7 de março de 2011

Fuck the Art, Lets Rock'n'Roll by Juls

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Fuck the Art, Lets Rock'n'Roll












Capítulo 1



Inconscientemente, sabia que algo aconteceria neste dia aparentemente normal. Tenho uma espécie de pressentimento, algo no fundinho da minha cabeça, quando alguma coisa importante irá acontecer. O único problema é que não sinto se é algo bom ou ruim.
Tudo começou normal, acordei no meio da manhã naquele frio infernal que é no final de outubro em Londres. Levantei, escovei os dentes, penteei meus cabelos, coloquei uma camiseta, uma calça jeans, meu all-star e uma jaqueta de moletom bem quentinha. Normal, até meu cérebro começar a acordar... aí que aquela coisinha no fundo da minha cabeça começa a piscar que nem luzinha de natal, avisando: “alguma coisa vai acontecer hoje, se prepare...”. Aí, meu lado racional fala, do outro lado: “ah, não esquenta, isso é paranóia sua, . Esse negócio de pressentimento não existe...”. Acabo sempre dando preferência ao meu lado racional, é claro, e empurro as luzinhas piscando para trás das quinquilharias do meu inconsciente. Mas é lógico que presto mais atenção à escadas, objetos cortantes e pessoas estranhas, pois as luzinhas podem ser transformar sem placas de néon e atacar pensamentos inocentes se não acreditar nelas.

Desci as escadas de casa e encontrei a casa vazia, como de costume. Meu pai trabalhava o dia inteiro e eu tinha terminado o colégio, com pretensões de entrar para uma faculdade só ano que vem. O único compromisso que tinha era com meu trabalho de meio período na loja de CDs. Então, como tinha o resto da manhã livre, sentei na cozinha e tomei meu café da manhã tranquilamente.

Até aí, tudo bem, nenhum acidente ou algo parecido. Liguei a TV na cozinha e nada de anormal apareceu no noticiário. Depois do café, veio o tédio, é claro. Fiquei passando o tempo assistindo TV e comendo besteira, e depois dedilhando minha guitarra no sofá da sala até dar meio dia no relógio do microondas.

Peguei as chaves da minha moto e meu capacete no hall de entrada, e sai de casa. O tempo estava meio nublado, mas isso também é normal em Londres. O caminho era curto até a loja, então não me preocupei em pegar minha capa de chuva. Na segunda curva do trajeto, uma gota gorda de água cai em meu visor. As duas partes do meu cérebro gritam, instantaneamente: “cac*te, car*alho, p*ta que pariu essa m*rda do cac*te” e outros tantos nomes feios do meu extenso vocabulário de palavras chulas. Isso não intimidou a chuva, que, segundos depois, veio com toda força, os pingos violentos perfurando o tecido das minhas roupas.

Por sorte, sabia que tinha um viaduto a duas quadras de distância, mas que teria que desviar do meu trajeto. Não tive muito tempo para ponderar, a chuva começou a ficar mais pesada, querendo se transformar em tempestade rapidamente. Fiz a curva em direção ao viaduto, parando na faixa de acostamento embaixo do mesmo. Desci da moto, tirei meu capacete e avaliei o estrago: as pontas do cabelo pingando, tênis encharcado, calça jeans grudando. Graças a Deus a parte de dentro do meu moletom era de tactel, então, por dentro, estava seca. Coloquei o capacete encaixado no retrovisor e abri o zíper da jaqueta. Minhas mãos estavam molhadas, então sequei os dedos na parte de trás da calça jeans antes de enfiar a mão no bolso de dentro da jaqueta. Tirei o maço de Marlboro, isqueiro tipo bic e meu celular, examinando um por um. Todos intactos, não tinha ocorrido nenhum estrago. Acendi um cigarro, olhando para os carros que passavam.

