo agora de “a voz da sabedoria”.

Sorri, animada. Olhei cada um deles. Ninguém ficou feliz ou nervoso demais por me sentar ali. Apenas Quil tinha gostado da mudança.
A atenção não ficou muito tempo sobre mim. Logo estavam conversando como se nunca tivesse me juntado a eles. Quil estava do meu lado e embora sorrisse eu vi uma cor incomum em seus olhos. Olheiras escuras apareciam sob seus olhos e seu rosto parecia tencionado para forçar o sorriso.

- , obrigado. Sei que se envolveu nessa birosca por minha culpa.

-Que é isso, você não tem culpa de nada!

- Bem, você não teria odiado Sam se eu não tivesse falado nada. E não teria descoberto nada... E chegado ao ponto de nos seguir na floresta quando a coisa ficou feia... E, pior de tudo, ter se arriscado a conversar com esse anti-social. - Ele meneou a cabeça para Jake. Ele subiu e desceu as sobrancelhas escuras em resposta.

- Admito que essa foi de longe a pior parte. Mas, não foi nada mesmo... Você é meu amigo e eu estava preocupada.

Ele sorriu de um modo tão caloroso que achei que podia me contagiar com aquela alegria. – É uma boa amiga!

- Pode ser, mas tente não se intrometer daquele jeito de novo, ok? - Embry fez uma careta.

- Desculpe ter tentado te matar. – Paul me olhou pela primeira vez desde que me sentei. Não parecia que ele se ressentia muito por aquilo, era o tipo de desculpa que eu daria por não ter conseguido comprar o presente que minha melhor amiga queria, mas que na verdade só não comprei por ser caro mesmo.

- Ah, tranqüilo. Eu causo esse tipo de reação nas pessoas...

Paul me olhou com as sobrancelhas apertadas embora ocultasse um semi-sorriso. A garota deu risada.

- Vocês tentam matá-la e ela até curte isso? Que tipo de garota é você? - Ela riu, enquanto gesticulava com seu palitinho de cenoura.

- Do meu tipo.

A cabeça dela balançou. Depois de uma mordida na cenoura virou o rosto para mim.

- Isso seria o quê? Quer dizer que você é original o bastante para não ter medo de morrer?

“Medo de morrer?”. Eu já tive isso dias o suficiente por uma vida inteira. Medo de eles me matarem, eu sem dúvida tive ontem. Mas de morrer? Sim, eu tinha medo de morrer. Ainda tinha. Mesmo depois de acreditar que cada dia era o último. O que será que eu realmente temia na morte? Já tinha pensado nisso várias vezes no passado. Eu sempre tive medo de não ter tempo. De não ter tempo para aprender todos os nomes das estrelas que via da janela do meu quarto ou de não achar meu lugar no mundo antes de partir. Medo de ficar apenas tempo o suficiente para ser lembrada por alguns dias, depois de ter ido, e depois esquecerem. Disso eu tinha muito medo.

- Eu seria uma idiota se falasse que não sinto medo de morrer. Mas não temo a morte estando aqui mais do que temeria estar em qualquer outro lugar. Eu vou morrer com certeza, algum dia desses, mas não vou ficar escondida no meu porão esperando por esse dia. Se por acaso acham que eu andar com vocês é um risco para mim, eu discordo! Posso assinar um termo de responsabilidade se quiserem.

Uma ponta do lábio de Jake se levantou por uma fração de segundos. Todos na mesa pareceram chegar a um acordo silencioso. Quil não escondeu estar me olhando, até bateu de leve em meu ombro. Mesmo de leve, doeu. Ele não devia estar acostumado com a própria força.

- E você não vai abrir o bico sobre nós... - Sam se inclinou em minha direção de modo a me intimidar.
- Isso já está no meu termo de responsabilidade. Se um dia fizer isso pode deixar que eu mesma me enforco.

Esperei um assentimento mudo de todos.

-Gostei dessa garota. – A única outra garota da mesa estendeu a mão para mim. – Considere-se membro do grupo. Leah Clearwater. Vai ser bom ter um pouco mais de atitude feminina por aqui.


11. Talento

Minha vida estava finalmente voltando aos eixos. Sentada à mesa dos lobos no refeitório me sentia encaixada. Não era mais a aluna nova, eu era parte de algo. Tudo estava incrivelmente bem. Leah e Quil me faziam dar risadas quase o tempo todo, enquanto Sam olhava um tanto reprovador para nós. Paul não me encarava mais, isso não significava que não desconfiasse de mim ainda. Eu ainda sentia um pouco de medo dele... Mas ele não parecia irritado com minha presença e eu não demonstraria o menor nervosismo.
Jake era mais distante de mim que Leah e Quil, mas sempre estava ali com um meio sorriso e um comentário. Era uma presença que alegrava meu dia. Quando ele me olhava com aqueles olhos negros eu sempre sentia um formigamento na base da nuca e isso mesmo quando não o estava vendo. Bastava sentir o formigamento e sabia que ele estava por perto. Assim ele nunca me pegava de surpresa com suas brincadeiras de tentar me assustar.
Mas eu tinha medo de tanta alegria. A vida nunca pode estar assim tão bem, e quando lhe dá tanta felicidade é porque está se preparando para tirar algo de você. Foi assim no passado e tudo é muito cíclico, por isso me sentia um pouco melancólica, tentando já me preparar para o futuro.

Hoje as coisas estavam começando a dar uma virada. Jake não se sentou com a gente na mesa. Sua cadeira vazia sempre acabava puxando meu olhar. Onde ele estava? Ele tinha ido ao colégio, porque eu o vi, mas nem oi falou. Ultimamente notei que cada dia suas brincadeiras eram mais raras, assim como os sorrisos. Ele parecia um tanto triste. Tomei coragem e perguntei:

- Cadê o Jake? Ele está fazendo curso para anti-social ou é impressão minha?

- Acho que não, ele não precisa ir muito longe pra isso... É só pedir uns conselhos para o Paul. - Quil olhou para ele.

- Não devia brincar com fogo, novato! Vou ter que te ensinar muita coisa mais tarde.

Paul fechou os punhos e levantou uma sobrancelha. Quil devolveu estufando o peito, como dizendo “Não tenho medo de você.”

- Tchi, estou sentindo cheiro de briga. Vamos fazer assim, os dois se enfrentam hoje depois da escola. Façam suas apostas comigo pessoal. – Jared adorava fazer apostas, assim como Embry. – O que me diz Embry?

Ele tirou cinco reais do bolso e colocou na mão de Jared.

- Acho que vou apostar no Paul nessa. Nada pessoal Quil...

- Valeu amigo. Espero que não esteja precisando do dinheiro, porque vai perder!

- Garotos, garotos. A minha aposta é no Quil. Acaba com ele, viu. – Leah entregou o dinheiro para Jared.

E a conversa perdeu completamente o foco. A cadeira vazia de Jake não saia de minha cabeça e era tudo que via enquanto todos faziam as apostas.
Olhei pelo refeitório procurando por ele. Sem Jake ali eu podia ver a mesa de Judity e Helen e o jeito que riam me incomodou.

***

-Ok, pessoal.

A professora tentava fazer o burburinho parar. A professora Silvana era provavelmente a menos respeitada de todo o colégio. Isso porque suas aulas eram as mais desvalorizadas pelos alunos. Geralmente ninguém se importa com as aulas de artes.
Ela era magrinha e loira. Usava óculos muito grandes para seu rosto fino e comprido. Geralmente usava roupas chamativas e estranhas que deixavam bem claro qual a matéria que lecionava. Eu até gostava dela. Ela era boazinha e completamente desligada do mundo.
- Esse ano vamos fazer algo diferente na escola. O diretor e eu concordamos que podíamos fazer um show de talentos esse ano.
Os alunos se entreolharam fazendo comentários. Eu apenas a encarei. Um show de talentos era algo diferente? Só se eles estavam morando em outra dimensão! Todos os colégios do mundo já tiveram essa idéia idiota.

- Um show de talentos? - Quil dava risada. - Eu podia ir de transformista e virar... Você sabe o quê. Ia ganhar com certeza!

- Seu idiota, você ia ganhar um passe pra um zoológico. – Embry balançava a cabeça para o amigo.

- E não é exatamente esse tipo de transformação que um transformista faz, Quil! - Dei risada imaginando um Quil transformista. Ele não entendeu o que eu queria dizer.

A professora continuou.

-Todos os alunos podem apresentar um talento que tenham. Pode ser qualquer coisa: Tocar um instrumento, uma dança, uma canção, uma apresentação de mágica... E serão os próprios alunos que escolherão os vencedores por votação.

Aproveitei a atenção de todos na professora e esquadrinhei a sala. Jake fazia aquela aula comigo. Onde ele estava? Encontrei seu olhar voltado para a janela no outro canto da sala. Porque ele andava tão isolado?

- Professora, e quem não tiver nenhum talento? - Uma garota que não sei o nome perguntou.

-Todo mundo tem um talento!

- Mas, todo mundo vai se apresentar? - Tody encarou a professora com irreverência.

- Bom, só apresenta quem quiser. É só se candidatar, colocando o nome nessa lista. - A professora levantou a lista no ar.

- Mas e se ninguém se candidatar?

A professora ficou sem fala. Ficou bem chateada em pensar que não haveria nenhum candidato.
Alana levantou a mão no ar.

- Lógico que alguém vai se candidatar! Temos alunos com muito talento aqui, como a !

Toda sala olhou para mim e eu encarei Alana com irritação. Ela já não tinha aprendido a lição?

- Ficou louca garota? Não dê ouvidos professora, ela nãos sabe o que fala. – Retruquei.

- Mentira, ela é muito talentosa e devia se candidatar. – Alana insistiu.

A professora estava bem confusa com aquilo. Judity então se levantou.

- Professora, nós podíamos fazer algumas apresentações em sala para nos inspirarmos.

-É uma boa idéia Judity. - A professora aprovou. - Algum voluntaria?

-Lógico. A . - Judity de novo.

“Será que ninguém ensinou pra essa garota o que significa voluntário?!”

Quil deu uma cutucada no meu ombro. – Inventa uma desculpa.

- A menos que esteja com medo, . – Alana sorriu ameaçadoramente.

- Acho que você sabe muito bem que não tenho medo de palcos, Alana. Mas não tenho a menor vontade de me apresentar para você!

- , já teve algum show de talento no seu antigo colégio? - a professora perguntou.

-Já.

-Ótimo. Então você sabe como é, podia fazer uma demonstração? - A professora estava piorando minha situação.

“NÃO!”

-Que instrumento você toca?

Olhei ao redor, eu não ia ter saída mesmo. Firmei a voz e me levantei. – Violão.

Se Judity e Alana queriam um espetáculo, eu ia dar exatamente isso a elas. Fui até a mesa da professora e ela me entregou o violão.

-Boa sorte. Precisa de alguma coisa?

- A senhora sabe tocar teclado? - Ela sabia e eu passei a música para ela.

Tentei ajustar as cordas e passei os dedos sobre elas para verificar o som e se eu ao menos lembrava as notas. Escolhi uma música bem diferente do meu estilo normal, mas que eu conseguia cantar e que exigia tudo de minha voz. Geralmente as pessoas ficavam impressionadas de eu conseguir cantar músicas de Joss Stone, por causa de sua voz forte, já que eu não tenho uma voz tão forte assim.

“Right to be Wrong” era uma música que Alana não esperaria que eu cantasse. E sei bem da onde ela tirou essa idéia de eu cantar. Judity ouviu certa vez eu dizer que detestava ter que cantar em público, o que é verdade... Mas eu já cantei em público antes e me saí bem, e disso ela não sabia. Agora eu tinha certeza do quão amigas eram Judity e Helen.
Sentei em cima da mesa da professora e me preparei. Deixei os dedos começarem a trabalhar e a voz sair.



I've got a right to be wrong (Eu tenho o direito de errar)
My mistakes will make me strong (Meus erros me farão forte)
I'm stepping out into the great unknown (Estou entrando no grande desconhecido)
I'm feeling wings though I've never flown (Sinto que tenho asas embora nunca tenha voado)
I've got a mind of my own (Eu tenho minha opinião)
I'm flesh and blood to the bone (Sou feita de carne e sangue até o osso)
I'm not made of stone (Não sou feita de pedra)
Got a right to be wrong (Tenho o direito de errar)
So just leave me alone (Por isso me deixe em paz)

I've got a right to be wrong (Eu tenho o direito de errar)
I've been held down too long (Já me seguraram por tempo demais)
I've got to break free (Eu tenho de me libertar)
So I can finally breath (Para que possa finalmente respirar)
I've got a right to be wrong (Eu tenho o direito de errar)
Got to sing my own song (Cantar minhas próprias canções)
I might be singing out of key (E posso ficar desafinada)
But it sure feels good to me (Mas tenho certeza que me sinto bem assim)
Got a right to be wrong (Tenho o direito de errar)
So just leave me alone (Por isso me deixe em paz)

You're entitled to your opinion (Você tem direito à sua opinião)
But it's really my decision (Mas é realmente minha decisão)
I can't turn back I'm on a mission (Eu não posso retornar, estou numa missão)
If you care don't you dare blur my vision (Se você se importa, não se atreva a ofuscar minha visão)
Let me be all that I can be (Me deixe ser tudo o que eu posso ser)
Don't smother me with negativity (Não me esmague com sua negatividade)
Whatever's out there waiting for me (Qualquer coisa lá fora, que esteja esperando por mim)
I'm going to faced it willingly (Estou indo disposta a enfrentar)

I've got a right to be wrong (Eu tenho o direito de errar)
My mistakes will make me strong (Meus erros me farão forte)
I'm stepping out into the great unknown (Estou entrando no grande desconhecido)
I'm feeling wings though I've never flown (Sinto que tenho asas embora nunca tenha voado)
I've got a mind of my own (Eu tenho minha opinião)
I'm flesh and blood to the bone (Sou feita de carne e sangue até o osso)
I'm not made of stone (Não sou feita de pedra)
Got a right to be wrong (Tenho o direito de errar)
So just leave me alone (Por isso me deixe em paz)

X2

Ninguém falou nada durante, mas no final vieram os aplausos e me senti muito bem. Principalmente por ver a cara de Alana e Judity. Eu fiz exatamente o que elas queriam e saí vencendo no jogo delas.
Fiquei vermelha ao notar que o formigamento na minha nuca permaneceu a música toda e ainda continuava. Jake me olhava sorridente do fundo da sala. Aquilo era melhor do que uma medalha. Quil, Embry e ele vieram ao meu encontro com elogios bobos, eu apenas dei risada. Jake finalmente falava comigo naquele dia.

- Tem mais alguma surpresa, baixinha? – Ele encenou uma cesta.

- Uhm... não posso contar, ou não seria mais surpresa!

Agora, seria só isso também, pois mesmo que a professora me implorasse eu não colocaria o nome naquela lista.



12. Dever de amigo

Jacob estava sentado na varanda quando cheguei. Estava de cabeça baixa olhando para as próprias mãos. Coitado. Naquele instante eu vi através da atitude rude e solitária o que realmente se passava. Eu precisava fazer alguma coisa.
Duas semanas já haviam se passado desde que entrei para o grupo, mas eu e Leah já estávamos agindo como as melhores amigas que se conhecem desde a infância. Melhor dizendo, como se fosse sua amiga de infância. Porque Leah não é exatamente como as outras garotas. Ela não é a pessoa mais aberta do mundo, só que estava disposta a poder falar um pouco com outra garota. Devia ser absurdo ser a única garota-loba da matilha, principalmente quando o alfa era seu ex.

Leah tinha muitos problemas e não iria admiti-los com facilidade, preferindo dar uma de durona e infernizar a vida do resto da matilha só por diversão. De qualquer forma, Leah me mantinha informada sobre o que fosse que eu quisesse saber sobre o grupo desde que não envolvesse seu passado emocional.
Foi naquela manhã que ela havia deixado escapar o que realmente aconteceu com Jake. Afinal, ele estava estranho, soturno e distante cada dia um pouco mais. Exceto às vezes, quando aparecia como o sol entre as nuvens espessas, mostrando que um dia as coisas foram diferentes e sorrisos ensolarados eram mais comuns... Até alguma coisa ter acontecido. E essa coisa era Edward.

Sabendo o porquê daquela atitude contraditória, hora brincalhona e hora distante ou irada, eu podia entender melhor as coisas. Eu agora me via como em um espelho. Jacob Black era também um humano e como tal sofria do coração. Bella era realmente mais do que a amiga dele, o que eu gostaria que apenas fosse; só que também era a namorada de um vampiro.
Os vampiros eram os frios. Coisa que Jake em sua gloriosa sabedoria não conseguiu me contar. Leah, sim. Ela contou o quê e quem eles eram. Os Cullens eram vampiros e era por causa dos vampiros que os lobisomens precisavam existir. Assim como a luz não existe sem a escuridão, lobos não existiam sem vampiros. Era o duelo da vida deles: matar vampiros. Livrar o mundo de sanguessugas imortais que gostavam de se divertir com vidas humanas.

Lógico, que junto da verdade veio um bando de perguntas. Leah não chegou nem perto de responder todas. Ela já estava ficando bem chateada com o assunto. Explicar que vampiros não queimam ao sol e não dormem em caixões não era bem sua preferência de conversa. Mas saber mais sobre os Cullen era instigante demais.
A verdade resumida era: Os Cullen são vampiros bonzinhos.
Pois é, depois de lobisomens legais eu só podia esperar o bando de hippies vampiros morando ao lado. Eles eram ‘vegetarianos’ (bebem sangue de animais), pacifistas e simpatizantes de humanos. Comecei a imaginar se não dirigiam um furgão estilo paz e amor... Bonzinhos ou não, é impossível confiar em bebedores de sangue e logo as coisas entre lobos e morcegos tiveram que ser formalizadas. Daí saiu o tratado do bisavô de Jake (quem diria).

O tratado dizia claramente quais eram as terras que caberiam a cada parte; e que os vampiros não poderiam jamais se alimentar de sangue humano ou transformar novos vampiros na região. Se o bisavô Black soubesse o trabalho que os vizinhos Cullen dariam ao seu bisneto teriam acrescentado um regulamento contra namoro com humanos da região. Infelizmente ele não pensou nisso e Jake hoje tinha que pagar o pato.
Bella era a sortuda paixão de Jacob, que namorava Edward. Eles romperam certo dia e ela acabou correndo para os braços de Jake. Seria tudo um mar de rosas se eles (Bella e Edward) não tivessem reatado recentemente, mais ou menos ao mesmo tempo em que eu pousei no meio desse rolo todo. Agora a garota está com o arqui-inimigo mortal de Jacob e ele continua vidrado nela, o que causa todo o problema.

Essa confusão toda só me fazia pensar na minha própria confusão, e em como teria sido melhor se eu tivesse vindo parar na reserva antes que Luccas ou Bella tivessem chance de quebrar algum coração.
Mas a história de Jake seria diferente da minha. Porque ele teria apoio! Eu não deixaria Jacob passar pelo mesmo que eu. Claro que ele não tinha problemas mentais como eu... Mas eu tinha que ajudá-lo. Eu era parte do grupo e ele era meu amigo.

***

- Oi Jake! - Sentei do seu lado na varanda.

-Oi... - Ele se quer levantou os olhos para mim.

- Pensando muito... Talvez em Bella?

Ele se virou para mim, não parecia o Jake do sorriso ensolarado, era de longe animado, e seus olhos pareciam vazios.

-Um passarinho me contou. – Respondi sua pergunta não verbalizada – E eu quero ajudar!

- Ajudar? Como? Você não faz idéia...

- Faço sim. Você gosta dela, ela namora um vampiro, seu inimigo jurado, e blá blá blá...

Jacob achou alguma graça sinistra no que eu dizia e tudo que fez foi debochar.

- Grande! E o que pretende fazer?

- Eu posso convencê-la a deixar o cara. – Seu olhar incrédulo me atingiu. – Indiretamente se preferir. Eu conheci o Mike Newton da loja onde ela trabalha, sei onde fica... posso fazer uma visita e jogar conversa fora.

- Convencer Bella a largar o sanguessuga?!

- É. Primeiro tenho que plantar a semente da dúvida.

- Aham, obrigado, mas passo. E porque você me ajudaria?

Eu esperava essa pergunta. Nem eu podia responder com total certeza. Eu estava querendo juntar Jake com Bella, realmente?

- É dever de um amigo: ajudar!

- Você não pode me ajudar! Não sabe do que isso se trata...

-Faço uma boa idéia do que se trata.

-Não quero sua ajuda, só vai piorar as coisas.

Levantei irritada e já ia indo embora. Não devia ter vindo informar nada. Ele não precisava saber que estava ajudando.

-Onde você vai?

- Comprar material esportivo, onde você acha?

- Você não pode ir andar no meio daqueles sanguessugas. É arriscado para você...

Parei no meio do caminho e o encarei. Como podia ser arriscado só para mim?!

- Como é que é? Arriscado pra mim. Só pra mim? Entendo, a Bella pode andar com vampiros sem problemas, mas para mim é muito arriscado!

- Acha que eu gosto que ela esteja com eles?

- Ah, esquece! Eu nem sei por que vim até aqui. Você é pior que a minha mãe!

Entrei no carro e no segundo seguinte já ouvia Jake chamando meu nome no mesmo timbre de repreensão da minha mãe. Olhei a casa se afastar pelo retrovisor. Eu ajudaria com ou sem permissão!

Parei o carro em frente da casa de Antoni e pensei um pouco no que devia fazer agora. Meu plano inicial era ir direto para a loja, mas precisava ser mais esperta que isso. Todo cuidado era pouco. Jake podia estar sendo exagerado, mas era arriscado encontrar vampiros.
O que eu sabia sobre vampiros? Não muita coisa. Sabia que bebiam sangue e eram rápidos e fortes. Que eram brancos e gelados e não dormiam em caixões ou queimavam ao sol. Também não deviam ter problemas com alho e crucifixos. Mas no que isso ajudava? Eu precisava saber os detalhes. Suas fraquezas... O segredo estava nos detalhes. Eu devia estar me esquecendo de alguma coisa.

De repente me lembrei de uma conversa com o grupo todo. Eu tinha acabado de voltar da loja do Mike Newton, afinal eu já tinha ido lá outras vezes para esquadrinhar o terreno e já até tinha conversado com Bella umas duas vezes. Enfim, eu tinha acabado de voltar e fui para a casa de Jake. Foi só eu chegar e Paul franziu o nariz dizendo... “Você fede!”.

Era verdade, eles odiavam o cheiro uns dos outros. Inspirei bastante ar tentando encontrar algum cheiro em minhas roupas. Não senti nada, eu não estava fedida... Mas, melhor não arriscar. Subi e tomei uma ducha rápida e troquei de roupa. De novo não senti nenhum cheiro estranho. Será que eu ainda estava “fedida” ao olfato deles? Não podia arriscar encontrar um Cullen enquanto estivesse cheirando a lobisomem, eles não confiariam em mim e talvez tentassem me matar... Borrifei um monte de perfume em cima de mim. Meus olhos até lacrimejaram, mas definitivamente eu estava livre de cheiro de lobisomem. Pronta para sair à caça de morcegos!

Cheguei ao meu destino mais rápido do que esperava. E isso nada tinha haver com minha direção perigosa. A ansiedade distorcia meu senso de tempo. Um formigamento começou a se espalhar por meu estômago. Fascinante! Eu realmente estava me viciando... Era pura ilusão dizer que durante meu tempo de filha pródiga não fui tentada por nenhuma droga. Fiquei completamente viciada em uma. E ela corria por minhas veias agora mesmo. Adrenalina!
Entrei na loja e vi que Bella atendia dois homens que procuravam as botas mais adequadas para uma escalada. Mike recebia o dinheiro de uma mulher no balcão. Dei um oi para Mike que logo estava livre da cliente e veio ao meu encontro com um sorriso.

- ... - Ele parecia surpreso. - Veio comprar o que desta vez? Talvez um caiaque...

Ele indicou um caiaque grande e amarelo que mais lembrava uma banana. Que tipo de louco comprava aquilo?

- Não obrigada. Apesar de ser tentador, estou sem grana. – Dei de ombros. - Só vim ver uns amigos. Espero que não tenha problema.

-Lógico que não!

Bella parecia estar perdida no meio dos dois clientes.

- Acho que alguém precisa de ajuda. – Mike suspirou e foi até lá. Bella ficou livre e fui falar com ela.

-E aí, como vai?

- Bem. – Ela respondeu de forma pouco convincente. Como sempre parecia estar carregando um mundo sobre os ombros. Sorrir parecia um trabalho árduo para ela. – Teve tempo pra uma visita.

- É. A reserva fica muito longe daqui... – revirei os olhos.

- Nada que um carro não resolva. E como você está na escola?

- O de sempre, lutando pra salvar o que restou do meu histórico escolar passado... Quero mais é saber como estão as coisas aqui!

Ela ajeitou o cabelo atrás da orelha e começou a preparar duas frases antes de responder finalmente.

-Ah, não sei não. Nada de muito interessante.

-Nada! Jura que Forks High School não tem nada de muito interessante? - Dramatizei bastante. – Bella, a escola da reserva não tem um centésimo dos acontecimentos daqui!

Mike já se despedia dos clientes e veio até nós. Sem grande espanto ele estava ouvindo a conversa e veio com a resposta na ponta da língua.

- Tem a formatura!

- É a coisa hiper interessante do momento é a formatura... Afinal, a gente já está no último ano.

Não foi nada animada. Pensei ver um traço de tristeza no olhar dela, como se vagasse por algum lugar distante em sua mente ao pensar estar no último ano. Bom, eu sempre achei esses eventos escolares um pé no saco. Escola é escola e festa é festa, não dá pra misturar. Mas eu também não ficava tão chateada assim. Talvez ela estivesse triste por estar no último ano... Ia abandonar de vez sua vida de colegial.

-Ah, e vai muita gente? – Era a forma indireta mais ridícula de pedir um convite.

Bella e Mike responderam juntos.

-Sim.

-Não

Mike tentou arrumar - Quer dizer, vai bastante gente, mas a Bella convidou pouca gente. Acho que ela vai ter que começar a vender os convites da cota dela.

Ele deu um cutucão no braço de Bella, que pouco confiante ofereceu um convite, se eu quisesse. Afinal só ia o pai dela e talvez a mãe, mesmo.

- Claro que aceito. Vou ver todos vocês de beca e chapeuzinho esquisito. Não posso perder.

-Claro. E você podia até cantar na formatura pra gente.

Congelei. Como ele sabia disso? Que maldita conspiração era essa? A escola saber já era o bastante, mas agora o assunto já havia se espalhado. Logo não haveria uma alma viva que não soubesse... Judity e Helen eram bem piores do que eu imaginava, não eram amigas coisa nenhuma.

-O que foi que você disse?

-Acho que você não está acostumada a cidades pequenas... Não dá para ter segredos!

Aí que você se engana. Se Mike soubesse todos os segredos que o rondavam iria pirar. Eu só não pirei porque já era pirada, então não faria muita diferença mesmo.

-Cantar? - Bella se virou confusa para mim. Pelos vistos não era tão bem informada quanto Mike.

-É. – Respondi sem ânimo.

- Não seja modesta. Eu vi o vídeo.

-Viu o quê?

- O vídeo.

Havia um vídeo? Estava começando a achar aquilo hilário.

-Quer saber, você tem razão. Só que a formatura é da sua escola, não iria me intrometer, ainda porque vocês adoram o pessoal da minha escola.