A rua não tinha muito movimento, e os automóveis passavam devagar, pois a chuva estava tão forte que não se via nada pela frente. Eu ia ter que esperar de qualquer forma. Digitei no celular o telefone da loja, avisando o que tinha acontecido e que talvez fosse demorar um pouco para chegar porque estava dependendo da vontade de São Pedro.
Encostei na parede de cimento, ainda fumando meu cigarro e me perguntando porque não tinha pegado meu MP4 antes de sair. Ah, mesmo assim, acho que não iria ter bateria suficiente, aquela b*sta. Não sei por que raios tinham inventado esse negócio de bateria em MP4, era bem mais fácil quando faziam as coisas à pilha. Porque, se acabasse a pilha, era só trocar, não precisava ficar que nem uma besta procurando tomada nos lugares. No meio do meu devaneio, eis que sinto um carro estacionar atrás da minha moto. Uma onda de adrenalina corre meu corpo automaticamente e meus músculos congelam de pânico. “Minha Nossa Senhora, vai que é um assaltante ou coisa pior, meu Deus, me salva, peloamordedeus!”, pensei, tentando me controlar. È incrível como todo mundo vira crente nessas horas de aflição. Tentei não olhar, mas uma voz masculina falou alto:

- Hey, você aí... – chamou o moço. “Só falta falar: me dá um dinheiro aí, haha. Opa, não vai ter graça se ele falar isso e tiver com uma arma na mão... , concentra!”. Minha cabeça é mesmo um poço de lixo, só sai coisa podre. Olhei na direção da janela do carro, tentando parecer o menos assustada possível. O moço continuou: - Precisa de alguma ajuda?

- Ah, pode desligar a chuva pra mim, fazendo o favor? – falei sem pensar direito. Pronto, agora o moço achava que eu era retardada mental e que me arrancar algum dinheiro iria ser mais fácil. Bom, pelo menos ele não era tão assustador assim. Aliás, agora que tinha reparado, era um moço bem bonitinho até. Mas quem disse que moço bonito não pode ser bandido? Meus pensamentos foram interrompidos novamente, desta vez pela risada contida do moço bonito, dentro do carro.

- É, talvez algum dia eu aprenda a fazer isso, mas, por hoje, o que tenho a te oferecer é uma carona... – falou, com um sorriso no rosto. Tá, ele tinha um sorriso que o deixava menos assustador ainda, mas mesmo assim...

- Não posso deixar a minha moto aqui, mas obrigada por oferecer. Vou esperar a chuva passar um pouco. – disse, tentando ser gentil.

Ele pareceu pensar por um instante, antes de replicar: - Bom, você que sabe, então. Boa sorte. – terminou, ligando o carro mais uma vez. Passou por mim vagarosamente, como se tivesse dificuldade para guiar o automóvel e sorrir em minha direção ao mesmo tempo. Achei engraçado e ri alto, balançando a cabeça de um lado para o outro. “Esse deve ser mais loló que eu!”, pensei enquanto via o carro sumir na poeira de chuva.

Robert POV

Estava sendo movido por forças estranhas hoje, de outro mundo, talvez forças do mal. Esta era a única explicação plausível que tinha para meu próprio comportamento e nem era tão boa assim. Acordei perto do horário de almoço como de costume, mas ao invés do meu estômago roncando, minha boca estava salivando. Uma bruta vontade de tomar um café expresso me consumia, mas tinha que ser um cappuccino da Hummingbird Bakery. P*rra, parecia um maricas com desejo, igual mulher grávida, mas tudo bem.

Às onze e cinqüenta da manhã, peguei as chaves do carro no capacho. Isso também não era muito minha cara, considerando que eu pagava, literalmente, aos motoristas de táxi, para não dirigir. Apesar de ter um carro novinho e brilhando na garagem, era mais pra enfeite do que qualquer outra coisa, pois não gosto de dirigir. E também tenho um pouco de medo. Deve ter algum nome para esse tipo de coisa: carrofobia, autofobia, ou qualquer coisa do gênero. Mas hoje eu não estava com medo, pra falar a verdade, tava pouco me f*dendo, só queria tomar meu café logo. Devia dar, o quê, no máximo uns dez minutos de viagem.

Demorei uns cinco minutos para conseguir sair da garagem porque não lembrava como dava a marcha ré. Quando resolvi o problema, surgiu outro: já nas ruas de Kensington, rumo à Notting Hill, os pingos de chuva caiam no vidro da frente e não sabia qual botão apertar para ligar o negocinho de limpar. E a chuva começou a apertar e não enxergava mais nada.