Mike ficou sem resposta. Eu precisava retomar o foco. Não vim ali para ficar discutindo meu desempenho vocal.

-Sabe, eu estava pensando em ir ao cinema com umas amigas. Um programa pra garotas, se você estiver livre e quiser ir.

Olhei para Bella, mas ela balançou a cabeça.

-Estou de castigo.

- Quando o seu castigo acabar então...

- Não, eu estou meio que num castigo permanente.

Castigo permanente. Nem quando eu virei uma noite na cadeia minha mãe me deu um castigo permanente. Se tivesse dado eu não teria obedecido, mas de qualquer forma não deu. O que será que a Bella tinha feito? Ela não parecia ser do tipo fora da linha. Será? A única coisa que devia ter feito de errado na vida, foi namorar um vampiro.

Do nada, ela se virou para a porta. Não havia nenhum sinal de que houvesse alguém na porta, mas ela percebeu. A porta se abriu e Bella se desfez num sorriso empolgado. Era ele. Não precisava conhecê-lo, bastava ver o efeito dele sobre Bella para saber. Ela estava enfeitiçada. Não havia mais nada, só Edward em seu mundo.

Edward entrou na loja. Senti sua presença antes mesmo de vê-lo. Cada célula do meu corpo sabia melhor do que eu que ele era perigoso. Ignorei os avisos de retirada e fiquei firme ali.

- Finalmente conheço o famoso Edward! - Verei de uma vez em sua direção.

Ele era lindo. Era verdade. O corpo branco feito mármore se movia em nossa direção com elegância. Mesmo não o tocando também podia perceber que era gelado. Seus cabelos eram de um tom de cobre e os olhos eram castanho-dourados. Tudo nele se encaixava perfeitamente. Parecia uma estátua grega.
Se não estivesse me controlando, teria arfado com aquela visão. Mas eu estava controlada, talvez até tensa. Pensei com toda força: “nem tudo é o que parece. Um rosto bonito, não quer dizer nada.” Repetia essa frase tentando ignorar aquela bela visão.

Ele deslizou pelo espaço até junto de Bella. Passou a mão envolvendo sua cintura e lhe deu um beijo na testa. Ela o fitava com adoração e ele devolveu com toda a admiração direcionada a ela. Aquele clima contaminava o ambiente. Estremeci, ao perceber que pensava em Lucca.
Seus lábios se descolaram da testa dela e pude jurar que vi um sorriso maldoso direcionado a mim. Como se ele visse minha inveja, visse no que eu pensava... Ou talvez ouvisse. O olhei curiosa.
Algo que vi em filmes de ficção começou a inundar minha mente. Edward podia ler mentes!? Será que podia ser? Não, podia. Mas, por que não? O mundo já não me deu provas o bastante de que tudo era possível? Era um fato. Edward podia ler...

-É um prazer conhecê-la também, .

Um sorriso se desenhou no seu rosto de anjo. “Gentil e cortês.” Embora seus olhos ainda me deixassem desconfiada. Ele falou bem no meio da conclusão de que ele talvez lesse minha mente. Foi preciso demais. Era apenas uma distração.

-Mike... – Edward acenou a cabeça para ele.

- Edward... - Mike devolveu o cumprimento e depois se afastou com súbitos afazeres na loja.

Ele não parecia confortável com Edward ali.
Não desgrudei os olhos de Edward. Suas feições pareciam muito sérias e concentradas. Quase podia sentir sua consciência ultrapassando a barreira protetora dos meus pensamentos.
“Na minha mente não, seu filho da puta” pensei isso no volume mais alto que consegui. A feição dele vacilou. Parecia surpreso e divertido. Senti um pouco de vergonha por ter sido rude com alguém que foi educado comigo. Mas que se dane! Eu estava certa. Edward pode ler mentes.
Bom, se ele lia minha mente, eu não podia simplesmente pensar à vontade. Ia ter que deixar para mais tarde... Uma pena, porque estava determinada hoje.

-Bem, temos que ir agora. Charlie vai te matar se não chegarmos a tempo. – Ele olhou para Bella intuitivamente. – Aguardaremos sua apresentação na formatura ansiosamente, .

“Espere sentado!” Seus lábios se contorceram num meio sorriso.

-Tchau, . A gente se vê depois. Desculpa não poder conversar mais, Charlie... Apareça mais vezes.

-Pode deixar! Tchau.

Os dois caminharam de mãos dadas para fora da loja. Fiquei observando-os até sumirem de vista.
Mike já estava no horário de fechar a loja e começava a descer as grades. Despedi-me dele e fui para o carro. Fui o caminho todo contando meus passos mentalmente. Durante o caminho para casa liguei o rádio e me concentrei ao máximo na letra da música. Não sei o quanto isso atrapalhava Edward, ou a que distancia seus poderes chegavam... Mas minha mente não era mais só minha. E isso, era assustador!


13. Invasor

Edward foi a primeira pessoa em quem pensei quando fiquei finalmente sozinha em meu quarto. Ele tinha um poder bem peculiar e irritante. Acho que não deixei que nenhuma de minhas intenções transparecesse, mas era algo complicado controlar os pensamentos. Seria bem chato continuar com meus planos de juntar Jacob e Bella. Se é que eu realmente queria isso.
É quase impossível manter corpo e mente em pleno controle. Nem o Dalai Lama deve ter conseguido. Era loucura continuar com isso.

Soltei todo meu peso sobre o colchão e deixei meus pensamentos livres.
Eu estava fazendo isso por Jake.
Lembrei de seus olhos escuros olhando diretamente para os meus quando estávamos sentados em seu quarto. Valia muito à pena fazer algo para ajudá-lo, mesmo que isso significasse juntá-lo com outra pessoa. Desde que ele sorrisse e fosse aquele sol radiante novamente...
Mas Edward passou de minhas expectativas. Ele invalidou todo o baralho que tinha montado. Eu precisava fazer as coisas de modo diferente.

Bella já gostava de Jacob. Afinal ela era estranha, mas não louca. Além disso, quando ficou sem Edward foi direto para Jake que ela correu. Eu só precisava eliminar Edward da equação. Claro, só isso! Eu precisava fazer Bella esquecer aquela estátua viva perfeita, ou então matar Edward. Como não faço idéia de como matar um vampiro, acho melhor manter a primeira opção.
Precisava achar motivos para Bella largar Edward. Melhor começar pelos meus motivos para eu não ficar com ele, pois uma coisa era dizer que eu odiava vampiros sem ver nenhum e outra era depois de ter fincado os olhos naquela maravilha. Ele era sem dúvida uma visão alucinante, mas tinha que haver defeitos.

Pra começar ele podia ler minha mente. Há certas coisas que gosto de preservar só para mim. E uma delas é minha mente, porque seria muito difícil conviver com alguém que sabe tudo em que penso. Ele nunca se surpreenderia ou desconfiaria de nada, sempre saberia de cara meus segredos. Saberia também como me manipular e prever minhas ações. Onde fica o livre arbítrio? Não sei como a Bella suporta isso, mas eu não nasci para ser marionete de ninguém. Que se exploda a atração física! Eu não trocaria a minha liberdade de pensamento por nada nesse mundo.

Outra coisa era o frio. Ainda não tinha passado o pior do inverno ali, mas eu morria de frio todo dia. A última coisa que ia querer ia ser ficar com alguém mais frio do que o clima da região. Imagina, você acorda congelada nos braços do seu amor de manhã, que coisa sem graça.

Pensar no clima, me fez lembrar da Califórnia. Checando meus e-mails fiquei feliz em ver que tinha mensagens de minha mãe e das duas únicas amigas do colégio em L.A. Becky e Lisa deviam ser as únicas amigas verdadeiras que tinha; diferente de Judity e Helen. Algo me dizia que elas ainda iam me causar mais problemas, mas por enquanto as tempestades estavam distantes.
Fiquei surpresa por Becky e Lisa, mesmo depois de todo nosso distanciamento com a fase ruim que tive, estarem ali prontas a me ajudar no que fosse. Acho que nossa amizade é mais forte que qualquer força do universo! Até ao buraco negro do meu passado elas sobreviveram. Eu tinha me esquecido disso, o tempo que passei com Judity e Helen me fizeram esquecer que existem amigas verdadeiras no mundo.
Ter amigas assim era uma dádiva!

Respondi todos os e-mails acumulados satisfeita e fui dormir. Tinha muito no que pensar, mas adormeci logo. Minha mente caminhando para um subconsciente doce e agradável.

***

Acordei e ainda era escuro. Escuro demais. Abri os olhos devagar. Ainda era noite. Esfreguei algumas vezes meus olhos. Parecia ter um vulto em pé no meio do quarto. Não consegui ver com certeza quem era.

-Quem...é? Tio?

- Psiu. Não é pra acordar o senhor Felder. – A voz entrou em meus ouvidos, e me fez acordar abruptamente, era Jake.

Todo o meu corpo se tornou ciente de sua presença, um formigamento começou na base da minha nuca. Depois de o espanto passar, senti raiva.
O que diabos ele estava fazendo no meu quarto aquele horário? Como se atrevia? Queria gritar com ele por ter invadido meu quarto. Abri a boca para protestar. Jake percebeu o que eu ia fazer e tapou minha boca rapidamente. Isso me irritou mais ainda. Comecei a berrar sob sua mão. Apenas sons abafados se ouviam. Tentei tirar sua mão de minha boca e empurrá-lo. Nem com toda minha força os murros em seu peito faziam algum efeito. Nada funcionava.
Lembrei de morder sua mão, só que era provável que só quebrasse meus dentes! Desisti.
Ele esperou até eu me acalmar. Tinha um sorriso nos lábios. Desviei o olhar, me sentindo impotente.

-Pronto, acalmou? Agora, seja boazinha e não grite. Promete?

Fiz que sim e ele me libertou.

-Ufa. Pensei que não fosse parar de gritar nunca! Que fôlego!

O ignorei.

- Como entrou aqui?

-Pela janela. – Ele apontou a janela aberta.

- Vou colocar grades nela!

-Calma, não precisa exagerar.

- O que? Não quero você invadindo meu quarto no meio da noite sempre que der vontade!

- Não seja tão melodramática. Invadi seu quarto e não seu banheiro. É só não dormir pelada.

Arregalei os olhos. Que atrevido! Tinha milhares de coisas passando na minha cabeça para gritar com ele, mas apenas me calei. Ele devia ter um motivo para estar ali e eu queria muito saber qual era.

- O que veio fazer aqui? - as palavras pareciam mais uma ameaça.

Ele se sentou ao pé da cama. Reparei que estava sem camisa e o luar desenhava sua silhueta destacando os músculos. Um arrepio correu minha coluna, será que eu não gostaria de Jake invadindo meu quarto sempre que quisesse?

-Vim ver se estava viva...

- Já inventaram o telefone.

- Também queria saber como foi em Forks... – Ele olhou as próprias mãos parecendo desconfortável.

Joguei as cobertas de lado e me levantei sentido uma felicidade típica do triunfo. Parei de frente para ele.

- Aceitou minha ajuda?

Ele ergueu os olhos para mim. Uma sobrancelha em pé, ele ficou me encarando um tempo, depois disse: - É.

Saboreei a vitória por um tempo. Até que reparei que ele olhava meu pijama de inverno com um tom de deboche. Era grosso feito moletom. Eu era mais friorenta pra dormir do que durante o dia, o que parece quase impossível.

-Viu só, eu não durmo pelada. – Dei risada observando o quão ridícula devia estar.

Provavelmente parecia um novelo de lã gigante.

Ele apenas ergueu os olhos escuros para mim. - Que pena!

Fiquei vermelha e ele deu risada. Será que Jake realmente pensava assim? Será que em algum pontinho lá no fundo ele gostava de mim? Sentei do seu lado e comecei a contar toda a minha epopeia com os vampiros. Ele ouviu sem dizer nada. Só depois falou.

-Ela está de castigo por minha culpa. Dedurei para Charlie que ela estava andando de moto escondida... Comigo.

-Por que você fez isso?

-Para ela ficar de castigo e não poder andar com os sanguessugas.

- Isso não foi muito nobre de sua parte.

-É eu sei...

- Isso me causou problemas, sabia? Não posso sair para falar com ela, porque ela está de castigo... Mas eu dou um jeito por Forks mesmo.

-Algumas pessoas realmente não têm senso de perigo!

-Não acho que corra tanto perigo assim com os Cullen. Eles nem tomam sangue de humanos. Ele bufou irritado com a defesa dos vampiros. -Mas Edward é realmente bem irritante, e até perigoso nos meus planos... – inclinei a cabeça para sussurrar. – Ele lê mentes!

Não causei a reação que esperava. Ele deu de ombros.

-Já sei disso.

- E porque diabos você não me contou?! Ajudaria bastante se eu soubesse disso antes.

- Bem eu não queria que você fosse mesmo. - ele deu um sorriso. - Ele viu o que planejava?

- Não. Percebi que ele lia mentes e não pensei nada comprometedor.

Jake pareceu um pouco impressionado, mas não iria me elogiar. Era orgulhoso demais para isso. Já era muito bom ele estar me deixando ajudar.
Meus olhos foram ficando pesados e o entusiasmo que me mantinha acordada foi passando.

-Vá dormir, . Você está precisando.

- Espera! Você me deixou realmente ajudar?

-Claro que sim. – ele revirou os olhos. - Agora durma.

-Não... Jure!

Ele ergueu a mão direita e jurou. Agora, não tinha mais como voltar atrás ou tinha? Ele já estava falhando bastante no último juramento. Talvez fosse melhor fazer um juramento por escrito...

-Tchau. - Ele pulou pela janela.

Empoleirei-me na janela. Ele já corria longe. Droga, sem chance de um documento ser assinado hoje. Fechei a janela e fui dormir. No final das contas nem pensava em colocar grades em janela nenhuma. Sonhei com novas visitas desse intruso irritante.


N/B: Ai meu santo Pai! Era eu que ajudava o Jake a ficar com a perua deslavada na Bella mala sem alça! Aff. Mas vamos ver no que isso vai dar. Agora até fique curiosa com esse plano! Não sei não mas eu tô aqui com várias desconfianças…acho que isso vai dar molho! Aushausuhasuh
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Kisses da Baby


13.           Penhasco
 Rotinas escolares são todas tão iguais! Sorte minha que tinha entrado em um grupo tão fora de série que chegava a ser um mito, e agora meu final de semana seria bem diferente. Uma coisa que eu ainda não tinha feito desde que cheguei ali era ter pulado de um penhasco. A idéia me assustava muito! Mas era excitante também. Eu não era tão resistente quanto eles e a altura devia ser imensa... Jake falou que chegava a 200 metros!  Ok, eu sei que ele exagerou...
Por sorte Leah notou minha insegurança e veio ao meu socorro.  Para que o passeio não se resumisse a pular do penhasco, o que quase me obrigava a fazer o mesmo, ela definiu que faríamos uma fogueira depois para passar a noite no penhasco. Coisa que me pareceu pra lá de arcaica, mas no fim das contas, eles eram todos indígenas, não é mesmo?
Mas enfim, eu não recusaria a companhia deles...
Com toda a boa vontade de meu tio foi fácil conseguir um passe livre para ir até os penhascos. Quando ouvi a buzina, corri para a porta, agarrando meus dois casacos extras no caminho. Lancei um “até logo” pela beirada da porta e sai. O Rabbit recém reformado de Jake aguardava lá fora. Embry e Quil já estavam dentro do carro.
-Oi!  - Acenei para eles com um sorriso de orelha a orelha.
-Eai, preparada?- Quil me encarou.
- Já nasci preparada.
Sentei no banco do passageiro ao lado de Jake e passei meus casacos para o espaço vago no banco de trás.
- E pra que tantos casacos? Vai pro Alasca? – Embry empurrou meus casacos para um canto do banco.
- Até lá seria mais quente que aqui...
- Bom, não podemos competir com o calor de Los Angeles, mas vamos ver se não acha tão tediosos nossos fins de semana. – Jake ligou o carro e partimos.
Não demorou a chegarmos ao topo do penhasco. Os carros de Jared e Leah já estavam lá. Kim e Seth os acompanhavam.
Meu olhar percorreu a superfície parcialmente plana de pedra que acabava abruptamente à minha direita. Eu podia ouvir sem grande esforço o som do mar bem lá embaixo. Para a esquerda, altos pinheiros se erguiam, o que parecia ser um recado deixado pelas árvores para as pedras ‘vocês ainda estão por baixo’. O vento soprava em rajadas ocasionais e agitava os galhos dos pinheiros criando um som de farfalhar que se combinava com o som das ondas. Era um lugar inóspito e muito silencioso. Se não fosse por nós ali... Meus olhos finalmente se fixaram nas pessoas e na pilha de madeira no meio de algumas pedras. Por uma dedução muito complexa pude concluir: aquela era a fogueira. Oh!
 Sam e Paul não demoraram a chegar. Emily também veio. Eu já havia ouvido falarem dela, mas não a havia conhecido. Tentei não olhar para a grande cicatriz em seu rosto, era difícil. Já tinha feito uma imagem imaginária de seu rosto, mas ver ao vivo e a cores me chocou um pouco. Comecei a sentir pena dela... Mas só comecei. Esse era exatamente o tipo de sentimento que eu não gostava de despertar nas pessoas, seria uma hipocrisia absurda ficar lhe dando tratamento especial ou demonstrando minha pena. Em vez disso, só pensei que para ela era muito mais difícil esconder seus ‘sintomas’ das pessoas, elas sentiam pena dela imediatamente porque a cicatriz estava estampada em sua cara. Depois de alguns segundos intermináveis, cumprimentei-a da forma normal como queria que o fizessem comigo.
Depois de pouca conversa jogada fora, Quil já não podia mais aguentar de ansiedade. Era a primeira vez que ia pular de um penhasco com o grupo, ele estava mais ansioso que uma criança na véspera de Natal.
-Então, vamos!- Ele perguntou pela quinquagésima vez.
Paul revirou os olhos. – Tá bom! Odeio crianças birrentas...
Todos nós fomos para a ponta de pedra que se projetava para fora do penhasco criando uma espécie de península suspensa sobre o mar. Todos, menos Emily e Kim, que ficaram para trás, bem longe da borda. Não deviam gostar muito de ver seus amados se atirando rumo à morte.
Eu não estava muito certa de pular, mas iria assistir de perto aquilo!
Sam foi o primeiro. Tirou a camisa e os sapatos e foi até a beirada. Seus pés se agarravam à borda, abraçando a pedra do mesmo modo que os dedos dos mergulhadores se agarravam ao trampolim, como eu via nas olimpíadas. Ele ficou muito reto, jogou o corpo para cima em um salto, bateu os pés no chão e deu impulso para frente dando um rodopio no ar e mergulhando num abismo antes de se chocar com as ondas violentas lá embaixo.
-Uau, agora eu!- Gritou Quil.
Ele correu para a beirada e se jogou de uma vez. Parecia mais um paraquedista. O seu grito ecoou pelas pedras. Devia ser uma sensação ótima! Ele foi recebido pelas ondas e foi logo se juntar a Sam, que se mantinha boiando nas ondas ali perto. Paul foi logo depois, se jogando de costas sem o menor medo, e gritando forte por pura diversão.  Depois veio jared, que fez uma reprise do salto de Quil.
Seth se adiantou na fila. – Agora eu!
- Não sei não, Seth...- Leah o olhou preocupada, e ele devolveu algumas reclamações como todo o irmão mais novo quando é censurando pelo mais velho.
- É, Leah! Seth é bem forte! Deixe de ser uma chata total! –Jake interferiu.
Seth ficou tão feliz com o comentário de Jake que imaginei que o garoto fosse explodir de emoção. Já Leah fez cara feia para Jake. Eles deviam estar tendo uma discussão muda, porque levou um tempo até Leah suspirar e soltar o irmão, que correu para pular antes que mudassem de idéia. O seu grito foi pura liberdade. Foi meu favorito! Ele caiu nas ondas, e Sam logo estava com ele do seu lado.
Leah ainda fazia cara feia para Jake, o que deixava claro que ela não estava feliz em ter perdido a discussão. Ela correu para a borda do penhasco e se jogou em um pulo gracioso, sem esquecer-se de mostrar o dedo do meio para Jake por cima do ombro. 
Jake riu alto. Embry foi o seguinte, ele fez um pulo muito contido para o meu gosto. Bom, ele era o mais tímido, faz sentido.
Só sobramos eu e Jake na borda do penhasco, ele me lançou um olhar: - Eai,vai pular?
O medo me atingiu de surpresa. Sentei na borda do precipício de pernas cruzadas me inclinando para olhar para baixo. Não eram 200 metros, não mesmo. Mas também não estava a fim de estimar uma altura. O mar lá embaixo se contorcia sem parar empurrando as sete pessoas, que nadavam para a praia, lá embaixo. Parecia algo plenamente seguro. Para eles. Para mim, bom, acho que não era bem assim.  A água devia estar congelando. A água do mar congela a temperatura mais baixa que a água sem sal, ela podia estar muito gelada mesmo! Talvez se a água quente de uma banheira aquecida estivesse esperando por mim lá embaixo  o salto não fosse tão ruim...
-Você me deixaria pular?
-Claro, se quiser. – Ele deu de ombros. – Preferia que não pulasse, mas prometi que não ia me preocupar com você, então...
Balancei a cabeça por alguns segundos, ele estava usando psicologia reversa contra mim? Nossa, como esse cara aprende rápido! Minha mãe levou muito mais tempo para aprender a usar esse artifício contra mim.
Ele veio se sentar do meu lado. - E então?
Alternei o olhar entre o azul do mar lá embaixo e o preto escuro dos olhos dele. Mordi os lábios.
- A água deve estar muito fria, não é?
-Para mim não. Você realmente só está preocupada com a temperatura da água? – Ele estava muito descrente. Quando viu que era verdade, suspirou. - Você realmente é incorrigível, não é mesmo?
Dei de ombros. – Bom, vai ver você tem razão. Mas como pessoas incorrigíveis costumam repetir sempre os mesmos erros, vou deixar pra pular outro dia, se você prometer que voltamos aqui outro dia.
-Prometo. – Ele sorriu. – Bom, agora é a minha vez.
Levantei e dei alguns passos para trás, deixando um espaço para ele executar seja lá qual salto quisesse. Ele continuou sentado, apoiou as mãos nas pedras, e aos poucos soltou o resto do corpo do apoio, ficando suspenso apenas pelos braços. Ficou assim dois segundos e se soltou caindo em direção ao mar como um míssil.
Corri para ver o choque dele na água, e fiquei um tempo observando-os nadar em direção à praia, parada, e pensando em como devia ser boa essa sensação de queda livre. Devia ser como estar voando. Levantei, tirei os sapatos e fui bem para a borda colocando os pés exatamente como Sam fez no seu pulo. Eu só queria sentir o vento contra meu rosto, esvoaçando meus cabelos e me fazendo sentir livre, mesmo que isso só durasse alguns segundos. Mesmo que no final caísse na água e ela fosse me congelar por inteiro.  Respirei fundo, fechei os olhos e uma brisa forte acertou meu corpo inteiro, um vento gostoso, que nem parecia ser tão frio. Abri os braços e deixei a sensação do vento me envolver.  E então, não houve baque gelado. Eu não caí no mar, meus pés ainda estavam na pedra. A brisa parou de soprar lentamente. Eu não havia pulado. Fechei os braços e dei as costas para o penhasco. Posso não ter pulado, mas consegui o que queria: A sensação de ser livre para ser eu mesma.
***

Eles não demoraram muito para voltar do nado, comemorei sarcasticamente o fato de terem sobrevivido à queda. Eles debocharam de minha falta de coragem por não ter pulado. E todo mundo ficou implicando com todo mundo, como todo bom grupo de amigos faz.
O fim da tarde veio, e eu esperaria um por do sol vermelho, mas já sabia que ele seria cinza. Sempre é! Quando a noite chegou, as nuvens ainda encobriam o céu, mas aqui e ali se via uma estrela. A fogueira estava acesa, e as chamas dançavam rumo ao céu. Comemos salsichas na brasa e marshmallows, claro.  Em certo ponto da conversa percebi que Quil estava cochichando qualquer coisa com Paul. Estranho! Quando os encarei com desconfiança, eles riram.
Pouco depois descobri o que estavam tramando. Paul saiu da roda e quando voltou, foi sorrateiro o suficiente para chegar por trás de mim e me assustar à beça. Ele então passou as mãos por cima de minha cabeça e colocou um instrumento de madeira em meu colo.
-É lá de casa, mas ninguém usa mais, então pode ficar com você. – Ele foi logo explicando.
- Um violão, Paul. Eu não posso aceitar um violão assim... Ele é seu.
-Bom, você pode dar obrigada e aceitar como um presente. – Ele deu um sorriso sarcástico.
 -Caramba, Paul! De todo mundo no universo, a última pessoa que imagino me dando um presente é você.
Ele deu de ombros. – Você podia aceitar como um pedido de desculpas por quase te matar, mas sabe que não é meu estilo. Eu sou só o antigo dono do violão, eles me pagaram por ele.
Jake e Quil riram. Foram eles que pagaram Paul e fizeram essa brincadeira comigo. – Eu vou matar vocês dois!
Mas eu não ia matar ninguém. Embora o fato de eles insinuarem que eu deveria tocar algo me deixasse levemente irritada.
- Qual é a gente não trouxe rádio... - Jake era uma criatura ardilosa.
-Ok, eu toco.
 Passei os dedos pelas cordas do violão e ouvi o som que emitiam. Ele estava bem afinado.  Só alguns ajustes e estava pronto para mim. Tocar com eles podia até ser algo agradável, então eu podia tentar...
Uma noite envolta da fogueira não está completa sem um caipira com um violão, só espero que eles não estejam prestando muita atenção ao fato de eu não ser caipira. Os olhinhos pretos ao meu redor sorriam com a chama refletida neles. Estavam esperando. Dei risada e os olhei de volta.
– Bom, pensem bem no que querem que eu toque, porque eu cobro cover artístico.

14. O uivo


Meus dedos ainda não estavam cansados, mas minha plateia já não tinham mais músicas para pedir. A noite estava avançando. E o céu ficava um pouco mais límpido, com a lua brilhando aqui e ali entre as nuvens. Parei de tocar, e Quil perguntou: -É difícil... Tocar?


-O quê? Tocar isso aqui é moleza, como andar de bicicleta!

-Você pode me ensinar um dia? – Quil perguntou com uma vontade tão autêntica que eu não ia poder dizer não.

Paul então tirou o violão de mim e abraçou o instrumento como que para protegê-lo. – Não com o meu violão!

-Espera ai, esse é o violão da agora! – Um Jared calculista revidou.

-É, mas eu tenho que decidir quem toca nele.

-Isso não faz o menor sentido, Paul... – Jared de novo.

- Mas ele é um destruidor de instrumentos musicais!- Paul apontava para Quil.

-Não, sou não!- Quil ficou vermelho.

Essa discussão ia durar bastante... Olhei ao redor e percebi de imediato um lugar vazio. Jake não estava ali. Onde ele estava? Quil reclamava com Paul enquanto Jared apostava com Leah alguma coisa.



-Ah coitado, só porque ele quebrou um maldito tambor na aula... – Leah balançava a cabeça.

Aproveitei a distração de todos para sair da roda sem chamar atenção. Onde Jacob estava? Ele devia estar ali por perto. Vasculhei o penhasco com os olhos. Não, ele não teria pulado de novo. É verdade que Sam, Seth e Embry estavam fora para fazer a ronda da floresta, mas eles estavam se revezando. E esse era só o primeiro turno da noite, não tinham trocado ainda... Junto às pedras na orla da floresta percebi uma silhueta. Tinha que ser Jake. Fui para lá, me afastando da fogueira.