Agora aqui estou, em pânico, num carro a vinte por hora e completamente cego. Eu disse que as forças eram do mal, não deveria ter saído de casa. Pelo menos, sabia onde estava e que não tinha nenhum cruzamento perigoso. Na verdade, tinha um viaduto logo à frente, que poderia parar para achar o botão. Neste exato momento, vi a chuva parar de cair e escurecer ligeiramente. Estava embaixo do viaduto. Lembrei de dar a seta e entrei no acostamento.

Nunca me senti tão idiota, quando me inclinei no painel para procurar o botão da coisinha que tira a água do vidro. Aliás, mais imbecil ainda porque não sabia nem qual era o nome do troço. Apertei o botão que achei que fosse funcionar e vi o negocinho ganhar vida, tirando a cortina de água da minha visão. Uma moto apareceu de repente na minha frente, junto com uma garota apoiada na parede de cimento a poucos metros de distância.

Ela não olhava para mim e fumava um cigarro nervosamente. Seus cabelos estavam pingando e suas roupas encharcadas. Talvez devesse oferecer uma carona, talvez não. E se ela me reconhecer e me atacar no meio do caminho. Mas, por outro lado, se fosse uma fã, já teria pulado no meu pescoço a essa altura do campeonato.
- Hey, você aí... – falei alto, tentando chamar sua atenção. Seu rosto virou em minha direção e parecia assustada. Percebo a garota respirar fundo e pergunto se precisa de ajuda.

- Ah, pode desligar a chuva pra mim, fazendo o favor? – responde a garota num tom de piada. Depois, abaixou a cabeça e levou o cigarro até os lábios. Acho que tinha ficado envergonhada, ou coisa parecida, pois reparei que balançou a cabeça de um lado para o outro, fechando os olhos. Tive que segurar a risada depois disso, a menina era muito esquisitinha.

- É, talvez algum dia eu aprenda a fazer isso, mas, por hoje, o que tenho a te oferecer é uma carona... – disse, um pouco mais seguro dessa vez. Ela não tinha me reconhecido e talvez estivesse até com medo de mim. Dei um sorriso para mostrar que não era nenhum bicho papão. Acho que funcionou, pois a garota pareceu relaxar momentaneamente e sorrir também.

- Não posso deixar a minha moto aqui, mas obrigada por oferecer. Vou esperar a chuva passar um pouco. – respondeu num tom de voz doce e um meio sorriso nos lábios. Ela era uma gracinha. Não, risca isso, era muito bonita e tinha um jeitinho muito esquisito. Taí, gostei, mas ela não tinha aceitado minha carona. Por causa da moto. Tinha que ter alguma alternativa. Talvez nunca mais a visse e não podia deixar isso acontecer. Porque não? Ah, não sei, alguma coisa me dizia para não deixar isso acontecer. A mesma força do mal que me empurrava pra fazer as coisas estava me dizendo pra não deixá-la escapar. No final do dia, minha transformação em boneco teleguiado estaria completa.
Percebi que a menina estava esperando eu dizer alguma coisa. - Bom, você que sabe, então. Boa sorte. – respondi, ao mesmo tempo que uma idéia brilhante surgiu na minha mente. P*rra, essas forças do mal são muito f*da, mesmo. Se fosse pra montar um exército, não ia ter pra mais ninguém. F*da-se Darth Vader, a força está é comigo.

Tirei o carro do acostamento e atravessei o viaduto, sem tirar meus olhos dela. Queria gritar: “não se mexa, espere cinco minutos, peloamordedeus!”, mas isso poderia estragar meu plano diabólico. Então sorri, daquele jeito que todo mundo diz que é irresistível, no intuito de me fazer inesquecível. Porque, quer coisa mais embaraçosa do que voltar em cinco minutos e ver que a garota já não sabe quem é você? Mas parece que meu charme é imune quando direcionados a ela porque o que vi em seguida me deixou até envergonhado: a garota rindo, alto e sonoramente, da minha cara. Mas, depois de fazer que não com a cabeça, consegui ver um sorriso suave em seus lábios, antes de sumir atrás da cortina de água que caía do céu.


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