-Eu não quebrei por inteiro, ainda podia concertar! – Ouvi a voz de Quil ficar mais distante.

Olhei para trás, a fogueira estava bem alta, as fagulhas subindo em um balé catastrófico, onde os fragmentos sempre acabavam se espatifando no chão. Lá estava bem mais quente. Eu já estava com todos os casacos agora, e mesmo assim apertei os braços ao meu redor. Olhar aquele grupo de longe me fez lembrar meu antigo grupo de amigos... Senti saudades.  Voltei a olhar na direção que estava indo; nada de ficar chorando! Olhei para as pedras determinada, só que não tinha mais pessoa alguma lá.

-Bu!- Ele apareceu do meu lado todo presunçoso.

-Ah, morri de medo... – Revirei os olhos.

-Não te assustei? – Ele fez beicinho.



- Depois da décima vez, a gente se acostuma. – Dei uma piscadela. – Por que não está com o resto na fogueira?

-Posso te perguntar o mesmo!

-Nem vem, eu vim te procurar. – Joguei as mãos para cima, depois mudei o tom e indiquei a fogueira com a cabeça. – Está perdendo uma discussão daquelas.

-Uhm, isso realmente é tentador... Mas vou conseguir viver sem essa. – Ele sorriu.

-Sei... Ainda não respondeu minha pergunta. – Cruzei os braços, mas foi difícil manter a pose quando o vento frio me castigou.

Seu semblante mudou, ele ficou triste. Eu não sabia o que era, mas com certeza era algo envolvendo ela: Bella.

Parte de mim estava deixando de lado essa ideia de ajudar a juntar os dois. Não fazíamos qualquer tipo de plano fazia mais de uma semana. Mas agora eu já estava nessa. Vou ajudar... Olhei para o céu nublado me sentindo pequena e sem valor. Depois olhei para Jake.

Pousei a mão em seu braço e assenti. –Pode falar.

 - Ela viajou. - Ele disse como se isso explicasse tudo!

- Ok, isso não parece assim tão ruim... – Então, pensei mais um pouco. – Ela não está mais de castigo?

-É, acho que não está mais... Liguei inúmeras vezes para a casa dela, mas Charlie me disse que ela foi visitar a mãe na Florida, junto com... Ele.

Se toda a raiva que eu já tive em minha vida fosse colocada em uma única palavra, não soaria da mesma forma que Jake disse ‘ele’.  Era muita raiva contida. O nome não conseguia sequer ser pronunciado.
Eu estava prestes a acalmá-lo dizendo que estava fazendo tempestade em copo d’água, que ela estava com a mãe e logo estaria de volta. Quando, pensei no local. A Flórida era o oposto de Forks, ensolarada e animada. Não era um bom lugar para um vampiro ir. Sei lá, eles não viram cinzas com a luz do sol ou algo assim? Então, porque diabos um vampiro iria para a Flórida? A menos que eles não tivessem ido para lá, e esse fosse um álibi. De fato, era um bom álibi. Sempre é mais fácil viajar escondido quando os pais são divorciados, eles levariam um tempo para se falarem e perceberem que ela tinha sumido. Entendi o medo de Jake.

-Jake, eu não acho ela vá fugir...  

Ele riu, um riso sádico. Dei um passo atrás.

- Eu também penso assim. Mas existe coisa pior do que ela fugir. Sam me fez pensar nisso... Ele me contou da transformação em um deles. O sanguessuga pode transformá-la. Porém a transformação levaria algum tempo, e a pessoa precisaria ficar longe de humanos por um tempo, para não sair matando seus conhecidos. É nojento.

Fiz uma careta. Imaginei Bella se agarrando ao pescoço do pai para tomar sangue. Medonho.

-Sam deve estar exagerando. Ela vai voltar logo, e ainda como ela mesma.

-Não , pense! Ela seria um deles, poderia ficar com eles para sempre naquela forma horrenda. E ele não teria que se preocupar comigo mais, porque ela seria minha inimiga, seria uma fria.

Ele estava gritando comigo agora. E percebi o tremor em seu corpo. Bom, eu não ia ficar com medo.  Ele ia ter que parar de ficar pensando besteira, imaginando coisas que não eram verdade. Bati o pé firme no chão, ele não ia ficar desse jeito se dependesse de mim.

-Jacob, pode para agora! Ela vai voltar antes que...

Um uivo cortou a noite, interrompendo meus pensamentos. Congelei. A noite num instante parecia mais fria e silenciosa. Algo claramente estava errado. O ar parecia ter sido completamente expulso dos meus pulmões e por uma fração de segundo esqueci como se fazia para respirar. Como será que estavam Seth, Sam e Embry?

Jake fechou os olhos colocou os dedos sobre as têmporas e pressionou fazendo massagem. Ele parecia estar se esforçando bastante para manter-se calmo.  Fiquei olhando para ele até que subitamente ele abriu os olhos e me puxou pelo braço em direção à fogueira.

Ele andava rápido, mas conseguia acompanhá-lo. Todos já estavam de pé e sérios, ao redor da fogueira. A mão de Jake apertava meu pulso com força. Eu queria que ele falasse comigo o que estava acontecendo, que parasse de me arrastar como um peso morto. Pelo amor de Deus, eu sei andar sozinha! Eu gritava com ele, mas ele não me respondia e apenas me levava para a fogueira. 

Ele só precisou fazer um aceno para que todos na fogueira entendessem o que estava acontecendo. Mas eu não estava acompanhando nada daquilo! Aproveitei que ele estava distraído e puxei meu braço do aperto de sua mão.  Virei de frente para Jake , praticamente exigindo que ele me olhasse.

- O que está acontecendo? – Gritei irritada.

Ele me lançou um olhar frio que me fez lembrar o porquê de eu ter medo de olhos escuros como aqueles em meus pesadelos. E depois de segundos pesados finalmente  veio a resposta entre dentes.
- Vampiros.
O mundo parou.

***

Eles continuaram falando entre si enquanto eu não ouvi nada. Eu nem sequer sabia mais onde estava. Era como se uma bomba tivesse explodido do meu lado... Havia vampiros ali por perto, e não deviam ser os Cullen. Deviam ser os DE VERDADE. Aqueles que não iam ficar jogando conversa fora comigo em lojas de material esportivo. Meu sangue gelou por um segundo. A adrenalina veio em seguida e tudo voltou a fazer sentido. Eu sabia onde estava. Sabia o que estavam dizendo.  Jake estava falando olhando para minha direção e dizendo algo, antes de se virar para os outros.
-Precisamos tirar vocês daqui.
Estava se referindo a nós, meras humanas. Olhei para as duas únicas pessoas ali iguais a mim. Estavam ao meu lado e pareciam preocupadíssimas. Temerosas por seus companheiros e por si próprias. Engoli em seco, esse era o meu time, o do “a gente fica rezando enquanto eles saem”.
Paul e Leah já estavam de pé de prontidão esperando por Jacob.  Paul tremia demais.
- Emily e Kim entrem no carro, vocês três vão para a casa de Emily. – Percebi que ele me incluía ali e busquei seu olhar em protesto, embora ele nem tenha notado. – Paul, Jared e Quil nós vamos nos juntar a Sam.  
Paul e Quil se entreolharam cheios de expectativa. Quil até tinha expectativa demais, ele parecia quase bater palmas. Leah notou sua exclusão do grupo e se virou para Jake de braços cruzados. Imagino que, seja lá o que estivesse pensando, não eram palavras bonitas.
- Leah, vocês vai escoltá-las até a casa.
Ela não ficou feliz. Mas as ordens de Jacob eram indiscutíveis. Parecia haver algo de imponente em sua voz agora. Era o tipo de voz que comandava um exercito. O tipo de voz que ninguém podia se negar a obedecer. Embora eu não costumasse obedecer ninguém...
Todos correram para seus novos afazeres. Kim e Emily já estavam no carro. Emily deu partida no motor. Fiz corpo duro e não sai do lugar. Eu não tinha que ir a lugar algum, Jacob não mandava em mim. Eu não ia aceitar ser mandada pra casa com as duas.  Seus olhos se estreitaram em minha direção.
Não sei para que me dei ao trabalho de tentara desobedecê-lo, pois isso não fez a menor diferença. Em um segundo eu estava firmando meus pés no chão e no outro Jake me jogou dentro do carro e fechou a porta.
-Jacob. - Eu gritei irritada. Ele não me ouvia.
Emily pisou no acelerador e saímos em disparada pela estrada do penhasco, feito uma flecha. Olhei para trás e vi quatro grandes lobos à luz da fogueira. No segundo seguinte já não estavam lá.
Fechei com força minha mão. As unhas se encravando fundo na carne. Que diabos! Eu não queria estar ali! Eu não precisava de proteção! Maldito Jacob, não conseguia manter uma única vez sua promessa?!
Passamos velozes pelas árvores na beira da estrada, de forma que parecia um borrão verde continuo. Algo cinza cortou o borrão. Estreitei os olhos.  Era Leah, na forma de lobo,  que corria paralela ao carro.
Chegamos à entrada da casa de Emily e Sam. O carro parou bruscamente causando um solavanco. Leah já estava parada na frente do carro sem o menor sinal de cansaço, como se a corrida tivesse sido lenta demais.
Um uivo vindo da floresta cortou a noite. Kim e Emily ficaram estáticas com a respiração pesada.  Elas não iam fazer nada, mesmo? As orelhas de Leah ficaram de pé. Era agora! Destranquei a porta e corri para fora sem pensar duas vezes.
Entrei no meio das árvores tentando me orientar na direção do uivo. Leah me alcançaria logo. Droga, minhas pernas não eram muito rápidas, nem chagavam perto da velocidade do carro. Leah era ridiculamente mais veloz que eu... Na verdade, ela já devia ter me alcançado. Passei pela terceira fileira de árvores a minha frente, quando um lobo cinza parou na minha frente. Ela rosnou, seus dentes a mostra e o olhar me fuzilando. Desacelerei quase parando. Sua expressão ficou mais tranquila.
-Não. – Gritei e virei para o meio das outras árvores ao invés de parar e me render.
Leah ficou para trás estática, provavelmente em uma conferência mental sobre se deveria ou não perder seu tempo me seguindo. Ela queria ir para a luta. Óbvio. Mas também havia Kim e Emily. Ela não podia abandonar as duas lá. Isso me deu mais tempo para correr. Fui correndo mais para dentro da floresta. Não me preocupava com o depois, apenas tentava ir em direção ao uivo.
Já estava bem dentro da floresta quando parei. O lugar parecia exatamente igual, toda a paisagem era uniforme, o que significa que estava perdida. Não liguei muito tempo para isso. Minhas pernas doíam e meu pulmão parecia estar em chamas. Curvei o corpo, ofegante. Meus pulmões ardiam pedindo ar.
Leah devia ter decidido ficar na casa porque não havia nenhum sinal dela por perto. O lobo cinza ficou para trás. Recomecei a andar lentamente. Aos poucos minha respiração se estabilizava. Já não tinha mais certeza em que direção deveria seguir. Apurei os ouvidos tentando escutar outro uivo. Nada. Não havia som algum. Só um mudo assustador. Nenhum animal ou inseto fazia qualquer som ao meu redor. Era tão silencioso e sem vida. Como se eu estivesse dentro de um quadro.
Uma brisa soprou às minhas costas e fez as árvores farfalharem ao meu redor. Cruzei os braços ao meu redor tentando afastar o frio. Fechei os olhos tentando imaginar que estava na praia quentinha perto de casa, banhada pelo sol quente e dourado, tentei imaginar as vozes de pessoas ao meu redor se divertindo nas areias claras e fofas.  O vento parou. Abri os olhos e ainda estava no meio de uma floresta de pinheiros esmagadores. Mas algo estava diferente. O luar encobria a clareira deixando tudo com um brilho prateado encantador. Olhei para cima e vi a lua cheia no céu negro. Era como um sonho... Meu sonho. O sonho que tive quando cheguei aqui. Olhei ao redor certa de que não era possível. Só que era. Eu apenas tinha interpretado errado meu sonho, não estava fugindo dos lobos porque eles me perseguiam. Eu fugia de Leah porque não queria que ela me colocasse trancada dentro de uma casa, e talvez até numa prateleira como um prato de porcelana, protegida e inútil.
Olhei para o chão tentando evitar o buraco em que caia em meu sonho. Não havia nada além de grama, raízes e galhos ali. Sorri e ri de mim mesma. Eu não estava tendo sonhos de premunição! Que idiotice pensar nisso.
Minha atenção foi desviada para outro lugar. Algo vermelho pairava entre as árvores prateadas. Uma chama atravessando a floresta lentamente. Estreitei os olhos tentando ver o que era aquilo. Estava longe. Dei alguns passos à frente.  Meus pés escorregaram sobre uma raiz úmida e precisei me equilibrar para não cair de cara na grama. Passei com mais cuidado pela raiz para não tropeçar novamente. “Então esse era o tombo que previ que iria tomar... Obrigada por me alertar sonho, mas acho que já consegui evitar.”
Foquei a visão na chama. Ela estava mais próxima. E nem era uma chama. Era o cabelo de uma mulher... E ela corria. Não, não era bem uma corrida, era algo mais elegante do que isso. Ela flutuava entre as árvores. Era tão branca que me fez imediatamente lembrar Edward. Um arrepio subiu por minha espinha.
Ela estava mais próxima agora. Pouco mais de cem metros nos separavam. Era muito bonita, como uma pintura a óleo renascentista. Ela reduziu o passo e parou me olhando de longe. Inclinou a cabeça e franziu a testa se perguntando o que eu fazia ali. Ou pelo menos era isso o que eu imaginava. Em seguida ela sorriu. Os dentes brancos à mostra brilharam ao luar. Seu corpo voltou a se mover lentamente em minha direção. Seus pés descalços não faziam barulho ao pisar sobre a grama. Fiquei parada, admirando aquela figura estranha. Seu andar tinha algo de felino, me lembrando sutilmente uma leoa durante a caça. Depois senti medo, mas já devia ser muito tarde.
Ela ainda sorria. Era o sorriso gentil de um dentista que tenta acalmar uma criança. Ela já estava na metade da distância até mim. Comecei a recuar. Meus passos faziam barulho quebrando gravetos e esmagando folhas. Minhas costas se chocaram contra algo duro. Soltei um suspiro. Era uma árvore. Eu estava encurralada. Meu coração batia rápido. Podia sentir meu sangue pulsando dentro de minhas veias. Isso não era bom. Ela também sentiria. Ela passou a língua sobre os dentes com deleite.
Uma nova onda de adrenalina me percorreu. O instinto de sobrevivência gritava dentro de mim. Tateei procurando algo que pudesse usar como arma. Eu ia lutar contra ela, mesmo sem grandes chances. Meus dedos se agarraram a um graveto que se desfez quando o apertei. Não havia nada que eu pudesse usar contra ela. Ela ia me matar!
 Ok. Só que ela estava atrasada, eu já devia ter morrido há muito tempo atrás. Fechei minha mão em punho. Uma arma inútil. Ninguém nunca me ensinou a lutar contra uma vampira nas aulas de defesa pessoal. Que tipo de curso estúpido e incompleto era esse?
Levantei os punhos na frente do queixo. Ela deu um passo para frente.
O momento pareceu se desacelerar. Bom, sempre ouvi que nos momentos antes da morte tudo passa em câmera lenta, então imaginei que fosse o fim.  Naquele longo instante três coisas aconteceram ao mesmo tempo. Um lobo negro ficou entre ela e eu, a mulher sumiu em fuga, e um segundo lobo chocolate agarrou meu casaco com os dentes e me jogou sobre as suas costas.
O último acontecimento foi o que se tornou mais importante, porque o lobo se virou e saiu em disparada. Agarrei o seu pescoço com força para não cair.  Olhei para trás procurando o lobo preto ou a mulher de cabelos vermelhos. Só vi um borrão verde prateado frenético. Estávamos muito rápidos. O vento batia avassaladoramente sobre mim. Colei meu corpo contra as costas quentes do lobo. Ele tinha o corpo tão quente, me fazia lembrar minha praia imaginária. Fiquei ali e não queria mais ter que sair.
Eu era como as mariposas. Elas são incondicionalmente atraídas pela luz e eu pelo calor.
Um grunhido subia pela garganta do lobo. Era algo como um ronronar. Olhei para o pelo castanho chocolate do lobo. Quem seria ele? Eu não sabia identificar nenhum deles nesta forma. E onde estavam os outros?  O pânico começou a tomar o lugar da adrenalina. Eles podiam estar feridos.
-Estão todos bem? – Eu praticamente gritei na orelha do lobo.
Um segundo ronronar em resposta. Infelizmente eu não tinha comprado um dicionário de língua canina, mas parecia uma afirmativa. Acreditei que fosse e deixei por isso mesmo.
Seu passo reduziu de velocidade. Não estávamos na casa de Emily. Onde estávamos? Depois da última fileira de árvores reconheci a casa de Antoni.  Revirei os olhos. Isso era típico. Iam me deixar sob os cuidados de meu tio. Primeiro minha mãe e depois... Um lobo tentando se livrar de mim.
Ele parou ao pé da varanda. Obriguei meu corpo a se afastar do calor. Ele parou de frente para mim, se sentou e ficou me observando. Se lobos falassem, acho que este estaria me dando um sermão daqueles. Encarei seus olhos tentando descobrir quem era.  Seus olhos eram familiares. Ele era grande, mas calculei que fosse menor do que Jake. E Jake tinha pelos castanhos avermelhado. Não era Jake.
Mas quem era? Uma coisa eu sabia, era um lobo bastante animado. Abanava a calda sem parar. Sua orelha se dobrou e ele inclinou a cabeça para o lado.
-Quil! – Conclui enfim.
O lobo mostrou os dentes e deixou a língua pender para o lado. Algo como um sorriso de cachorro.
-Acho que isso é um sim.
Seu corpo se sacudiu em risos. Depois ele ficou sério e apontou a porta de casa com o focinho.  Cruzei os braços e o encarei. Sua cabeça se inclinou para ficar na minha altura e rosnou em ameaça. Dei risada. Era o tipo de reação que esperava de Quil. Era tão estranho como eles podiam ser ao mesmo tempo pessoas e lobos. Ele não parece com o Quil pessoa em todos os aspectos, mas algo era inconfundivelmente parte de sua personalidade. Esse Quil lobo me lembrava um grande cão de estimação. 
Estendi minha mão em sua direção e fiquei incerta do que estava fazendo. Quil foi mais rápido e se inclinou até encostar o focinho em minha mão. Seu corpo era tão quente. Todos eles eram tão quentes! Eu daria tudo por um dia quente debaixo do sol...
Então, ele se afastou e sentou no gramado com uma pose de cão de guarda. Franzi a testa. O que ele queria? Ele apontou para a casa com o nariz molhado de cachorro. Ele queria que eu entrasse. Essa era boa, um cão tentando mandar em um humano! Cruzei os braços e balancei a cabeça.
Outro uivo cortou a noite. As orelhas de Quil se moveram, mas ele não desviou os olhos de mim. Ele precisava ir, e eu estava só atrapalhando. Não serviu de nada eu ter fugido da Leah. Eu não podia ajudá-los. Infelizmente eu ia poder só ficar em casa rezando para tudo acabar bem. 
Suspirei e disse para Quil: - Tudo bem, eu não vou fugir. Só não gosto de ficar fora da ação, assim como você.- Ele não se moveu, mas devia ter entendido -  Acaba com eles por mim, tá bom!
Voltei para a porta. Antes de abrir e encarar Antoni, ainda olhei  uma ultima vez para trás. O gramado já estava deserto.

N/Baby: MelDels como tava com saudade dessa fic. Mas se tudo correr certo – e torçam por isso – a fic vai voltar. Só não posso garantir que seja com regularidade, mas vai voltar! XD
A Tricia vos manda um grande beijo e pede que vocês comentem dizendo o que acharam dos caps e se estão felizes por tê-la de volta!
E como perceberam eu vou ser a beta, né? Bjão


Capítulo 15 - Contos de garagem

Uma pequena faixa de luz atingiu meu rosto e me fez começar a despertar. Minha cabeça latejava um pouco e minha visão ainda estava embaçada. Tentei mover as pernas e percebi que estavam dormentes e geladas. E molhadas. Abri os olhos, sobressaltada. Eu estava coberta por água dentro de uma banheira. 
A banheira do quarto de hóspedes abandonado, se abandonado for considerado o mesmo que abarrotado de livros, formava meu leito atual. “O que diabos eu estou fazendo aqui?”

Lentamente minha memória começa a engatar a primeira. A floresta, a fuga, os lobos, a vampira... Ela estava tão perto de mim, aspirando meu cheiro a apenas alguns metros de distância. Ela devia estar apreciando aquilo como se fosse o cheiro de uma refeição suculenta... Mas meu sangue não deveria ter um cheiro ruim para ela? Quer dizer, é um sangue estragado por anos de doença. Será que ela conseguia sentir a diferença entre o cheiro do meu sangue e o de outras pessoas saudáveis? Será que não é como diferenciar uma maçã boa de uma podre? Eu sou uma maçã podre, ela devia saber...

Não, eu não posso ficar pensando nisso... “Mantenha os monstros no armário” repeti para mim mesma. Saí da banheira e me enrolei em uma toalha. Na verdade eu ainda estava completamente vestida, mas encharcada e gelada até o osso. Devia ter entrado na banheira com muita pressa pra nem ter tirado a roupa... 
E então eu me lembro do meu sonho estranho. De alguém de cabelos vermelho seguindo meu cheiro pelo ar e tentando entrar em casa. Ela mataria a mim e a Antoni! Antoni não podia morrer por minha culpa! Mas talvez ela não sentisse cheiro se eu não estivesse em contato com o ar... Vi algo num programa bastante idiota de vida animal que falava da capacidade olfativa do predador, ou coisa assim. Bom, consigo rever em minha mente o momento em que eu, meio grogue de sono e medo, entrei na banheira para me cobrir de água e impedir a dissipação do meu cheiro. Ok, isso não faz sentido! Preciso fechar os registros de água da casa da próxima vez que for dormir se não posso inundá-la!

Voltei para meu quarto na ponta dos pés murmurando xingamentos comigo mesma pela minha ideia idiota. No mínimo vou pegar uma pneumonia por causa disso! 
No fim me dou conta de que acordei muito cedo e terei que ficar me distraindo com o que tem na TV para disfarçar minha ansiedade até a hora do almoço passar e Antoni ir até a casa de Billy para assistirem um jogo qualquer de basquete que segundo eles é um “épico”. Tanto faz, o que eu quero é pegar a carona pra lá, aparentando o mínimo de ansiedade (desespero) possível.

Milhares de perguntas sobre ontem pairam em minha cabeça. E o pior é que Jake nem atende o celular para me dizer se está vivo, assim como Quil. Mas eles TÊM que estar vivos! Quem devia ter medo é aquela branquela magrela e frágil tentando reviver a moda das cores de cabelos exóticas da Cindy Lauper. Ela ia ser destroçada! 
Sorrio dessa imagem e depois fico séria por estar realmente sorrindo de algo tão medonho. 
As horas se arrastam e fico só ouvindo o blá blá blá da TV como castigo por meus pensamentos maldosos. Lá fora a chuva cai como sempre. 

                                                                      ***

Finalmente paramos o carro na residência Black, e Billy logo chega à janela. Ele aguardou pacientemente na varanda em sua cadeira de rodas até chegarmos ensopados, mesmo tentando fugir da chuva infatigável. 

-Oi, Antoni!

-Billy!

Os dois se abraçaram dando tapinhas nas costas um do outro.  Já estavam submergindo em suas conversas superinteressantes e já se esqueciam de mim. Acenei levemente a cabeça num cumprimento e fui até a garagem que era o esconderijo nada secreto de Jake.

-Oi! –Acenei para os garotos enquanto virava numa curva fechada para entrar na garagem. O clima de repente mais ensolarado devido aos meus sóis particulares ali dentro. Um sorriso involuntário se formou em meus lábios.

-Olá!- responderam Quil, Embry e Jake em coro.

Sentei em um dos bancos improvisados e agarrei a lata de refrigerante que Embry me jogara. Embry sorriu e fez um pequeno elogio sobre meus reflexos e todos voltaram a conversar. 
Eles começaram a falar sobre motos e carros. Não fazia o menor sentido!  Vim ali para saber a história como já era prometido, não ouvir um manual detalhado de como fazer sua moto. Olhei-os sem entender o que estava acontecendo; no momento apenas me sentia uma coluna erguida no meio da garagem alheia a tudo que se passava ao meu redor.

-O que acha ?- Jake me fitava com seus olhos bem atentos e escuros, eu não fazia idéia do que devia achar.

-Que o Brad Pitt deveria usar o cabelo comprido sempre... - Respondi pensativa olhando o nada, depois me virei de súbito irritada. - Dá pra parar e ir logo ao que interessa?

Os três se entreolharam e riram.

-Eu sabia!- Quil disse triunfante e recebeu o dinheiro de Embry.

-Vocês... Estavam apostando sobre mim?!- O ultraje se espelhava em minhas palavras.

-Mais ou menos... ‘Quanto tempo você conseguiria esperar’. – Jake admitiu.

Forcei uma risada amarga. – Muito engraçado. Tive que assistir programas de fofoca pra passar o tempo, vocês fazem idéia de quanta informação inútil eu adquiri com isso?

-Bem, acho que o bastante. – Quil coçava o queixo pensativo de forma fingida.

Suspirei inconformada. Meu desespero era apenas um jogo de azar para eles. Mas, o que eu podia fazer? Bater os pés? Não adiantaria nada, eles continuariam sendo garotos e lobos ... 

Jake levantou as mãos no ar em sinal de paz. - Ei, isso não foi idéia minha. Você tinha de esperar até ser de tarde mesmo, a aposta só começou nos últimos dez minutos.

Tomei um gole do refrigerante morno com uma grande careta e esperei os nervos se acalmarem. Como algo pode ficar morno em um lugar tão gelado como essa terra chuvosa? Jake logo começou sua narrativa.

-Depois que você fugiu da Leah, ela ficou indecisa. Não sabia se ia atrás de você ou tomar conta de Emily e Kim.- O tom de voz dele fez me arrepender um pouco do que fiz, mas não completamente.- Mas como você já estava vindo na nossa direção mesmo, dissemos para que ficasse lá.    

-E você se mostrou uma ótima bússola para vampiros, achou a sanguessuga antes da gente!- Quil se intrometeu na historia, animado como sempre. 

-Na verdade parece mais que ELA me achou. - Gemi baixinho.

-Então, foi uma ótima isca!- Embry deu uma batidinha no meu ombro e eu sorri incerta. Não devia estar feliz por ser a isca do anzol na pescaria deles, embora ter ajudado ao invés de só atrapalhado me fizesse sentir bem.

-Bem...- Jake insistiu tentando voltar a sua narrativa.- Nós continuamos seguindo a pista da sanguessuga , além da sua. Sam foi o primeiro a te alcançar, o que foi uma sorte porque você e a sanguessuga estavam bem próximas. Sabíamos que no momento em que Sam te defende-se a vampira fugiria, por isso nos espalhamos pelo perímetro.
»Sam investiu e ela correu bem para cima do Paul. Ele quase a pegou! Quil te levou para casa enquanto voltamos a seguir a sanguessuga, depois ele voltou para nos ajudar, embora tenhamos deixado Seth para ficar rondando sua casa.

Quil estufou o peito quando ouviu seu nome, cheio de um orgulho de soldado-modelo. Ele merecia! Se não fosse por ele, não sei bem onde estaria. Devolvo o sorriso e ele fica vermelho. Depois pensei em Seth vigiando minha casa. Ele devia ter ficado furioso e com razão. 
Minha cabeça ficou atormentada com o porquê de não poderem me deixar sem proteção ou mesmo na casa de Emily com as garotas. Descobri, que eles tinham feito uma bela de uma escolha. Eles já me conheciam bem! Eles não poderiam me prender muito tempo na casa de Emily mesmo que eles quisessem, eu fugiria logo... Na minha casa a coisa era diferente, uma burrada minha não afetaria só a mim. Adicionar o fator Antoni foi bastante inteligente! Mesmo assim eles precisavam ter certeza de que eu estaria segura e deixaram Seth para tomar conta disso. 

-Quem decidiu me mandar para casa, ao invés de para a casa de Emily?- interrompo os pensamentos da Jake deixando-o desnorteado no meio da narrativa.

-Foi o Paul.- Disse Embry encolhendo os ombros- Ele temia que você fugisse de novo se sentisse que era protegida. Deixando você com seu tio era o inverso, ele precisaria ser protegido por você...

Isso mesmo! Fiquei intrigada por ser Paul a cabeça desse plano. Mas de fato eu não podia sair correndo de lá sem motivo aparente e esperar que meu tio não fosse atrás. Ele não faria a menor idéia do real perigo que estava lá fora e eu não poderia contar. 

-Enfim, a vampira fugiu para além da nossa fronteira. Ela foi para o território dos Cullen. A desgraçada ficou pulando de um lado pro outro. Quase a pegamos de novo! Até que os Cullen se intrometeram. Eles estavam tentando pegá-la do lado da fronteira deles, só que acabaram esquecendo um pouco dos limites. Um dos Cullens, aquele com jeitão de troglodita, acabou pulando pró nosso território quando foi atrás da sanguessuga. Ele pulou bem em cima de Paul! 

-Não culpo Paul pelo que aconteceu depois...- Embry murmura. 

-O vampiro estava pedindo, pular justo no Paul! Depois aquela namoradinha dele veio defendê-lo... E íamos acabar com eles se o senhor doutor Carlisle não entrasse no meio... - Quil trincou os dentes exatamente como um cão faria quando nervoso.

-O quê? O tal doutor Carlisle lá de Forks?- Eu já havia ouvido falar dele, mas achava improvável que alguém aparentemente tão gentil fosse um deles.

-É ele mesmo! O líder e “pai” da família morceguinho. Ele veio lembrar-nos do pacto e depois acalmou todo mundo com a ajuda de outro sanguessuga. Foi muito irritante! Nós estávamos furiosos, eles estavam errados e ao mesmo tempo não podíamos fazer nada. – Jake atirou a lata de refri vazia contra a parede, ela se comprimiu em um pequeno disco de metal.

Isso não fazia sentido. Não podiam fazer nada, como? Então surgiu a pergunta que era mais uma afirmação: - Ele tem um dom que nem o Edward.

Depois do encontro com o namorado de Bella tinha mudado meu conceito sobre vampiros. Eles não pareciam muito diferentes de pessoas comuns, mas havia aquela atmosfera pesada que os circundava como nuvens espessas sobre um castelo sombrio. E ele ainda tinha o poder de ler mentes! Era bastante ruim ele ter esse dom, mas se todos tivessem algumas capacidades extras, seria algo quase ridículo. Um bando de vampiros mutantes!

-Sim, acho que ele tem algum tipo de “dom” – As aspas pairaram no ar no gesto de Jake até seus braços caírem impotentes em seu colo. Todos ali estavam muito frustrados.

-Era como se ele nos obrigasse a ficarmos calmos. Era tipo um poder calmante. - Embry descreve, já que ninguém ali parecia querer falar sobre o assunto. 

No momento achei esse poder um pouco babaca. Eu podia muito bem ficar calminha tomando um chá de camomila ou um suco de maracujá. Ponderei um pouco e achei que realmente deveria ser um bom poder controlar assim as emoções das pessoas. Imaginei em um instante o bando de lobos ficando instantaneamente letárgicos. Fazer Paul parar seria difícil, mas parar todos eles ao mesmo tempo seria quase impossível.

-Mais deles tem poderes?- engasguei com as palavras conforme saiam da minha boca. 

-A Bella só me falou de mais uma. A baixinha consegue ver o futuro. 

Ver o futuro. Agora sim Jake dizia um poder realmente incrível. Bastante abordado pela ficção cientifica, pelo menos mais do que poderes calmantes. Só não sei se gostaria de ter esse poder. Ver meu futuro inteiro seria muito tentador, mas me arrependeria facilmente. Já era complicado viver com a incerteza da morte todo novo dia, imagine com a certeza!

-Quantos eles são ao todo?- Queria ter uma idéia de quão comum era existirem poderes desse tipo entre os vampiros.

-São sete, mas ontem eram só seis. – Embry, o senhor dos dados importantes responde.

Fiz as contas e isso dava algo em torno de 43% de vampiros com poderes.  Um número um tanto alto. Lembrei imediatamente porque eram apenas seis ontem: a viagem! 
Olhei instintivamente para Jake. Não precisei caprichar na indireta. Ele tinha um olhar bastante perturbado por uma dor interna indiscutível. Eles ainda não tinham voltado.

-... Eles vão voltar. – falei baixo, apesar de eles todos terem uma conexão mental, suponho que aquele era um assunto particular. Mesmo assim um nó se formou em minha garganta. – E o que houve com a vampira?

-Ela fugiu!- falou um Quil encabulado. – Aproveitou a briga e foi para o mar.


-Ela... sabe nadar?- fiquei pasma.

-E como, nenhum peixe é páreo para eles na água.

Uma onda de arrepios subiu minha espinha. Se eles sabiam até nadar, tudo o que fiz na noite anterior foi mais estúpido ainda. – Droga.  

-Qual o problema com isso?

-Nada, só que eles já fazem de tudo. Ainda tinham que nadar... Tem mais alguma coisa que devo saber sobre eles? Sei lá, talvez saibam voar ou tenha visão de raio laser!

-Isso é mais coisa de doutor Xavier e seus mutantes. – rindo, Quil revira os olhos.

Ergui a mão para cima. – Mil desculpas, mas minha vida já está bem estranha agora mesmo. Existem vampiros e lobisomens, coisa que eu achava impossível. Meu senso de realidade anda meio desregulado, como vou saber se o pé grande também não é real...

-E Papai Noel também! Não, . Simplesmente não existem. Sei que é estranho, para todos nós é.  Mas por favor, os X-men? – Jake não achava aquilo tão provável quanto eu. Talvez até tenha se ofendido um pouco.

-Se bem que muita gente adora esses caras! Qual é o seu favorito, ?- Quil riu maldoso.

-Ah, vocês não podem me culpar! E não seria nada mal existir um Wolverine!

Os lábios deles se contorceram em risadas contidas que logo não puderam ser contidas. O mesmo tipo de risada que crianças de primário dão apontando o dedo para um perdedor.  Embry foi o primeiro a sair das gargalhadas.

-Por que será que isso não me surpreende?- Os olhos de Embry fitavam Jake de uma forma que me fez sentir o sangue correr para minhas bochechas.

Jacob deu de ombros e balançou a cabeça deixando o fim da risada escapar. O assunto já estava mudando. A história da caçada já havia morrido. Apenas deixei meus olhos vasculharem a oficina até caírem na moto de Jake. Eles passaram a conversar entre si, mas isso não me irritou como no começo. Meu espírito estava muito mais calmo agora que sabia que minha incursão na floresta não tinha matado ninguém.

16. Sobre Motos e Garotas

O aconchego da garagem era indiscutível e a companhia deixava o ambiente mais agradável ainda. O mundo estava despencando lá fora e as gotas pesadas batendo no telhado e paredes de metal pareciam ecoar, se multiplicando em mil vezes. A conversa sobre mecânica corria solta.
Na verdade algumas expressões eu conhecia e aquele ambiente só me fazia lembrar mais de meu passado em LA. Não foi um amplo conhecimento, mas o tempo que passei nos galpões da oficina de Gabe me trouxe pequenas noções sobre carros e motos. Gabe, era um dos membros dos traficantes com quem eu andava, ele tinha uma queda por carros velozes. Sei o que parece, mas ele era gente boa. Gabe tinha a garagem para abrigar e concertar carros como uma fachada para as vendas para os peixes grandes. Mas acabou se tornando mais uma coisa ilegal na mão deles, porque logo se encheu de corredores ilegais que precisavam de mecânicos que também fossem ilegais.
Aos poucos as imagens dos membros da gangue iam voltando a sua mente. Eles foram uma família, uma bem estranha, mas a aceitaram muito bem. Senti uma pontada de luxuria e resignação. Eu estive mais perto do paraíso dos carros do que qualquer um deles e eu deixei escapar. Eles não deixariam. Agora era tarde, eu desperdicei a chance e virou apenas mais um dos mundos que coexistiam a milhares de quilômetros dali, em algum lugar na grande LA.

-Tudo bem, ?- Quil me olhou um pouco preocupado.

-Tudo sim!- Respondi irritada comigo mesma por ser tão imaginativa.

Quil não se convenceu muito. Eu dei de ombros, não tinha argumentos para convencê-lo. Fui até a moto reluzente e a observei com cuidado. Sorri amargurada pensando na velocidade do vento no meu cabelo quando andei de moto da última vez. Aquela, não podia me iludir, devia ser bem mais lenta... Mas não resisti a pensar em como seria andar nela.

-Você não está pensando em fugir de moto, não é ?- perguntou Jake rindo.

–Bem que podia! - Foi minha resposta firme.

-E quantas motos você já dirigiu?- Embry olhou descrente me analisando da cabeça aos pés. E depois deu risada.

-Pelo menos uma com mais potência do que todas essas aqui juntas. - Aponto as motos.

Embry sorriu de uma forma um pouco maldosa. - Então, não teria problemas em dirigir uma das de Jake...

-Não, não teria mesmo!- Não sei bem aonde ele queria chegar com aquilo, mas não gostei que questionasse minha habilidade daquela forma.

-Ótimo! Então vamos andar de moto esta semana!- Sorriu Jake, convidativamente. - Embry você pode levar sua moto?

Ele concordou com um pé atrás. Quil sem entender se precipitou para Jake. - Por que isso agora?

-Só estou querendo me divertir.
-Quem é você e o que fez com Jacob Black?- Quil estava muito satisfeito por Jake estar voltando ao seu normal animado, antes de Edward lhe incomodar com Bella. Eu também estava.

As risadas de Quil foram interrompidas por Billy chamando o filho.

Os amigos o empurraram para que fosse logo. – Vai lá. A gente já tem que ir embora mesmo.

-Não precisam ir!

-Você é louco? Sam mata a gente se não fizermos nosso turno!

-Mas isso é só daqui a duas horas!

-E você quer que a gente durma quando?

Jake aceitou os argumentos e nos despedimos dos dois amigos. Ele correu à minha frente para ver o que Billy queria. Cheguei a tempo de ouvir a pergunta de Billy. - Pode preparar o jantar? Eu e Antoni vamos assistir ao jogo.

-Ah, não precisa. Eu peço uma pizza pra gente. - Sorriu Antoni para Billy, daquela forma encabulada que já conhecia.

-Que é isso senhor Felder, não dará o menor trabalho. A gente prepara!- Jake me puxou para o lado colocando a mão sobre meu ombro para simbolizar que éramos uma equipe e sorrindo feito o aluno mais puxa saco do mundo.

Encarei-o confusa e irritada, mais irritada do que confusa. Ele sorriu e me girou nos calcanhares para a cozinha. Esperei passarmos pela porta para protestar.

-Eu sou a convidada, não tenho que fazer nada!

-Tem sim! Porque você acima de convidada é uma amiga, e amigos se ajudam.

Droga! Eu que tinha ensinado isso para ele. O feitiço se virava contra o feiticeiro. Ele sorriu entendendo a ironia.

-O que vamos cozinhar?- Perguntei sem ânimo enquanto ele tirava uma panela prateada do armário.

-Não sei. O que você quer jantar?- Suas mãos, no entanto já tateavam as teclas do telefone automaticamente. Esperei paciente, encostada na pia. Sua expressão era tensa e ansiosa. Ficou assim pelos segundos que imaginei serem as chamadas tocando na outra linha. Alguém atendeu.

-Oi Charlie.- Jake falava com pressa, a esperança enchendo seu semblante.- Bella está?

Pausa. O rosto de meu amigo se desfigurou no estado original de tristeza e pesar. Meus olhos perseguiram o brilho que fugia de seus olhos negros. A dor dele se instalando no meu peito.

-Ah, tudo bem. Eu ligo mais tarde. Tchau.

O silêncio reinou pelos minutos seguintes. Só o barulho dos comentaristas preparando-se para o jogo na TV se ouvindo.

-Tem ligado muitas vezes... - Foi mais uma conclusão do que uma pergunta.

-É... - Ele fixou seus olhos em mim, despregando-os do chão. - Não consigo não me preocupar.

-Entendo. Mas não gosto. Não devia ficar inventando historias do que pode ter ou estar acontecendo. - Mordi o lábio. Era exatamente o que eu fazia... Imaginar demais. – Sabe, isso não é bom!

-Eu sei! Você me falou ontem para eu não me torturar com isso. Porém, sinto no fundo do meu coração que “isso” vai acontecer se eu não impedir.

Eu acreditei em seu tom amargurado.

-Você acha que ela pode estar enfeitiçada?

-Eu não sei, pode ser... Ele é muito bom manipulador.

-Claro, ele lê a mente dela! Como alguém pode viver assim, sendo uma marionete? Eu me mataria se...

-Não tenho certeza se ele lê a mente dela. Ela disse que ele não pode, mas ele pode mentir sobre isso.

Se ele não podia mesmo ler a mente dela, isso era um pouco mais brando. Embora ainda achasse muita tolice dela estar com um vampiro. Quer dizer, ele é lindo e perfeito... Apenas por ser vampiro. É um disfarce. Esse é o objetivo: atrair a presa humana idiota. Será que ela nunca viu um filme de vampiro na vida? Não se pode confiar neles. Uma hora são gentis e na outra estão com os dentes na sua jugular.

-O que está pensando em fazer quando ela voltar?

-Bem, eu pensei em vê-la. Vou perguntar se ela vai à escola amanhã. É claro que o sanguessuga vai esta lá também, mas... Não me olhe assim! Eu vou ficar muito bem, ele não faria nada em um lugar público.

Cruzei os braços, o encarando. Isso era ridículo! Quem estava sendo suicida agora? Entendendo meus pensamentos, ele se defendeu.

-, você foi falar com ele, eu só vou acabar o encontrando sem querer. Eu sou bem mais forte que você. Não é a mesma coisa!

-Ei, eu não fui falar com ele! Fui falar com a Bella, não tenho culpa se ele apareceu. E ele não tinha motivo para me matar. Ele não me odeia. Já você...

Ele revirou os olhos e bufou.

-Vamos fazer a janta, ok?

Discutimos o que fazer e decidimos fazer bifes de frango à parmegiana. Trabalhamos sem falar muito e logo tudo estava em seus devidos eixos. Os bifes no forno com a camada de queijo por cima para derreter e o molho de tomate borbulhando, o arroz cozinhando. Sentamos à mesa para descansar.

-Como você pretende ir amanhã?- Joguei a pergunta casualmente enquanto brincava de dobrar um guardanapo.

-Não sei, acho que assim mesmo. - Ele apontou para si.

Dei risada. – Estou querendo saber que meio de transporte vai usar. Sua aparência eu já sei que é um problema sem solução.

-Ah, desculpe! Você devia desistir de ajudar alguém tão feio... – depois acrescentou.- Vou de carro, o Rabbit já tá concertado.

-Hmm... Melhor ir de moto.

-Por quê?

-Não confia em mim? Porque é muito mais rebelde. Você já vai faltar na aula mesmo, isso completaria bastante o visual. Além disso, ela andava de moto com você. Seria bom... Instigá-la a se lembrar de como era. Meio que um toque para que perceba o que está perdendo por não andar com você... – Na verdade eu estou pensando como eu gostaria de ser a Bella vendo o Jake chegar de moto e me raptar... Bom, deve funcionar para ela também. - Eu vi o Edward e me parece que diversão não é muito a praia dele. Faça-a lembrar como é.

Terminei minha dobradura de papel e levantei os olhos para ele. Ele estava concentrado em mim com olhos arregalados. - O que foi?

-Você é muito boa nisso, sabia?- Ele levantou um canto da boca num meio sorriso pensativo.

-Talvez eu saiba. - Dei de ombros.

-E é muito humilde também!

-Claro! - Levantei o pássaro de papel na palma da mão. – Ele não ficou perfeito?

-É... - Ele pegou o pássaro na mão. - Belo hobby o seu.

O senhor sarcástico.

- Só esta com inveja porque não consegue fazer igual.

Sorri. Jake estava triste, mas isso passaria logo. Eu podia alegrá-lo enquanto isso.

41 comentários:

  1. Gosteii mtoo... aidna vai ter + caps. neh?! Loka pelo proximo...nao demore a postar...bjinhuus

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  2. Divaaa que fic é essa deus...
    Gostei pacas dessa fic sério
    vai ter mais caps néah tem que ter
    att mais ok
    Bjx ;*
    Peace

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  3. Flor adorei. Você escreve muito bem..Bjus!

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  4. Amando a fic flor. E obrigada por disponibiliza-la para o blog. Bjs

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  5. OI flor adorei o capitulo. Esse lance de pesquisa Quileute é bem legal...Mas me diz quando o nosso divo Jake vai aparecer? Ansiosa.Bjus!

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  6. Muito obrigada gente!!

    Novos caps a caminho,e me desculpem a demora...

    Fiquem tranquilas que tem espaço de sobra reservado pra nosso divo!;)

    Eu q agradeço pelo convite... amei o blog!

    bjos

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  7. Amei demais essa fic...posta logo *_*

    Eu meio que me identifiquei com o sarcasmo dela ^^ ficou até mais fácil me ver no personagem ;)

    Tah mto bom msm

    Kisses

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  8. Eu tb amei a parte do sarcasmo dela rsrsrsrs

    Mas cade o Jake?O.O

    bjs flor,não demora.Ok?

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  9. leitora nova se apresentando *-* amei a fic!
    e eu toda rebelde rsrs e q sarcasmo é aquele minina amei aguardando mais att bjss

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  10. HHUAUAUHAUHAU ADOREI!!

    Nossa eu coloquei a Alana no lugar dela com estilo e classe...nota 10!

    Já tava na hora daquele povo para de ficar me perturbando u_u

    Chorei lágrimas de sangue com o sorriso do Jake vindo me parabenizar *desmaiei*
    E o Quil?! Eu não acredito que ele vai virar lobo e me deixar sozinha...ele era meu único amigo y.y Porque eu não conto aquelas duas lá que acham que me enganam dizendo que são minhas amigas ¬¬

    Amei demais!!

    BjaO

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  11. Cara...eu tinha que seguir eles né?!!
    O pior nem foi isso mais se eu segui eles...eu não devia ter gritado, por mais que fosse um impulso e a sobrevivência aonde fica??

    Por causa desse grito eu me denunciei e quase morri *O*
    O Paul é um monstro msm, ele se deixa levar demais pela raiva!!


    Mas bem...tudo isso teve um lado positivo...eu estou me aproximando do Jake (8)

    Só quero ver no isso vai dar!!

    BjaO

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  12. Fic MARA, adoro ^^

    Soh um probleminha, os scrips não estão aparecendu =/

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  13. QUE FIC MARA... TÔ ADORANDO... ESSE CAPÍTULO FOI D+, DEI UMA DE INVESTIGADORA, MORRI DE MEDO AO DESCOBRIR SOBRE OS LOBOS, CORRI PERDIDAMENTE PELA FLORESTA, FUI CARREGADA PELO JAKE E AGORA ESTAMOS NOS APROXIMANDO... JÁ ESTOU TOMANDO ATÉ BANHO NA CASA DELE... O PRIMEIRO PASSO JÁ FOI DADO, ESPERO QUE OS DEMAIS PASSOS VENHAM LOGO.

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  14. Puxa,que história de vida... Leucemia qdo pequena, rebelde e envolvida com traficantes na adolescência... que experiência de vida, hein? E como sou corajosa e estável, pois fiquei no mesmo quarto que o Jake, vestindo só a camisa dele e nem pulei no pescoço dele... que determinada!!! Espero pelo próximo capítulo ansiosa.

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  15. Uau... é tudo que eu tenho a dizer, essa fic tá TUDO! Posta mais, hein! Please!

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  16. Nossa esse capítulo foi.Tudo.De. BOM!!!

    Adorei a parte do jogo de basquete, eu me senti dentro do jogo msm, com a maneira como vc narrou...e o que foi o meu mano a mano com o Jake? Ele me ajudou a enterrar a bola e depois ainda tive o direito de ser pega no colo? (666'...

    AGORA EU FAÇO PARTE DO GRUPO LUPINO!! \O/
    A Leah é muito Foda!!

    BjaO

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  17. La Push Baby, La Push! haha
    Geeente, o Jake foooi tãaao fofo me ajudando *----*'
    [AAAAA] A Leah foi legal comigo *rebola*
    Continuaaa, obg/

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  18. Menina, já pensei varias vezes em ir de férias pra La Push, quem sabe eu não topo com um Jake da vida... To ADORANDOOOO sua fic... continua assim e La Push será nossa! Bejux

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  19. adorei... o cap, vc escreve muito bem continue nos surpriendendo. gosto muito das suas fics. bjs
    GINA

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  20. comessei a ler faz pouco tempo esta fic e estou amando. estou curiosa d+ para saber porque jake esta diferente. não demora a postar o proximo por favooooor. bjs

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  21. Nossa senti falta dessa fic ó.ò

    Esse capítulo foi muito perfeitinho *.*

    HUM..pq será que o Jake anda sumido e me evitando <.<
    Eu botei aquelas mejeras no chinelo HA.HA.HA!! u_u

    BjaO

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  22. adorei o cap e gostei da música de um toque legal. esta d++++
    BJS
    GINA

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  23. Eu sou muito esperta gente, pouco tempo perto do Edward e já saquei que ele pode ler mentes. Só não gostei da minha ideia estapafúrdia de juntar Jake e Bella. Como assim? Será possivel que eu ainda não percebi que Jakelicious é meu?

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  24. Ahh finalmente eu posso comentar!!
    Eu tava sem net =/

    Então...EU SOU ESPERTA DEMAIS!! Não demorou muito e eu já percebi que o Edward consegue ler mentes u.u

    Mas que merda foi essa de eu querer juntar a Bella com o Jake?Não tem como u_u


    Tah Massa esse cap...

    BjaO

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  25. E agora? Como é que eu vou fazer p/ juntar o Jake e a Bella?(o que eu ainda não concordo nem um pouco u.u)
    Como eu vou fazer p/ tirar o Edward da equação?
    Apesar de não gostar da idéia do Jake e da Bella sem graça ficarem juntos...eu quero ver no que esse 'plano' vai dar, principalmente agora que o Jacob deixou XD

    Quem acha que no fundo o Jake não apareceu lá no quarto só p/ falar isso toca aqui O/

    HUAHUAHAUHAUUHA

    BjaO

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  26. Não gosto nada da idéia de ajudar o Jake a se juntar com a Bella, mas pelo menos assim, estarei mais perto dele e quem sabe o que poderá acontecer, não é mesmo.
    Bjssss!!!

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  27. presumidos comunicado lançar indesejado aprofundada garante incorpora polarizador etcvalor better

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  28. Adorei a sua fic é serississsissimo eu a adorei mesmo ela ta perfeita Adorei tbm meu geito (SUPER DURONA *-*) Idolatro a minha personalidade na fic RIRI ;P E quando ela enfrentou o bando no refeitorio HAAAAA JESUS eu até vibrei ;P RIRI Eu to adorando o jake tbm :D MAS ñ gostei nadinha de euzinha estar ajudando o cara em sua relação amoroza, mas pelo outro lado me aproximará mais dela RIRI atitudes com segundas intenções isso que eu faria RIRI AMEIIII a fic sério mesmo ;D E por f ñ demore para atualizar se ñ vou pirar RIRI BJS

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  29. GAROTA PQ VC ABANDONOU A FIC ELA TA OTIMA ....TO LOCA PRA SABER O FINAL....

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  30. Muito legal a fic! Continua, por favor. Quero saber no que vai dar!

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  31. Essa fic é realmente muito boa, q bom q não está mais nas mãos do Coveiro Zé. Continue postando. Bjs

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  32. Muito bom de se ler melhor ainda de se comentar , para poder incentivr a autora a continuar a nos alegrar com esta fic de arrasar.
    Chega de rimas que ja está sem graça mas se eu gostei? não, eu adorei!!!
    valeu baby por ter atendido o nosso
    pedido.
    espero que não demore a postar o proximo ja estou super curiosa
    bjs e até a proxima
    postado por Lucynda

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  33. Que perfeição!!!!! Que bom que a fic ressusitou!! Muito perfeita essa ATT. Acho que seria legal a PP fugir de novo e sei lá... A vampira ir lá e pegar ela ou alguma coisa assim. Uma coisa que não sai da minha cabeça: Essa paixão da PP é de mão única ou o Jake também gosta dela? Por causa disso dele ainda gostar da Bella me confundiu um pouco. Eu achava que a PP podia ser a impressão dele, mas ai ele ficou triste porque a monga mole da Bella preferiu o Edward... Esperando mais ATT's!! Manda rápido pfvr!!!

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  34. PERFEITOOOOOOOOOOO! EU AMEI!!!! a sua fanfics é perfeita, eu amei, não tem palavras pra descrever a perfeição que é a sua fanfics é
    Amei!

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  35. Adoro essa PP que mesmo doente não se deixa aater ou pelo menos tenta,
    tomara que ela tenha bastante aventuras com os lobos
    na situação dela é o que eu faria
    Mais uma vez, obtigada por não nos abandonar e nos permitir ler mais um cap. desta fic perfeita.
    bjs e até a poxima
    POst. de Lucynda

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  36. Não acredito que ainda não lia essa fic diva. Eu só poderia estar cega por ainda não tê-la visto. ¬¬
    Amandoooooo demais cada capítulo!
    A estória está maravilhosa e envolvente, com certeza de agora em diante marcarei presença constante nessa fic. Amandoooooo!!
    Bjkssss!!!

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  37. tô xonas nessa fic, mas esse amor do Jacob pela bella me MAAAATA! kkkk por outro lado, assim fica diferente de tudo que já li, sem clichês e melação demais... então continue, está fazendo um ótimo trabalho >< bjs

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  38. post. por Lucynda

    eu simplesmente amo esta fic, acho que deveria ter att dupla já que demorou muuuuuito para ser atualizada.
    eu deixei em tela inteira e quando vi tinha acabado o cpt. confesso que fiquei triste.
    é sério, gostaria de ter mais desta fic,
    bjs. e até a proxima

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  39. Nossa ta muito legal ver a amizade tão forte nesta fic e a da pp com o jake com certeza ahhh....é tao fofa!!! que realmente deixa a expectativa pelo surgimento do amor entre eles por isso posta + cap to curiosa. Essa fic deixa gostinho de quero + ela é muito linda ameeeei!!! bjos

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